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Juiz nega quebra de sigilo de David Miranda após relatório do Coaf

Coaf identificou movimentação "atípica" de R$ 2,5 milhões na conta do deputado; Miranda e seu marido, o jornalista Glenn Greenwald, alegam "retaliação"

Coaf: o relatório sobre David Miranda foi divulgado 2 dias após reportagem com conversas entre procuradores do MPF (Michel Jesus/Agência Câmara)

Coaf: o relatório sobre David Miranda foi divulgado 2 dias após reportagem com conversas entre procuradores do MPF (Michel Jesus/Agência Câmara)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 12 de setembro de 2019 às 13h48.

Última atualização em 12 de setembro de 2019 às 13h50.

Ao negar a quebra dos sigilos bancário e fiscal do deputado federal David Miranda (PSOL-RJ), o juiz auxiliar Marcelo Martins Evaristo da Silva, da 16ª Vara de Fazenda Pública do Rio, escreveu que a medida só deve ser adotada em "circunstâncias excepcionais", já que pode produzir impacto negativo na imagem do investigado.

Ele determinou que Miranda e seus quatro assessores que entraram no radar do Ministério Público do Rio após relatório do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) sejam ouvidos antes da adoção de qualquer iniciativa que viole o sigilo.

Dois dias após o site The Intercept Brasil, comandado pelo marido do deputado, Glenn Greenwald, começar a publicar reportagens com conversas entre procuradores do Ministério Público Federal, o MP do Rio recebeu um documento do Coaf que identificava movimentação de R$ 2,5 milhões na conta do parlamentar no período de 1 ano. Miranda e Greenwald alegam "retaliação".

O juiz também citou jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) para negar a quebra do sigilo no atual estágio da investigação. "A 'cautela' e a 'prudência' recomendam a instauração de um contraditório preliminar", anotou antes de elencar motivos mais concretos para não autorizar a quebra.

Entre esses motivos, alegou que o eventual convite feito a Miranda e seus assessores para prestarem depoimento não afetará a investigação, já que as informações apuradas se referem a fatos ocorridos no passado e que estão nas mãos de instituições financeiras e da Receita Federal, "resguardadas, portanto, de quaisquer iniciativas dos interessados no sentido de sua inutilização ou distorção enquanto documentos dotados de força probante."

Outro questionamento feito pelo juiz diz respeito à decisão do ministro Dias Toffoli, presidente do STF, que suspendeu, a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), investigações que tenham usado dados de órgãos como o Coaf sem autorização judicial prévia.

No pedido da quebra de sigilo de Miranda, o MP alegou que a decisão de Toffoli não valeria para casos de improbidade administrativa, que correm na esfera cível. O juiz Marcelo Silva no entanto, refutou o argumento e afirmou que seria "inconcebível" impedir o uso dos dados para fins criminais e os autorizar livremente em ações de improbidade.

Em nota, Miranda disse que vê "retaliação" do MP por causa das reportagens publicadas pelo site de seu marido. Afirmou ainda que seus advogados estão preparando os esclarecimentos solicitados pelo juiz a fim de comprovar que os valores movimentados por sua conta não são "atípicos", como classifica o Coaf.

Além disso, em um argumento sempre usado pelas defesas de Flávio Bolsonaro e do ex-assessor dele, Fabrício Queiroz, Miranda reclamou do vazamento do caso para a imprensa - considerado por ele a "única ilegalidade" na história toda. A investigação corre sob sigilo de Justiça.

Veja o que diz David Miranda:

"Há duas semanas, soube por meio de matéria jornalística que havia um procedimento aberto pelo MP-RJ que investigava minhas movimentações financeiras, procedimento que supostamente corria em segredo de Justiça. No mesmo consta movimentação de R$ 1,3 mi em minha conta bancária. Quando o MP se refere a movimentação financeira, soma entrada e saída em conta bancária - o que induz à percepção de que o dinheiro que passou pela conta foi o dobro do que realmente a conta movimentou.

Como eu disse anteriormente, o relatório enviado pelo Coaf ao MP-RJ - dois dias depois que meu marido, o jornalista Glenn Greenwald, deu início à publicação da série de reportagens com revelações sobre a Lava Jato - mostra uma quantia totalmente compatível com a renda de nossa família. Desde o início da Vaza Jato, esperávamos este nível de retaliação e desinformação deliberada.

Para além da renda de parlamentar, possuo sociedade com meu marido em uma empresa com projetos importantes. O salário anual do Glenn - como cofundador e jornalista investigativo do portal The Intercept e da Intercept Brasil - é informação pública, porque essas empresas são ONGs. Qualquer jornalista pode compará-lo com os valores reportados pelo Coaf para constatar a compatibilidade óbvia. Além disso, seus projetos - dos quais participei como parceiro - incluem livros que figuram nas listas dos mais vendidos do mundo, filmes e palestras.

Sobre a tal gráfica citada na matéria, não faço ideia do que se trata, nunca rodei material em Mangaratiba. Sempre fiz meus materiais de divulgação na cidade do Rio e, poucas vezes, em Niterói.

Na semana passada, o juiz negou o pedido do MP-RJ para quebrar meu sigilo bancário, para que eu pudesse enviar os documentos que demonstram a origem dessa renda. Nossos advogados estão fazendo exatamente isso para cumprir a ordem do juiz. A única ilegalidade existente é a praticada por aqueles que vazam essas informações para prejudicar minha reputação como retaliação pelas reportagens do Intercept. Estou aguardando a citação da Justiça para explicar detalhadamente meus rendimentos", diz o texto do parlamentar.

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