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Rodovias, ferrovias, 'antídoto' para o câmbio: a agenda de R$ 160 bi do Ministério dos Transportes

Em janeiro, governo anunciou um cronograma de 15 leilões para este ano apenas em rodovias, mas a tendência é que o número de certames seja maior, segundo George Santoro ao podcast EXAME INFRA  

Em seu terceiro episódio, o EXAME Infra recebe George Santoro, secretário executivo do Ministério dos Transportes, para falar sobre o pipeline de investimentos deste ano do governo federal em rodovias e ferrovias (Exame Infra/YouTube)

Em seu terceiro episódio, o EXAME Infra recebe George Santoro, secretário executivo do Ministério dos Transportes, para falar sobre o pipeline de investimentos deste ano do governo federal em rodovias e ferrovias (Exame Infra/YouTube)

Publicado em 3 de fevereiro de 2025 às 08h00.

Última atualização em 3 de fevereiro de 2025 às 09h05.

O governo federal pretende conceder 15 rodovias em 2025 para o setor privado, em leilões que devem movimentar R$ 161 bilhões de investimentos ao longo dos contratos. Mas, apesar de a meta ter sido detalhada no último dia 28 de janeiro, o Ministério dos Transportes não descarta a possibilidade de realizar mais certames que o previsto, ampliando o pipeline.

"Nossa meta é publicar 10 editais [de ativos estressados que foram objetivo de licitação] e estão tramitando no Tribunal de Contas da União (TCU) esse ano. Eu acredito que conseguiremos realizar os leilões ainda nesse ano. Então de R$ 160 bilhões a tendência é aumentar", diz George Santoro, secretário-executivo da pasta, ao podcast EXAME INFRA.

Desde o final do ano passado, o governo afirma ter planos para conceder rodovias ao setor privado com contratos mais "enxutos"  – um modelo que tem sido chamado de "inteligente", com estradas com fluxo menor de veículos, mas com transporte de carga relevante. A maior parte delas deve ter o leilão programado para 2026, porém é possível que um dos contratos seja testado já neste ano, explicou também o secretário.

Santoro é o convidado do terceiro episódio do programa realizado pela EXAME, em parceria com a empresa Suporte. O podcast tem como proposta debater os desafios e as grandes transformações da infraestrutura brasileira que, segundo Santoro, promete ser marcada por um pipeline de investimentos cada vez mais robusto no setor de concessões e parcerias público-privadas (PPPs).

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Para 2026, o Ministério dos Transporte já prevê, ao todo, a realização de mais 20 leilões. Eles devem ser detalhados neste mês de fevereiro para atrair, sobretudo, empresas do exterior.

O governo mostra-se positivo sobre as metas, apesar de no ano passado ter conseguido realizar sete dos 13 leilões previstos.

Santoro justifica que o número abaixo do esperado foi resultado da dificuldade de "sair da letargia" e da "descrença" dos skateholders do setor de que o governo conseguiria colocar os editais da rua.

Ele também lembra que, embora abaixo do total previsto, a quantidade de leilões foi recorde.

"Conforme foi acontecendo, a turma começou a acreditar e o mercado financeiro, ao analisar os projetos, começou a montar consórcios, [como]  vários atores também. Eles começaram a estruturar e criar áreas de infraestrutura para participar dos nossos projetos de transporte", diz Santoro.

Cronograma dos leilões de rodovias

No calendário de 2025, o primeiro leilão está marcado para 27 de fevereiro e envolve a Rota Agro Norte, na BR-364, que conecta Rondônia e Mato Grosso à hidrovia do Rio Madeira.

Esse projeto, inédito em termos de concessão, se apoia em uma modelagem orientada para a rota do agronegócio. A expectativa é de que a safra deste ano movimente de 15 a 16 milhões de toneladas na hidrovia – volume que, originalmente, estava projetado para ser alcançado somente em 2030-2031.

Na sequência, está previsto para o dia 4 de abril o leilão da Ponte Rodoviária sobre o rio Uruguai, entre as cidades de São Borja, no Rio Grande do Sul, a Santo Tomé, na Argentina. No mesmo mês também deve ocorrer a concessão da BR-040 – corredor que liga o Rio de Janeiro a Brasília.

Entre os atrativos desse edital está a retomada das obras de um túnel na Serra de Petrópolis, cuja construção, paralisada há 10 anos por questões judiciais e contratuais, foi reestruturada para viabilizar o fluxo de carga e passageiros em uma via de alta importância para a região.

Para o mês de maio, será ofertada a "Rota da Celulose" que envolve o trecho da BR-262/267MS e MS-o40;338/395. O edital foi publicado em parceria com o governo do Mato Grosso do Sul.

A meta do governo é também publicar, no mesmo mês, os editais de três concessões de ativos considerados estressados, como a BR-060/364/GO/MT, conhecida como a "Rota do Agro" e os lotes 4 e 5 das Rodovias Integradas do Paraná.

Em junho também deve ser lançado o edital do trecho da BR-116 que liga Feira de Santana, na Bahia, a Salgueiro, em Pernambuco. Na sequência, em agosto, está previsto o edital do trecho com ligação da BR-116 em Minas Gerais para a BR-251, também no estado. A Rota Agro Central (BR-070/174/364/MT-RO) também deve ser divulgada no mesmo mês.

A lista de lançamento de editais contemplada ainda a Rota Integração do Sul (BR-116/158/392/290), no Rio Grande do Sul, e as Rodovias do Recôncavo (BR-116/324) na Bahia, ambas em setembro.

