Ataques nas redes: influenciadores começaram a receber ofensas pelo Twitter, pelo WhatsApp e prints com seus rostos (Kacper Pempel/Getty Images)
Clara Cerioni
Publicado em 26 de maio de 2019 às 08h00.
Última atualização em 26 de maio de 2019 às 08h00.
Caio* viu nascer, em meados de 2011, grupos de discussão e blogs alinhados ao pensamento de direita como um contraponto aos blogs “progressistas” ligados ao Partido dos Trabalhadores. E adorou. Identificado com o liberalismo, ele se engajou nesses grupos e começou a contribuir com alguns sites que surgiram na época.
“Inicialmente eram grupos de ‘reacionários’, entrava tudo: liberais, conservadores, qualquer coisa que não fosse petista”, ele conta.
Esses mesmos grupos foram extremamente participativos no processo de impeachment de Dilma Rousseff, o que agradou ao jovem, que na época já se tornara redator e influenciador. Mas, nos anos seguintes, veio a decepção. Quando chegou a eleição presidencial de 2018, grupos que antes ele considerava plurais se tornaram ambientes predominantemente pró-Jair Bolsonaro.
Por discordar de parte das ideias do então candidato, Caio virou inimigo número 1 e passou a ser vítima de linchamentos virtuais – começou a receber ofensas pelo Twitter e pelo WhatsApp e prints com seu rosto foram espalhados por bolsonaristas em páginas do Facebook.
Os ataques o levaram à depressão e tiraram oportunidades de trabalho. “Passei o último ano no inferno da minha vida. Mando currículo e nem me dão resposta”, diz.
Caio é um dos influenciadores ligados à direita atacados pelas hordas bolsonaristas nas redes sociais com quem a Pública conversou nos últimos três meses. Os ataques vão da divulgação de endereços até ameaças veladas contra filhos e sugestão de estupro.
Os entrevistados revelaram padrões desses ataques, além de fatores-chave que contribuíram para a radicalização desses grupos –inclusive mudanças do algoritmo do Facebook.
E embora tenham também sofrido ou assistido a ataques organizados por grupos de esquerda durante os governos petistas, todos concordam: nunca viram linchamentos virtuais tão intensos quanto os que sofreram de apoiadores do atual presidente.
Liberal “desde os 15 anos”, o economista e colunista Rodrigo Constantino é uma das principais vozes do antipetismo no Brasil há mais de uma década. Mas, apesar de fortemente identificado com o pensamento de direita, Constantino faz recorrentes críticas ao governo de Jair Bolsonaro em seu blog no site do jornal Gazeta do Povo e nas suas redes sociais. Suas opiniões o levaram a virar alvo daqueles que ele chama de “direita jacobina”.
“Eu não me lembro de um grau de ódio e de ataque pessoal e de movimento de manada parecido com o dessa turma olavete nem mesmo na época do PT. Eles são piores nesse aspecto”, resume o colunista. “Eu não estou dizendo que eles são piores que os petistas. Eu estou dizendo que, para formadores de opinião ligados à direita, eu acho que é pior”, diz.
Para Constantino, a razão é que eles seriam vistos como uma ameaça. “Eles sabem que cada vez mais as críticas começam a surgir de movimentos dentro da própria direita, cansada desse modus operandi e dessa postura totalitária e autoritária.
Eles sabem que isso vai criar um cisma e que está colocando em xeque a sobrevivência deles como monopolistas da direita”, explica. “Eles entendem que esse tipo de crítica é muito mais perigosa para eles do que bater boca com petista. Pelo contrário, bater boca com petista para eles é ótimo. É questão de sobrevivência.”
Desafeto de Olavo de Carvalho “desde a época do Orkut”, Rodrigo Constantino é frequentemente chamado de “Rodrigo Cocô Instantâneo” ou “Cocôstantino” por alunos do escritor e pelo próprio Olavo.
“Eu levo na brincadeira. Quando ele coloca uns apelidos bons, eu acho engraçado. O Rodrigo Cocô Instantâneo, não é dos melhores, mas é ok. Não é ruim. Mas aí a legião dos abobalhados vem atrás, só se pegando nisso. Sem ter a capacidade de entender que é uma ironia e que o que importa é debater os argumentos”, afirma.
Para ele, os bolsonaristas “nunca souberam conviver bem com críticas” e podem ser caracterizados como “minions” porque atuam em grupo.
