O presidente da Associação Nacional de Mutuários (ANM), Marcelo Augusto Luz, afirmou que boa parte desses contratos foi firmada nas décadas de 1980 e 1990 (Divulgacao/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 26 de abril de 2011 às 13h29.
São Paulo - A professora Maria José Ferreira Batista comprou um apartamento em 1991, mas nunca morou nele. Adquiriu o imóvel quando ele ainda estava em construção e, em 1993, vendeu-o porque não tinha condições de arcar com as prestações do financiamento.
Hoje, ela é ré em um processo movido pela Caixa Econômica Federal (CEF). O comprador de seu apartamento não pagou regularmente as parcelas do imóvel. Como, na época da venda, Maria José não transferiu o apartamento para o nome do comprador, acabou sendo processada. “Nós não tínhamos o devido conhecimento e, agora, estamos nesta situação”, explicou.
O caso da professora é mais um dentre os milhares tramitando na Justiça brasileira. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há 200 mil processos referentes a financiamentos feitos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) aguardando julgamento.
A maioria desses imóveis, segundo o CNJ, vale R$ 80 mil e teve sua compra financiada pela CEF. Só a companhia estatal Empresa Gestora de Ativos (Emgea), criada em 2001 para administrar contratos de mutuários inadimplentes do banco, tem quase 74 mil contratos questionados na Justiça. Alguns deles, são temas de mais de um processo judicial.
O presidente da Associação Nacional de Mutuários (ANM), Marcelo Augusto Luz, afirmou que boa parte desses contratos foi firmada nas décadas de 1980 e 1990, período no qual a inflação e os vários planos econômicos acabaram tornando os imóveis praticamente “impagáveis”.
Luz disse que os financiamentos imobiliários da época tinham seu saldo devedor reajustado pelo índice de correção da poupança. Já as parcelas aumentavam de acordo com o salário do mutuário. Essa diferença de correções fez com que o saldo devedor dos financiamentos aumentasse mais que a prestação e criou um desequilíbrio nesses contratos.
“Os mutuários pagavam a parcela, mas o saldo devedor não diminuía. Pelo contrário”, afirmou. “Isso fez com que muitas pessoas procurassem a Justiça em busca de uma solução.”
Com o tempo, os processos se acumularam e, hoje, o Judiciário busca alternativas para acelerar a resolução deles. Uma das formas de agilizar são as audiências de conciliação. Nessas audiência, banco e mutuário reúnem-se para tentar um acordo que encerre a ação.
A partir de hoje (25), a Justiça Federal em São Paulo promove uma semana de audiências de conciliação na capital paulista. Foram 193 audiências. Dessas, 145 são referentes a processos de financiamento imobiliário. Quase todos firmados pela CEF.
Nas audiências, a Emgea, que administra os contratos, revisa o valor da dívida dos mutuários com base no montante já pago e no valor atual do imóvel. Também oferece descontos para aqueles que podem quitar o débito de uma vez.
Ronaldo Lanzellotti, representante da Emgea que participa das audiências de conciliação em São Paulo, afirmou que 54% dos mutuários que negociam a dívida chegam a um acordo. Em alguns casos, a quitação do imóvel é acertada em um só reunião, como aconteceu com Sandra Maria Barbosa da Silva.
A professora comprou um imóvel em 1995 e, em 2000, entrou na Justiça pois não concordava com o valor das prestações que estava pagando. Desde então, aguardava uma sentença definitiva até que hoje chegou a um acordo. “Estou aliviada”, disse ela, após acertar a quitação de seu imóvel pagando 75% menos do que o saldo devedor de seu financiamento.
Para o juiz federal José Henrique Prescendo, coordenador da semana de conciliação, esse é um exemplo de sucesso das audiências. Há anos, a Justiça Federal em São Paulo promove séries de reuniões como as de hoje e, segundo ele, vai continuar promovendo. “Quando tem um acordo, nenhuma parte sai descontente”, afirmou. “Além disso, isso agiliza demais o trabalho do Judiciário e sobra tempo para trabalharmos em outros processos”, completou.