O acordo complementa as investigações sobre a cartelização de empresas para fraudar as licitações de Angra 3 (Divulgação/Eletronuclear)
Da Redação
Publicado em 31 de julho de 2015 às 19h11.
São Paulo - O Ministério Público Federal (MPF), pela força-tarefa da Operação Lava Jato, e a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) assinaram, nesta sexta-feira, 31, acordo de leniência com a empresa Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A.
O objetivo é obter informações e provas sobre a cartelização entre as empreiteiras que disputaram as licitações promovidas pela Eletronuclear para a construção da usina Angra 3, nos anos de 2013 e 2014.
Este é o primeiro acordo nesta nova fase da Lava Jato, denominada Operação Radioatividade, que mira contratos da estatal vinculada à Eletrobras.
No âmbito da Lava Jato, já foi firmada leniência de outra empreiteira - a Setal Óleo e Gás -, que revelou ilícitos em contratos da Petrobras.
O acordo de leniência tem âmbito limitado às infrações e crimes concorrenciais, incluindo a fraude à licitação. A Procuradoria informou que não fará acusação quanto a esses crimes, exclusivamente em relação à Camargo Corrêa.
Outros delitos eventualmente praticados pelos dirigentes da empreiteira leniente, como a corrupção de funcionários públicos, continuarão a ser investigados pela força-tarefa da Lava Jato.
Segundo a Procuradoria, as outras empreiteiras, que teriam participado de cartel na Eletronuclear, serão investigadas por todos os crimes, sem qualquer benefício decorrente desse acordo.
Nesta semana, a Polícia Federal prendeu em regime temporário o presidente licenciado da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e um alto executivo da Andrade Gutierrez Energia, Flávio David Barra.
Segundo a Procuradoria da República, a existência de conluio entre as empresas envolvidas na construção de Angra 3 foi inicialmente revelada pelo ex-presidente da Camargo Corrêa Dalton Avancini, um dos delatores da Lava Jato já condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.
Avancini firmou acordo de colaboração premiada em fevereiro de 2015, no âmbito da Lava Jato.
Além de apresentar informações e provas sobre o funcionamento do cartel de empreiteiras na Petrobras e o pagamento de propina a dirigentes da estatal, Avancini também revelou que o mesmo esquema foi implementado nas licitações para a construção de Angra 3.
O acordo firmado hoje, segundo o Ministério Público Federal, complementa as investigações sobre a cartelização de empresas para fraudar as licitações de Angra 3, 'revelando evidências sobre a atuação ilícita das empresas Andrade Gutierrez, Odebrecht, Queiroz Galvão, EBE, Techint, UTC e Camargo Corrêa no esquema fraudulento'.
"É essencial a participação do Ministério Público em acordos de leniência porque tem conhecimento integral das investigações e, por isso, está em condições de avaliar o grau de novidade dos fatos e provas apresentados pela empresa, aquilatando o benefício real decorrente do acordo", afirmou o procurador Deltan Dallagnol, da força-tarefa da Lava Jato.
A Procuradoria da República destaca 'documentos que incluem e-mails, agendas de reuniões, extratos de ligações telefônicas e demonstrações de lances e preços concertados'.
Segundo a Procuradoria, esses documentos mostram que as empresas se reuniram em dois consórcios, UNA 3 (formado por Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC) e Angra 3 (formado por Queiroz Galvão, EBE e Techint).
Os dois grupos teriam deliberado que o consórcio UNA 3 seria vencedor dos dois pacotes de licitação e, em seguida, abdicaria de um dos contratos em favor do consórcio Angra 3.
"Com isso, as empresas consorciadas puderam ofertar seus lances próximos ao limite máximo do preço admitido pela Eletronuclear, sem a preocupação com a concorrência, pois já sabiam que seriam vencedoras. Ainda durante a negociação para a assinatura do contrato, as empresas também entraram em conluio para limitar os descontos concedidos ao mínimo", destaca nota do Ministério Público Federal.
"Os elementos de prova apresentados demonstram que as empresas que integraram o cartel na Petrobras continuaram a praticar crimes mesmo após a deflagração da primeira fase da Operação Lava Jato, em março de 2014. Há provas concretas de que os dirigentes das empresas ainda se reuniam para acertar os detalhes da fraude ao menos até setembro de 2014, quando foram assinados os contratos com a Eletronuclear."
Segundo o procurador Paulo Galvão, "esse acordo é uma significativa contribuição para que sejam revelados fatos e provas até então ocultos sobre um grande esquema criminoso que operava fora da Petrobras, gerando prejuízos multimilionários em obras públicas nas quais empreiteiras já investigadas na Lava Jato enriqueceram indevidamente às custas da sociedade."
Para o desenvolvimento das investigações da Lava Jato, o MPF já firmou vários acordos de colaboração premiada, que são os acordos feitos com pessoas físicas que cooperam com a Justiça.
O acordo de leniência, por sua vez, é firmado com a pessoa jurídica, podendo também abarcar seus diretores e funcionários que tenham participado das condutas ilícitas e estejam dispostos a revelar os fatos e as provas de que têm conhecimento.
Em ambos os casos, o colaborador ou a empresa colaboradora devem confessar sua participação nos ilícitos, pagar um valor a título de ressarcimento dos prejuízos causados e, especialmente, revelar fatos criminosos que ainda não eram do conhecimento das autoridades ou provas consideradas essenciais para ampliar o alcance das investigações.
Em contrapartida, têm reduzidas as penas que seriam aplicadas no caso de condenação. Os acordos são feitos apenas quando há concordância de que os benefícios superarão significativamente os custos para a sociedade.