“Quando eu escrevia um texto elogiando Bolsonaro ou elogiando Olavo de Carvalho, vinha uma chuva de likes e compartilhamentos e eu era o máximo. Mas quando eu escrevia algum artigo criticando — e eu sempre mantive essa coerência e essa independência — aí eu era um vendido, um comunista”, explica.
Para o colunista da Gazeta do Povo, os bolsonaristas são “petistas com sinal trocado”. “Eles precisam de inimigos constantes, nós contra ele, 100% contra mim ou a favor de mim. É o tempo todo. E a ameaça precisa ser iminente, perigo real e imediato. Ou seja, há globalistas e comunistas debaixo da cama o tempo todo. […] Pra eles ou você enxerga o petismo em todo lugar e como uma ameaça constante, está com eles e defende os métodos deles, ou você também se vendeu e virou um petista.”
Muito crítica ao PT, Gabriela* angariou seguidores antipetistas e pró-Bolsonaro ao longo dos anos. No entanto, ela entrou na mira dos linchamentos virtuais quando passou a tecer críticas ao governo de Jair Bolsonaro.
A Pública entrou em contato com ela em uma terça-feira de março e combinou uma entrevista por telefone no dia seguinte. Durante as menos de 24 horas entre uma conversa e outra, ela foi atacada mais uma vez. Um influenciador bolsonarista publicou no Twitter um print de uma publicação de Gabriela e o linchamento começou.
Foi o sétimo ataque em massa que ela sofreu desde 2016, segundo contabiliza. “Surtada”, “tapada”, “precisa de medicação”, “meretriz do jornalismo”, “calcinha suja”, “sonsa”, “patética” e “imbecil” são apenas algumas das frases que ela recebeu como resposta a publicações nos últimos meses – a grande maioria vindo de grupos bolsonaristas e olavistas.
“Eles não querem ninguém que tem pensamento liberal, isso eu descobri recentemente. São totalitários, então quem é a favor das liberdades individuais não é tolerado. Eles começaram com esse padrão. É a turma mais agressiva que já vi na política. Eu nunca vi gente que tenha tanta raiva, tanta falta de autocontrole quanto essa turma. Nunca vi.”
Parte dos ataques foi incentivada dentro de um grupo de WhatsApp ao qual ela teve acesso nos meses que antecederam a eleição de 2018. Além de textos, áudios e vídeos de apoio a Jair Bolsonaro, o grupo, com centenas de usuários, era frequentemente utilizado para incitar linchamentos. Em um ao qual a Pública teve acesso, um rapaz manda o link de uma publicação no Facebook e incentiva: “Vamos dar uma oprimida nesse desinformante aqui”.
O primeiro ataque que Gabriela sofreu, em 2016, seguiu trajetória semelhante. Após ter tido uma desavença com um influenciador da extrema direita, o desafeto compartilhou postagens suas em grupos de WhatsApp pedindo que a atacassem. “Eu quase perdi meu emprego e até ameaça de estupro eu recebi, ameaças de que iam matar meu filho. Só que assim eu posso perder meu emprego, mas eu não cedo para canalha”, diz.
Em outros episódios, além de ligarem para a empresa em que trabalhava e para seu patrocinador, seu endereço foi divulgado ao lado de uma incitação à sua morte. “[Eles atacam] deliberadamente para tentar prejudicar as pessoas na vida pessoal. Comigo eles efetivamente conseguiram, porque eu tive até perdas financeiras”, conta ela, que perdeu contratos para dar palestras.
Gabriela avalia que os ataques são especialmente virulentos quando os alvos são mulheres. “Eles vão mais pro lado pessoal, causam mais na sua vida. Não sei se eles acham que expondo mulher você prejudica mais ela, ou se é uma questão de crença de machismo”, resume.
“Vejo isso com muita nitidez, que é uma coisa que a gente não via quando os petistas atacavam. Os petistas até me chamavam de velha, mas esses são ‘puta’”, afirma.
Segundo o assessor do projeto de Segurança Digital da ONG Artigo 19, Thiago Firbida, os ataques contra mulheres são piores do que contra homens. “Geralmente mobilizam questões, ataques e xingamentos de conotação sexual, inclusive ameaças de assédio sexual, abuso. E também mobilizam muito questões ligadas a famílias, filhos etc. para intimidar mulheres”, diz.
O colunista do jornal O Globo e comentarista da Rádio Jovem Pan Carlos Andreazza é mais uma figura ligada ao pensamento de direita que se tornou alvo frequente do que chama de “milícias digitais”.
