Construção de navio para a Transpetro: o MPF suspeita que diretores do Estaleiro Rio Tietê tinham conhecimento de especificações técnicas do processo licitatório antes de ter sido anunciado (Germano Lüders/EXAME)
Da Redação
Publicado em 25 de outubro de 2013 às 13h33.
Araçatuba, SP - Após seis meses de investigação, o Ministério Público Federal (MPF) abriu nesta semana inquérito para apurar indícios de fraude e de desvio de recursos públicos na licitação aberta pela Transpetro para a compra de 100 embarcações destinadas ao transporte de etanol pela hidrovia Tietê-Paraná.
A licitação, de US$ 239,1 milhões, foi vencida, em agosto de 2010, pelo consórcio Estaleiro Rio Tietê (ERT), formado pelas empresas SS Administração e Serviços, Estaleiro Rio Maguari e Estre Petróleo, Gás e Energia.
Para justificar o inquérito, o procurador da República em Araçatuba, Paulo de Tarso Astolphi, apontou 55 itens apurados na investigação aberta em maio. O MPF suspeita que diretores do ERT tinham conhecimento de especificações técnicas do processo licitatório antes de ter sido anunciado.
O procurador diz haver indícios de que a licitação foi dirigida ao consórcio, que se beneficiou de informações privilegiadas. A Transpetro e o consórcio negam as acusações.
O grupo teria contado com o auxílio do presidente da Cooperativa do Polo Hidroviário do Tietê (Cooperhidro), Carlos Antônio Farias. O promotor cita uma reunião entre Farias, técnicos e diretores da Transpetro para discutir o projeto de transporte de etanol pela hidrovia Tietê-Paraná e a construção de terminais em Araçatuba. A reunião teria ocorrido em 2008, dois anos antes da abertura do processo de licitação.
A Coperhidro tinha a posse do terreno onde hoje está instalado o Estaleiro Rio Tietê, usado para a construção das embarcações. O terreno, doado pela Prefeitura em 1995, só poderia ser usado para construir um porto de armazenamento. A cooperativa não construiu e deveria ter deixado o terreno, mas mesmo assim, o arrendou para a SS Administração.
"O curioso é que o contrato de arrendamento, de 180 dias, foi assinado em 10/02/2010, um mês antes do anúncio formal da licitação. E termina no dia do anúncio do resultado da licitação, em 11 de agosto. No contrato, consta a cláusula de que, se a empresa não fosse vencedora, não pagaria qualquer ônus pela rescisão", diz.
Como a SS venceu, o contrato foi transferido para o Estaleiro Rio Maguari, com o valor do arrendamento dobrado de R$ 5 mil para R$ 10 mil mensais.
"O mais interessante é a condição de que, após a entrega da encomenda da Transpetro, o estaleiro será repassado para a Cooperhidro sem qualquer pagamento de contrapartida", diz o procurador.
Astolphi se disse "estarrecido" com a "quantidade de documentos encontrados sem assinaturas e de contratos sem prazo de vencimentos". "Chega a ser surpreendente a segurança e certeza demonstradas com a abertura da licitação", disse.
Outra irregularidade estaria na composição do consórcio. Os administradores da SS Administração, Érico Moraes Gueiros e André Gueiros, foram condenados pela Justiça Federal do Pará por crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e falsidade ideológica, "notadamente por aplicação de recursos de financiamento de construção de 13 balsas em finalidade diversa da prevista em contrato", diz o procurador. Segundo Astolphi, embora a pena tenha prescrito, a dupla não poderia fazer contratos com órgãos públicos.
O MPF também investigará o pagamento de R$ 22 milhões feito pela Transpetro ao ERT, mesmo sem que este tenha cumprido prazos de entrega dos comboios. O contrato entre ERT e Transpetro prevê a entrega de 20 comboios, formados por 20 empurradores e 80 barcaças. No entanto, os três primeiros comboios, que deveriam ter sido entregues até 3 de outubro deste ano, ainda não ficaram prontos.