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Lula na Bahia: descanso do petista teve praia escondida e articulação política

Durante a campanha, Lula centralizou decisões em torno de si; no descanso, apesar da tentativa de se exilar onde há quase nenhum sinal de telefone celular, não foi tão diferente

Lula e Janja: mudança a partir do fim do mês (DOUGLAS MAGNO/AFP/Getty Images)

Lula e Janja: mudança a partir do fim do mês (DOUGLAS MAGNO/AFP/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 8 de novembro de 2022 às 06h45.

A viagem ao sul da Bahia foi programada pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e sua esposa, Janja, desde antes da vitória nas urnas. A ideia do casal era viver a lua de mel adiada pela campanha eleitoral e descansar após um ciclo de viagens, comícios e entrevistas na acirrada disputa contra o presidente Jair Bolsonaro (PL).

Durante a campanha, Lula centralizou decisões em torno de si - das grandes às triviais. No descanso, apesar da tentativa de se exilar em um refúgio seguro e remoto onde há quase nenhum sinal de telefone celular, não foi tão diferente.

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Lula se manteve ativo em diálogo por telefone e presencialmente com seus aliados mais próximos, enquanto as especulações sobre a formação de seu ministério eram despistadas pelo vice, Geraldo Alckmin (PSB), e pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann, com a justificativa de que o tema só seria tratado após o retorno do presidente.

Além dos constantes telefonemas, Lula recebeu petistas próximos como o governador da Bahia, Rui Costa, o sucessor eleito dele, Jerônimo Rodrigues, e o senador Jaques Wagner (BA).

Os três jantaram com Lula e Janja na noite de terça-feira, 1º, e dormiram na casa onde o casal se hospedou - uma fazenda isolada à beira-mar da família do deputado federal Ronaldo Carletto (PP-BA).

O PP é da base do governo Bolsonaro, mas o partido tem alianças locais com o PT no Nordeste. Carletto apoiou Jerônimo, candidato petista, no segundo turno na Bahia. O deputado não estava na residência durante a estadia de Lula e Janja. A assessoria de Lula não confirma nem nega informações sobre o paradeiro do presidente eleito durante a "agenda pessoal".

Costa e Wagner, cotados para assumir ministérios no governo Lula foram acompanhados por suas esposas. Lula já disse a interlocutores que quer aproveitar "bons quadros" petistas do Nordeste em seu governo. A pauta do jantar abordou a vitória e as perspectivas para o novo governo.

Segundo uma pessoa próxima, a conversa girou em torno da necessidade de "descer do palanque" e não prolongar o clima de campanha eleitoral, diante do desafio de tentar pacificar o País. Lula viajou à Bahia enquanto protestos antidemocráticos a favor de Bolsonaro aconteciam em diversos Estados - inclusive no sul da Bahia, no centro de Porto Seguro, município que abarca a região de praia onde o petista estava.

No dia seguinte ao jantar, Rui Costa voltou a Salvador no final da manhã. Wagner continuou no local por mais um dia. Considerado um articulador político habilidoso, Jaques Wagner é cotado para assumir a Casa Civil, ao mesmo tempo que parte dos aliados do presidente eleito advoga que ele será uma peça valiosa no Congresso. Lula deve ter novos encontros com a dupla em breve. Wagner viajará ao Egito para participar da COP27, para onde Lula também deve ir. A Rui Costa, Lula indicou que deve chamá-lo para "debater ideias" durante o período de transição.

Lula mostrou-se tranquilo e disse que tem duas boas razões para viver: governar o País e aproveitar seu casamento com Janja. Apesar do tempo feio, motivo de reclamações pelo casal durante o jantar, Lula chegou a ir à praia em um dos poucos momentos de mormaço, também segundo uma pessoa próxima ao petista. Além das chuvas, um frio atípico para a época do ano derrubou a temperatura local, que ficou abaixo de 20°C durante os dias que Lula e Janja permaneceram na região.

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Sobre o local

A escolha da residência para a folga foi feita a dedo para que o presidente ficasse o mais isolado possível. Para chegar à praia da Ponta do Camarão, Lula viajou de jatinho até o aeroporto de Trancoso e, de lá, precisou de um helicóptero.