Editor de um livro de Olavo de Carvalho, além de outras obras conservadoras, ele acredita que é visto como uma espécie de “traidor”. “Por eu ter editado autores de direita, houve uma expectativa de que aquele editor, na sua porção jornalista, fosse ser defensor do projeto de poder bolsonarista”, conta.
O posicionamento contrário veio ainda em 2017, quando a ascensão de Jair Bolsonaro ficou clara. “Eu achei importante, enquanto indivíduo do debate público, dizer que eu não era Bolsonaro, muito pelo contrário, que eu não achava ele um conservador, porque ele não é, mas um reacionário.
Essa frustração que eu causei progressivamente a partir de 2017, mas sobretudo durante a campanha eleitoral, fez com que eu fosse potencializado como inimigo na condição de pária, de traidor. E desde então eu tenho convivido – e eu convivo bem, porque eu sou do debate público – com todo tipo de ataque, de desonra, de mentira, de desinformação, de tentativa de assassinato de reputação”, conta Andreazza.
O colunista identifica dois padrões de ataque: um diário, mas de menor intensidade, que atinge qualquer publicação sua e é normalmente feito por anônimos, e outro que se inicia nos “blogs satélites do bolsonarismo”, quando algum artigo ou comentário no rádio tem alcance maior.
“[O ataque diário] é aquele padrão. Uma conta de usuário Maria008855, com zero seguidores e que começa a me atacar, me xingando de tudo. Não sei se é robô ou alguém operando um número de contas. Aí quando alguma opinião minha repercute mais do que o habitual, eu volto pro tópico de ataques. É um ciclo de algo como uma semana de ataques violentos e obviamente coordenados. É praticamente mensal. Tem método”, afirma Andreazza.
O comentarista da Rádio Jovem Pan enxerga os linchamentos dentro de uma lógica de “campanha eleitoral permanente”, em que Bolsonaro precisa “vencer o establishment” enraizado na máquina pública, em uma guerra sem fim. Nessa “batalha” os poderes intermediários, como o Congresso e o Supremo, podem ser “facilmente esmagados ou descartados”.
“É como se nós estivéssemos em um terceiro turno eterno. A lógica é a seguinte: o Jair Bolsonaro ganhou a eleição, foi muito bem-sucedido por meio de uma mobilização popular em redes sociais, que eles vendem como uma mobilização social maior do que isso. Essa mobilização foi capaz de vencer o establishment político, no que inclui a imprensa — nós, portanto — derrotados por ele. Mas essa guerra não acabou com a vitória”, explica Andreazza.
Para a cientista social Esther Solano, a prática segue a tendência de outros regimes de extrema direita no mundo. “Para essa política se manter, é preciso alimentar o tempo todo a retórica do inimigo. Uma vez que eles chegam ao poder, precisam se manter populares, e a forma que eles fazem isso é justamente dividindo o país, criando uma polarização, porque normalmente são governos — e aí temos o exemplo perfeito do Bolsonaro — muito despreparados tecnicamente e muito vazios programaticamente.”
Entre os colegas de profissão contra os quais Andreazza também presenciou ataques, estão o diretor de jornalismo da Rádio Jovem Pan, Felipe Moura Brasil, o jornalista Reinaldo Azevedo e o escritor Diogo Mainardi. “Bolsonarismo é o seguinte: ou é adesão completa, incondicional, inquestionável, ou é traidor. Não tem um senão. Você nunca vai ver um bolsonarista discordando do presidente. Ele vai discordar de um ministro, disso e daquilo. Mas do Jair Bolsonaro? Nunca. E se o Jair Bolsonaro anunciar uma coisa, o bolsonarista elogiar, mas meia hora depois o Bolsonaro falar que não é mais aquilo, que tava errado e era uma merda, ele vai falar que é uma merda mesmo, está certo o presidente. É essa a lógica”, afirma.
Outro colega de profissão de Andreazza que sofreu ataques é Caio, cuja história abre esta reportagem. Integrante de vários grupos de discussão ligados à direita desde o início da década, ele afirma que enxergou um surgimento progressivo de radicais dentro desses espaços, mas que os interpretava como algo natural.
“Eu sempre entendi que a política tem os grupos radicais. Então pensei ‘poxa, todo político tem que lidar com seus radicais, precisa conter seus radicais’ e imaginei que eles iam ser o nosso calo, que de vez em quando iam falar uma bobagem, de vez em quando iam gerar uma crise desnecessária. Mas nunca imaginei que eles iam crescer tanto”, explica.
