Lula: ex-presidente disse "lamentar profundamente" que o PT não faça parte de um grande processo de aliança contra o bolsonarismo (Amanda Perobelli/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 20 de agosto de 2020 às 17h47.
Última atualização em 20 de agosto de 2020 às 18h01.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu nesta quinta-feira, 20, que o PT pode não lançar candidato à Presidência em 2022 desde que outro partido de oposição apresente um nome com melhor desempenho nas pesquisas de opinião.
A declaração de Lula foi recebida positivamente, mas com cautela por líderes de outras siglas da esquerda. Já no próprio PT a possibilidade de o partido não ter candidato a presidente pela primeira vez desde a redemocratização é vista como improvável. Lula admitiu que o PT pode abrir mão da cabeça de chapa em 2022 em entrevista ao canal do YouTube TV Democracia, do jornalista Fabio Pannunzio.
"Acho plenamente possível ter uma eleição em que o PT não tenha candidato a presidente. O PT pode ter candidato a vice, a outra coisa. Isso é plenamente possível. Acontece que tem de ter um candidato com a habilidade de tratar os partidos com o respeito que os partidos merecem. Não adianta as pessoas quererem brigar com o PT porque o PT aceita briga, mas é o maior partido de esquerda da América Latina", afirmou Lula.
O ex-presidente disse "lamentar profundamente" que o PT não faça parte de um grande processo de aliança contra o bolsonarismo, mas lembrou que o partido chegou em primeiro ou segundo lugar em todas as eleições desde 1989 e que, para abrir mão da cabeça de chapa, depende de um "grande acordo".
"As pessoas não podem querer que o PT abra mão dessa grandeza que o povo brasileiro lhe deu a troco de nada. Ou apresenta um candidato maior do que o PT ou não tem chance. Para poder ir para o segundo turno tem de passar pelo primeiro. Se não passar pelo primeiro, acabou. O Barcelona achava que era bom, mas perdeu de 8 a 2 para o Bayern de Munique (na semifinal da Liga dos Campeões da Europa). Você não pode prescindir de um partido que tenha no começo de uma campanha 30% a troco de quê? Você não pode dar para outro partido sem um grande acordo", disse Lula.
Segundo dirigentes petistas e assessores de Lula, não foi a primeira vez que o ex-presidente traçou este cenário. No partido, a leitura foi de que Lula mais ratificou a posição de hegemonia do PT na esquerda do que acenou com a possibilidade de uma composição com as demais forças de oposição.
Petistas lembram que quarta-feira, 19, em entrevista à rádio Folha de Pernambuco, Lula admitiu a possibilidade de ele mesmo ser candidato em 2022, caso consiga reaver na Justiça o direito de disputar eleições (ele foi condenado em segunda instância em dois processos por corrupção e lavagem de dinheiro). Além disso, ele foi o principal incentivador da estratégia de o PT lançar o maior número de candidatos possível na eleição municipal deste ano.
Líderes da oposição que trabalham há anos pela construção de uma frente ampla contra o bolsonarismo, viram a declaração de Lula com otimismo e cautela. "A defesa de uma frente progressista é altamente positiva. Estou muito confiante de que vamos unir forças e vencer a próxima eleição presidencial. Quanto ao papel de cada partido, temos tempo para debater", disse o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB).
O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, também disse que ainda falta muito tempo até 2022. Segundo ele, primeiro a oposição precisa ter bons resultados nas eleições municipais.
"A eleição de 2022 ainda está distante e a oposição precisa ter um bom resultado eleitoral neste ano para só depois pensar em eleição presidencial. Mas é positivo que haja esse desprendimento por parte do ex-presidente Lula, porque reconhece que o ciclo de hegemonia de um único partido na esquerda acabou. Seja como for, unidade eleitoral só se discute a partir de projeto de país e persistem diferenças importantes entre os partidos de esquerda e centro-esquerda", disse ele.
Na entrevista de mais de 2 horas Lula não mostrou arrependimento quanto à campanha agressiva contra Marina Silva (Rede) na reeleição de Dilma Rousseff, em 2014, e criticou Ciro Gomes (PDT). "Ciro deveria ter ficado no Brasil e declarado apoio ao [Fernando] Haddad [no segundo turno de 2018], mas ele preferiu, num gesto de rebeldia, ir para Paris", disse Lula.