Ministro da Defesa, Celso Amorim, anuncia que o governo brasileiro escolheu comprar o caça Gripen NG, da empresa sueca Saab, para renovar a frota da FAB (Ueslei Marcelino/Reuters)
Da Redação
Publicado em 18 de dezembro de 2013 às 20h04.
São Paulo - Amparada em argumentos técnicos, a escolha dos caças Gripen NG, da sueca Saab, pelo governo de Dilma Rousseff também respondeu ao lobby de um setor específico do PT.
O prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, defendia essa opção desde a retomada do processo de compra de jatos militares pela Força Aérea Brasileira, há oito anos. A decisão final de Brasília enterrou de vez as chances de uma parceria estratégica entre Brasil e Estados Unidos no setor industrial, que seria construída em torno da aliança entre a Boeing e a Embraer.
Em junho passado, durante o 50th Paris Air Show, Marinho extraiu do presidente da Saab, Hakan Buskeh, a promessa de construção de uma fábrica de aeroestruturas em sua cidade, onde possivelmente os caças Gripen serão montados.
Três meses antes, ele reunira-se com o vice-ministro das relações Exteriores da Suécia, Gunnar Wieslander, em Estocolmo, e recepcionara os reis suecos, Gustav e Silvia, em visita a São Paulo. Seu lobby em favor de um parque aeronáutico em São Bernardo do Campo, ancorado no investimento da Saab, era um dos mais teimosos no Ministério da Defesa.
O componente político seria relevante igualmente se a escolha da Força Aérea Brasileira (FAB) fosse pelo F18 Super Hornet ou o pelo Rafale, da francesa Dassault, segundo Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington e presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
A proposta da França caiu por conta do custo mais alto. A oferta americana foi prejudicada pela descoberta da rede de espionagem dos EUA nos gabinetes de Brasília e na Petrobrás e pela reação brasileira - o cancelamento da visita de Estado da presidente Dilma a Washington, prevista para outubro passado. Mas, sublinhou Barbosa, sempre houve desconfiança no governo brasileiro sobre a dose real de transferência de tecnologia da Boeing à Embraer e a intromissão do Senado americano nessa parceria.
"Os acordos de Marinho com o governo sueco e a Saab certamente foram decisivos", afirmou. "Qualquer escolha teria uma motivação política. O que me surpreende não é a opção pelo Gripen, mas o momento escolhido pelo governo para anunciá-la", completou.
No dia anterior ao anúncio, o governo brasileiro declarou não considerado a carta aberta aos brasileiros, escrita por Edward Snowden, como um pedido de asilo político. Snowden foi o responsável pela divulgação à imprensa de documentos da Agência Nacional de Segurança (nas, na sigla em inglês) sobre sua rede de espionagem no mundo. Em especial, no Brasil. Ontem, o Itamaraty informou não ter recebido do americano, asilado temporariamente na Rússia, nenhuma solicitação formal. O governo brasileiro não ofereceu asilo a Snowden.
"A posição cautelosa do governo, em relação a Snowden, elimina qualquer potencial acusação americana de que a escolha dos caças se deu por considerações ideológicas de Brasília", avaliou. "O momento do anúncio foi muito apropriado."
Outro ex-embaixador em Washington, Roberto Abdenur, concordou estar ainda em evidência o escândalo de espionagem americana no Brasil, com sérias implicações negativas para a relação bilateral. Mas ponderou que a decisão em favor dos Gripen "não foi contra a americana Boeing e a francesa Rafale".
A França, lembrou ele, manterá sua parceria estratégica com o Brasil, ampliada durante a recente visita do presidente François Hollande com a inclusão do projeto de compra de supercomputadores franceses.
Abdenur explicou ser importante também para o Brasil preservar as múltiplas áreas de diálogo e de cooperação com os EUA. Mas a recomposição da confiança mútua dependerá, inicialmente, de um pedido de desculpas pela espionagem da NSA. Barbosa vai mais longe nas exigências. Para ele, o governo de Barack Obama terá de fazer um primeiro gesto, como a elevação do Brasil ao mesmo nível de parceria estratégica mantida por Washington com a Índia e a Turquia. Caso contrário, interesses empresariais americanos no Brasil serão prejudicados, como o da Boeing.