Conforme o tempo foi passando, os grupos foram sendo tomados por pessoas cada vez mais radicais, enquanto os mais moderados foram simplesmente desistindo de debater.
“A ‘nova direita’ é politicamente muito verde, enquanto a esquerda está aí desde os anos 30, 40. Eu acho que ela não soube conter o domínio desses caras, então no primeiro obstáculo saía do grupo, silenciava sobre o tema, deixava os caras vencerem a batalha”, diz ele.
A moderação perdeu ainda mais espaço quando o Facebook começou a reduzir o alcance orgânico de páginas. “Esses caras tinham pouco alcance. Quem tinha alcance era o Implicante, que era muito mais moderado, o Antagonista. Esses outros caras eram meio coadjuvantes, não apitavam muita coisa. Esse jogo começou a virar quando o Facebook começou a restringir o alcance de páginas, isso já depois do Donald Trump ser eleito presidente, quando o Facebook foi muito criticado. Todo mundo que era mais moderado tinha como fonte de visitas o Facebook, e aí perdeu. E só sobraram os radicais, porque aí só começava a reverberar mesmo o que era muito virulento, quem pegava muito pesado no tom. Então foi quando os caras começaram a ganhar corpo. Terça Livre, Renova Mídia etc. E alguns inclusive começaram a pegar mais pesado no tom para não perder o bonde da história. O MBL no início era muito mais moderado”, diz Caio.
A gota d’água, para ele, foi a greve dos caminhoneiros em maio de 2018. Durante o movimento, ele começou a observar a aproximação de grupos alinhados ao bolsonarismo com o movimento grevista e identificou uma tentativa de utilizar a greve como ruptura política.
“Ali eu percebi que eles estavam querendo mesmo a revolução, e não no termo bonito que a gente canta nas músicas. Eu questionei a razão daquilo, já que eles estavam liderando as pesquisas. O grande argumento era de que eles não confiavam nas urnas eletrônicas, então tinham que fazer a revolução, que chegara o momento da ruptura, de mudar o país, acabar com o establishment”, relata.
Seguido por muitos eleitores bolsonaristas por suas recorrentes críticas ao PT, Caio por muito tempo “pisou em ovos” ao falar de Jair Bolsonaro. “Eu nunca dizia ‘ah, Bolsonaro levou uma e quebrou a cara’. Sempre dizia ‘Bolsonaro podia ter feito isso aqui melhor’. Até que em dado momento eu comecei a entender melhor toda essa dinâmica dos linchamentos virtuais, e a pauta do cara, o uso das greves dos caminhoneiros de uma forma totalmente ditatorial. Aquele papo de que ele era a favor da democracia não estava mais me convencendo. Ele não é a favor da democracia, ele está a favor.”
Desde então, passou a conviver com xingamentos frequentes e viu portas se fecharem em sua carreira. “É uma coisa meio viciante, o aplauso fica muito fácil. Você fala mal do PT, pessoal te aplaude. Você encontra um acerto no Bolsonaro, você é jogado pro céu. Esses influenciadores ficam em êxtase. Quando você começa a criticar, você perde tudo, sua vida vira um inferno”, conta.
O colunista da Gazeta do Povo Rodrigo Constantino enxerga semelhanças entre o comportamento dos linchadores ligados ao bolsonarismo e ao escritor Olavo de Carvalho como parte de um comportamento de seita. “Não precisa de coordenação, não precisa de uma coisa maquiavélica. Seria bem ao gosto do olavismo uma tese dessas. Mas não precisa, porque é orgânico. O guru deu a senha e os chacais vêm atacar em conjunto, em uníssono.”
Caio e Gabriela também definem o grupo responsável pelos linchamentos virtuais da extrema direita como uma ‘seita’. “Tem um guru, ele tem umas ideias malucas, ele captura pelas ideias, e quem discorda das ideias, ele bota todo mundo pra perseguir. Os alunos começam a odiar aquele cara, o aluno que traiu o professor”, diz uma das vítimas, fazendo referência a Olavo de Carvalho.
Um dos entrevistados acrescenta: “Eles têm um vocabulário que é deles, um índex de palavras que não podem ser usadas, um tipo de comportamento que têm que ter. E tem umas pessoas que fazem isso porque se sentem parte de um grupo. É uma minoria que lucra e uma maioria que adere.”
