O escândalo abalou o governo Lula: Lula, que nega ter conhecimento da existência do esquema, se declarou traído e fez um pedido de desculpas público (©AFP / Pedro Ladeira)
Da Redação
Publicado em 31 de julho de 2012 às 12h59.
Brasília - O Supremo Tribunal Federal (STF) irá julgar a partir desta quinta-feira os 38 suspeitos do maior escândalo de corrupção na política brasileira, o mensalão, que abalou o governo Lula e levará importantes lideranças para o banco dos réus.
No "julgamento do século" --como tem chamado a imprensa-- o STF julgará 38 ex-ministros, ex-deputados, empresários e banqueiros envolvidos na suposta rede de compra de votos no Congresso orquestrada pelo Partido dos Trabalhadores entre 2002 e 2005. O caso imortalizou uma das práticas mais enraizadas na política brasileira: o pagamento de favores políticos.
Os acusados deverão responder por um sofisticado plano para compra de apoio da coalizão no Congresso no primeiro governo de Lula (2003-2007) e prestar contas da campanha eleitoral de 2002, que o levou ao poder, segundo a Procuradoria Geral da República.
Lula foi excluído da "Ação Penal 470", mas o PT perdeu a bandeira contra a corrupção que carregava desde a origem do partido, o que pode ser um empecilho nas eleições municipais de outubro.
Para Carlos Pereira, professor da Fundação Getúlio Vargas, o resultado do julgamento será "visto como um sinal de castigo ou tolerância" para "um governo que se inclinou por mecanismos ilegais para manter sua base aliada no Congresso".
"É uma janela de oportunidade para que o Brasil demonstre de maneira clara que tipo de sociedade quer ter: instituições fortes, independentes, capazes de punir os desvios, ou se será sempre a sociedade que acomoda interesses", explicou Pereira, autor de vários artigos sobre o tema.
Os 38 acusados devem responder por peculato, lavagem de dinheiro, corrupção e fraude, crimes pelos quais podem pegar penas de até 45 anos de prisão.
As primeiras sentenças devem ser anunciadas em meados de setembro.
O julgamento envolve dirigentes que fazem parte da história do PT, incluindo três ex-ministros: José Dirceu (da Presidência), Luiz Gushiken (da Comunicação) e Anderson Adauto (de Transportes), além de ex-congressistas de quatro partidos que formaram a base aliada de Lula.
O caso foi revelado em 2005, quando o então deputado aliado Roberto Jefferson, irritado com a má distribuição de poder, informou à imprensa sobre a existência de um esquema de corrupção no PT.
O "mensalão" funcionava por intermédio do publicitário Marcos Valério, que fechava contratos para realizar campanhas do governo.
Os recursos que não eram utilizados nas campanhas eram entregues a parlamentares ou a seus assessores, enquanto Marcos Valério contraía empréstimos com bancos privados e públicos que iam parar nos cofres do partido.
Não existe um cálculo de quanto foi desviado, mas, de acordo com a acusação, o esquema envolveu "milhões de reais".
O ex-tesoureiro do PT e peça-chave do caso, Delúbio Soares, negou o pagamento de quantias mensais aos parlamentares, mas reconheceu que pode ter cometido um crime eleitoral por não registrar todos os recursos que ingressavam ao partido.
Delúbio --único acusado que admite alguma responsabilidade-- foi expulso do PT em 2005 e readmitido no ano passado.
Lula, que nega ter conhecimento da existência do esquema, se declarou traído e fez um pedido de desculpas público.
"Não houve compra de votos no Congresso, muito menos pagamento --nem mensal nem de qualquer título-- a parlamentares para votar a favor do governo", disse o PT em um comunicado.
O julgamento dos dirigentes do PT destaca as falhas do sistema político brasileiro, como o financiamento privado das campanhas e o custo das alianças para governar, pois nenhum partido pode alcançar sozinho a maioria no Congresso.
"Lula ganhou as eleições, mas, para governar, precisou armar uma coalizão com vários partidos de centro e de direita que precisavam de dinheiro para pagar as dívidas da campanha. Assim se fundiram os dois problemas", disse Carlos Felix de Melo, doutor em Ciências Políticas e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.