Brasil

Justiça Federal barra revisão da Anistia

Desde que foi criado, há dois anos, o Grupo de Trabalho Justiça de Transição apresentou sete denúncias à Justiça Federal


	Documentos: além da barreira dos juízes, procuradores também enfrentam dificuldades para obter provas suficientes para sustentar as denúncias
 (Dreamstime)

Documentos: além da barreira dos juízes, procuradores também enfrentam dificuldades para obter provas suficientes para sustentar as denúncias (Dreamstime)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de janeiro de 2014 às 15h06.

São Paulo - A Justiça Federal está barrando as tentativas do Ministério Público Federal (MPF) de punir agentes de Estado acusados de cometer crimes durante o período da ditadura.

A tese defendida pelos procuradores federais de que determinados crimes, como o sequestro e a ocultação de cadáver, são considerados permanentes e não foram beneficiados pela Lei da Anistia de 1979 não encontra receptividade entre juízes federais.

Desde que foi criado, há dois anos, o Grupo de Trabalho Justiça de Transição, vinculado à 2.ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, apresentou sete denúncias à Justiça Federal.

Três envolvem o sequestro de militantes políticos que se opunham à ditadura; e outras duas, o crime de ocultação de cadáver. Desse total, apenas três ações estão em andamento, patinando ainda na primeira instância; duas foram rejeitadas; uma aguarda a definição de um pedido de habeas corpus; e a sétima ainda não teve o mérito apreciado.

Além da barreira dos juízes, os procuradores também enfrentam dificuldades para obter provas suficientes para sustentar as denúncias.

Quando o grupo de trabalho foi criado, imaginava-se que o número de denúncias seria bem maior do que as sete apresentadas até agora.

Em suas manifestações, os juízes têm rejeitado a tese dos procuradores de que os crimes têm caráter permanente e, portanto, não foram anistiados. Eles também não aceitam as referências a cortes internacionais, segundo as quais crimes contra a humanidade não prescrevem e não podem ser anistiados.

Os magistrados indicam sempre que se orientam pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O que mais citam é o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 153, proposto pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).


DOIS LADOS

O que se questionava naquele julgamento era o benefício da anistia para agentes de Estado envolvidos em casos de violações de direitos humanos. O STF rejeitou os argumentos da OAB e revalidou a interpretação de que a lei beneficiou tanto as vítimas de perseguições quanto perseguidores.

O grupo do MPF surgiu após a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Brasil na ação que ficou conhecida como Caso Gomes Lund, por violações de direitos humanos no episódio da Guerrilha do Araguaia.

De acordo com a sentença, o país deve investigar e denunciar os autores dos crimes de desaparecimento forçado das vítimas.

Não por acaso, a primeira tentativa de criminalização desencadeada pelo MPF ocorreu em Marabá, na região paraense onde ocorreu a guerrilha. Ela envolve o coronel da reserva Sebastião Curió, um dos principais responsáveis pelas ações que resultaram na eliminação do foco de resistência armada à ditadura.

Curió foi denunciado pelo sequestro de cinco guerrilheiros, cujos corpos nunca foram encontrados. Na primeira investida do MPF, a ação foi rejeitada.

Na segunda, os procuradores tiveram sucesso: em agosto, a juíza Nair Cristina Corado Pimenta de Castro, da 2.ª Vara Federal de Marabá, acatou a denúncia.

Mas, em novembro, uma decisão liminar do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região suspendeu a ação, até que seja julgado o pedido de habeas corpus impetrado pela defesa.


ARGUMENTOS

O voto do relator, desembargador Olindo Menezes, contém os principais argumentos da Justiça Federal para barrar o MPF. Entre outras coisas, o magistrado rebate a ideia de que a justiça brasileira deveria se guiar pela Corte Interamericana. Diz que a sentença "não interfere na decisão do STF sobre a matéria".

Para o desembargador, o que a corte internacional definiu foram investigações destinadas apenas a "propiciar o conhecimento da verdade histórica". Isso não significa, diz ele, "abertura de persecução penal em relação a (supostos) fatos incluídos na anistia da Lei n.º 6.683, de 19 de dezembro de 1979".

Ainda segundo Menezes, a tese do crime permanente é "engenhosa", mas não se sustenta, devido a dois fatores: "Falta de justa causa para a ação penal, por um (anistia) ou por outro (prescrição) fundamento".

A denúncia mais recente do MPF foi apresentada em dezembro à subseção da Justiça Federal em Rio Verde. Trata-se do caso dos jovens Maria Augusta Thomaz e Márcio Beck Machado, integrantes do Movimento de Libertação Popular, cujos corpos desapareceram há 40 anos, após terem sido mortos pela polícia. A tese do MPF é de que não se pode alegar prescrição no caso, uma vez que o delito de ocultação de cadáver, previsto no artigo 211 do Código Penal, é permanente.

Para o procurador da República que apresentou a denúncia, Wilson Rocha Assis, a responsabilização penal dos agentes que praticaram o crime é "exigida por tratados internacionais subscritos pelo Brasil".

No Rio, o MPF apresentou argumentos semelhantes ao denunciar cinco agentes de Estado, militares e civis, pelo sequestro, tortura e desaparecimento do líder comunista Mário Alves de Souza Vieira.

Os procuradores já previam, por manifestações anteriores às denúncias, a resistência dos juízes. Eles devem, porém, continuar insistindo. O objetivo é levar a questão de volta ao STF, para debatê-la à luz da decisão da Corte Interamericana. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:Crimecrime-no-brasilDitaduraGovernoHistóriaJustiçaMinistério Público

Mais de Brasil

Aliança Global contra a Fome tem adesão de 41 países, diz ministro de Desenvolvimento Social

Polícia argentina prende brasileiro condenado por atos antidemocráticos de 8 de janeiro

Homem-bomba gastou R$ 1,5 mil em fogos de artifício dias antes do atentado

O que muda com projeto que proíbe celulares nas escolas em São Paulo