“Eu brinco que o Olavo é o Osho tupiniquim”, diz Constantino. “É como se fosse uma religião, uma religião política. Você tem o guru, e o guru está sempre certo. Ou seja, o Olavo não pode estar errado nunca. Se o governo der certo, foi porque escutou ele e, se não der certo, é porque não escutou ele.”
Um dos entrevistados relatou que quem fazia o “serviço sujo” de linchar era chamado: “hienas”. “Eu participava de alguns grupos em que sempre que aparecia alguma opinião polêmica, alguma coisa que viralizava, mandavam lá. Em um dos grupos, uma garota falou “isso aí eu já até mandei pras hienas”.
Achei um termo curioso e na mesma hora eu entrei nas redes sociais e fiquei aguardando. Deu três, quatro minutos e um monte desses perfis de trolls começaram a atacar aquela mensagem. Xingando a pessoa, compartilhando, fazendo meme. Aí eu entendi que as hienas eram esses caras. Ela tinha jogado pra esses caras, que faziam esse serviço sujo”, conta.
Além da divulgação de perfis em grupos de WhatsApp com ordens para “oprimir”, as vítimas têm informações pessoais e fotos expostas em redes sociais, principalmente no Twitter e Facebook, prática conhecida como doxxing. Entre os entrevistados pela Pública, a maioria já sofreu com a divulgação de fotos pessoais, endereço e até menções a familiares.
Artifício recorrente do escritor Olavo de Carvalho, a criação de apelidos é outra estratégia frequente de ataques das milícias virtuais. Para Gabriela, a intenção é desumanizar quem está sendo atacado. “Não é mais um trabalhador, uma mãe de família, é uma chacota. Não é um humano que eles tão vendo”.
Além de “Cocôstantino”, outras figuras alinhadas à direita, mas críticas do bolsonarismo, também são apelidadas. É o caso da jornalista Vera Magalhães, do Estado de S. Paulo, chamada de “Mocreia Magalhães”; de Reinaldo Azevedo, da Rádio BandNews FM, apelidado de “Arruinaldo”; e Marco Antonio Villa, da Jovem Pan, chamado de “Marco Vil”. O deputado federal e líder do MBL Kim Kataguiri também entrou no alvo de bolsonaristas e de Olavo de Carvalho, sendo apelidado de “Kim Katapiroka” pelo escritor.
Xingar e depois denunciar a vítima no Twitter com a intenção de fazer com que a plataforma suspenda a conta é outra tática utilizada pelas hordas bolsonaristas. “Do nada, algum perfil começa a te xingar loucamente. Xinga, xinga, xinga, você fica com raiva e xinga de volta. Aí eles apagam os xingamentos deles e denunciam o seu como assédio direcionado, como se você estivesse perseguindo o cara e xingando loucamente. No que eles reportam, você perde o perfil, ou é suspenso”, explica uma das pessoas com quem a Pública conversou.
Considerada parte do establishment, a imprensa e os seus jornalistas são focos frequentes de ataques. Segundo os entrevistados, os linchamentos são mais intensos quando há alguma investigação importante sobre o governo em curso ou que tenha sido publicada recentemente.
“Depois que começou o governo, eu comecei a ver que quando eu faço alguma reportagem investigativa vem sempre algum ataquezinho no Twitter. Pode ser coincidência? Pode, mas é difícil”, diz Gabriela.
Segundo Thiago Firbida, da Artigo 19, os comunicadores são alvos preferenciais porque têm como função “esclarecer problemas ligados à gestão política”.
“Quando os jornalistas fazem uma cobertura que de alguma maneira incomoda os interesses de quem está no poder, é mais interessante que esses ataques aconteçam, numa maneira de intimidar esses jornalistas para que eles parem de fazer seu trabalho, se sintam amedrontados”, afirma.
Ainda que muito crítico de um “viés progressista” da imprensa, Rodrigo Constantino concorda que bolsonaristas e olavistas têm interesse especial em atacar jornais e jornalistas.
“É muito interessante para a narrativa deles se vender como os únicos bastiões da verdade. Então toda a imprensa tem que ser manipuladora e controlada por interesses escusos. Só que aí eu pergunto: quem produziu fatos, descobriu fatos e relatou fatos que levaram, em última instância, ao impeachment de Dilma e à derrocada do petismo? Não foi Terça Livre. Foi Globo, foi Estadão, foi Folha de S.Paulo.”
*Este conteúdo foi publicado originalmente no site da Agência Pública.