Investimentos privados: R$ 500 bilhões

O Ministério dos Transportes espera que os investimentos privados, que já superaram os públicos no setor de transporte em 2024, continuem crescendo e representem, a médio prazo, até 0,7% a 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB).

"Temos que acelerar isso [concessões] porque a nossa capacidade [como Estado] é muito aquém da necessidade de logística que o Brasil precisa e da expectativa de crescimento do agronegócio e da indústria brasileira nos próximos anos. Então, se não acelerarmos essa carteira, não teremos como atender [essa demanda]. Abrimos uma 'boca de jacaré' muito grande a partir de 2024 do setor privado em relação ao público e isso continua e se expande", afirma o secretário.

"Estamos estimando uma carteira de rodovia e ferrovia, que a gente deve contratar dentro do governo do presidente Lula, superior a R$ 500 bilhões", complementa.

Ferrovias no plano

Além do modal rodoviário, o governo planeja lançar leilões para o setor ferroviário. Uma novidade para esse tipo de transporte que, em 40 anos, registrou apenas três leilões.

Para isso, Santoro diz apostar em uma modelagem que prevê aporte público para cobrir o gap de viabilidade econômica, selecionando o vencedor com base na menor necessidade de capital do governo. A previsão é de que o edital do Arco Ferroviário do Sudeste (F118) seja lançado até o meio do ano, com leilão previsto para o final de 2025.

O modelo ferroviário, contudo, apresenta desafios distintos do rodoviário, já que a construção dos ativos – que pode levar de cinco a seis anos – ocorre sem geração imediata de receitas, exigindo um volume de carga elevado para tornar o projeto viável. "Existe um esforço financeiro gigantesco para compensar essa defasagem, o que torna o risco elevado se não houver demanda suficiente", explica o secretário.

Destravando o projeto Ferrogrão

Entre os projetos prioritários, destaca-se o da Ferrogrãoferrovia que conectará a região produtora de grãos do Centro-Oeste ao estado do Pará, desembocando no Porto de Miritituba, e que estava paralisada desde 2013 e com cálculos defasados.

Após uma decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendera qualquer atividade da União sobre o projeto, a Advocacia-Geral da União (AGU) interveio para autorizar a atualização dos estudos. Sob o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foram criados grupos de discussão com a sociedade – tanto no STF quanto no Ministério dos Transportes – para ouvir as demandas e corrigir os problemas identificados.

A empresa responsável pela elaboração do projeto atualizou os estudos, os quais foram validados pela Infra S.A. e encaminhados para a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Um dos pontos polêmicos foi a questão da reserva ambiental.

Para contornar a controvérsia, o atual governo definiu que o projeto utilizará 100% da faixa de domínio já existente na rodovia, sem avançar sobre áreas protegidas. Além disso, foi incluída a compensação ambiental – medida que o projeto anterior não previa –, em consonância com as exigências legais e ambientais, segundo Santoro.

O secretário explica que, com o material revisado, o próximo passo é a avaliação pela ANTT e pelo TCU, para que, posteriormente, o Supremo possa autorizar o avanço do leilão.

Parcerias e atração de investidores internacionais

A inclusão de padrões de sustentabilidade também sido crucial para a modernização dos contratos de modo a torná-los compatíveis com as exigências europeias.

Santoro observa que essa mudança já resultou no retorno da participação internacional.

"Ano passado, vimos a primeira empresa estrangeira, a Vinci, ganhar um leilão em Minas Gerais, algo que não ocorria desde 2007". Com o recorde de leilões e as modernizações, o governo também planeja atrair investidores asiáticos, ampliando o leilão para operadores que, tradicionalmente, enfrentam barreiras para participação devido a prazos longos de autorização.

Eventos de Market Sounding têm reforçado esse movimento, afirma o secretário do Ministério dos Transportes. Em São Paulo, uma apresentação do Arco Ferroviário do Sudeste contou com a participação de 22 operadores, entre eles, estrangeiros.

'Antídoto' para os juros e o câmbio

Na busca por atrair investimentos, Santoro também detalhou em primeira mão ao podcast EXAME INFRA que o governo vai publicar uma portaria mudando a forma de indexação dos contratos de concessões de infraestrutura, com o objetivo de reduzir os riscos financeiros e mitigar impactos das oscilações da taxa de juros e do câmbio.

"Precisamos fazer um mecanismo para corrigir isso [essas flutuações da taxa de juros e do câmbio] e dar um reequilíbrio. Estamos estudando e devemos soltar isso até março", afirmou o secretário do Ministério dos Transportes.

Uma das principais alterações em estudo é a revisão da fórmula de indexação dos itens de Opex (custos operacionais) e Capex (investimentos de capital).

Atualmente, esses valores são corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), mas há questionamentos sobre sua eficácia na compensação de oscilações no preço de insumos específicos, como o betuminoso — material que faz o cimento e asfalto —, que pode representar entre 40% e 50% do custo total de um projeto.

EXAME INFRA

O EXAME INFRA é um podcast da EXAME em parceria com a empresa Suporte, especializada em soluções para obras e projetos de infraestrutura. Com episódios quinzenais disponíveis no YouTube da EXAME, o programa se debruçará sobre os principais desafios do setor de infraestrutura no Brasil.

Veja os episódios:

Ep. 1 - Rafael Benini, secretário de Parcerias e Investimentos: SP planeja concessões de rodovias, CPTM e mais com R$ 30 bi em investimentos

Ep. 2 - Brendon Ramos, da Via Appia: Com prazo para setembro de 2026, Via Appia quer antecipar entrega final do Rodoanel Norte

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