Para quem tenta chegar sem as aeronaves particulares à disposição, o caminho é penoso. A praia mais próxima para se chegar de carro é a Praia do Satu, fica a cerca de 2h30 de carro de Porto Seguro. Metade do trajeto é feito por uma estrada de terra esburacada.

A entrada no Satu é limitada, pois depende da passagem por uma fazenda particular. A autorização é feita por uma das duas barracas de praia locais, que cobram entre de R$ 100 e R$ 150 por pessoa para liberar o acesso, limitado a poucos carros por dia.

Dali, ainda é preciso caminhar no sentido sul, rumo ao vilarejo de Caraíva, por cerca de 1km em trechos de areia fofa e outros com pedras, para chegar à Ponta do Camarão. A caminhada só pode ser feita nos momentos do dia de maré baixa. Com a maré alta, a faixa de areia entre falésias e o mar desaparece.

Lula e Janja tiveram, portanto, uma praia praticamente particular - especialmente porque nos dias de chuva as barracas do Satu não funcionam e a entrada ficou ainda mais limitada.

Da praia, não é possível avistar a residência onde o petista se hospedou, no alto de uma falésia e protegida por vegetação. Apenas cercas e avisos de que se trata de uma propriedade particular ficam à vista, no nível na praia.

Outros locais foram cogitadas por aliados para que Lula se hospedasse, como a residência do advogado Marco Aurélio Carvalho em Trancoso. A opção, no entanto, foi por um lugar onde Lula não precisasse circular em frente a outras casas e correr o risco de encontrar pessoas, ainda que dentro um condomínio fechado, para chegar até a praia.

Possível clima hostil

Apesar de a Bahia ser o segundo Estado que mais votou em Lula no País proporcionalmente - atrás apenas do Piauí -, o extremo sul, onde ficam as praias paradisíacas de Trancoso e Caraíva, é um trecho menos amigável para o PT. A cidade de Porto Seguro é governada pelo prefeito Jânio Natal (PL), que é bolsonarista.

No centro de Trancoso, que oferece maior infraestrutura de restaurantes e lojas na reunião, o clima é hostil a Lula. É mais comum ouvir críticas a elogios ao petista na praça do Quadrado, coração turístico de Trancoso e por onde circula an elite do País - especialmente turistas de São Paulo e Minas Gerais.

Fora de temporada, os hotéis cobram pelas diárias valores em torno de um salário mínimo e um hambúrguer chega a custar R$ 85 reais em restaurantes que lembram a região do Itaim, em São Paulo.

"O prefeito da região vestiu a camisa e muitos empresários daqui também, mas o povo é petista", afirma Anderson Adauto, que foi ministro dos Transportes no governo Lula e tem casa na Praia do Espelho, próxima a onde o presidente se hospedou. "Ele escolheu o lugar certo. Só dá para passar na frente da praia caminhando e quase ninguém circula ali", afirma Adauto. Lula não foi visto circulando pelas cidades do entorno enquanto esteve no local e permaneceu dentro da casa onde descansava.

Fake news durante a viagem

Uma profusão de boatos e fake news se espalharam pela região - e pelas redes sociais - nos quatro dias de descanso do presidente eleito. Uma delas é a de ele teria se hospedado na residência de Adauto. Outros locais diziam que ele estaria em uma propriedade do banqueiro Daniel Dantas. A presença do presidente eleito no local movimentou os grupos de Whatsapp e bares de Arraial D'Ajuda, Trancoso e Caraíva com histórias e supostas fotos e vídeos de Lula - a maior parte deles, antigos.

A mais grave, no entanto, dizia que Lula não estava na Bahia e sim no Hospital Sírio-Libanês, com risco de morte. Nas redes sociais, a falta de imagens recentes de Lula era usada como justificativa para alimentar a mentira de que o "sumiço" do petista fora causado por saúde.

Na tarde de sábado, 5, quando o petista partiu rumo a São Paulo, o boato foi desmentido. Funcionários que trabalharam na casa de Carletto e agentes de segurança locais pediram para tirar fotos com o presidente eleito. As imagens circularam nas redes sociais e na imprensa local.

Depois de um curto descanso, Lula e Janja voltaram a São Paulo no fim da tarde de sábado, um dia antes do previsto. Segundo um aliado, "Lula já deveria estar se coçando" para voltar oficialmente ao trabalho.

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