Dilma Rousseff recebe a faixa presidencial em janeiro de 2014: se pairavam dúvidas sobre impeachment, peça que faltava pode ter aparecido (Ueslei Marcelino/Reuters)
Raphael Martins
Publicado em 16 de março de 2016 às 22h49.
Última atualização em 1 de agosto de 2017 às 15h08.
São Paulo – Impeachment é um processo jurídico e político. Para especialistas consultados por EXAME.com, ação contra Dilma se reforçou nessas duas frentes.
Se pairavam dúvidas jurídicas em torno dos argumentos do pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff que tramita na Câmara, a revelação do conteúdo de conversa telefônica entre a petista e o agora ministro da Casa Civil, Luiz Inácio Lula da Silva, pode fornecer a peça que faltava para embasar a ação contra a petista.
É o que afirma o professor Flávio de Leão Bastos Pereira, da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Até poucas semanas atrás, eu não via nenhuma base para o impeachment. Agora, já existe”, diz.
Para que o pedido de abertura de impeachment tenha consistência, devem existir evidências de que o mandatário cometeu algum crime comum (como homicídio ou roubo) ou crime de responsabilidade – que envolve desde improbidade administrativa até atos que coloquem em risco a segurança do país.
Segundo o professor, a obstrução da Justiça é um deles. “São considerados crimes de responsabilidade atos do presidente da República que atentem contra a Constituição Federal. Especialmente, contra o livre exercício do poder Judiciário e de qualquer outro dos três poderes”, afirma.
“Se a voz dela está gravada e se fica claro que ela atuou no sentido de impedir a continuidade da jurisdição do Moro, há possibilidade de caracterizar uma improbidade administrativa e isso vai fortalecer com certeza o pedido de impeachment”, diz.
Para o cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a liberação dos grampos telefônicos envolvendo Lula e Dilma são um "catalisador para o estado terminal do governo".
O entendimento dos investigadores da Operação Lava Jato é que, se o juiz Sergio Moro autorizasse um mandado contra Lula, o petista mostraria o termo de posse de ministro, o que lhe garantiria foro privilegiado e transferiria seu julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"Lula é um craque na articulação politica, mas, no domingo assistimos à maior manifestação política da história", afima Prando. "Em qualquer governo do PT, ele teria espaço. O problema é o tempo."
Para o cientista político, o momento efervecente que vivia o ex-presidente trouxe para dentro do governo um furacão de acusações e suspeitas na Justiça. Para ele, este é mais um equívoco de uma série.
"Foi um incentivador à desagregação do governo Dilma", diz. "Transferir o poder neste momento para Lula está distante dos anseios das pessoas nas ruas. Qualquer nova acusação que vem à tona, gera uma imensa insatisfação."
NA ARTICULAÇÃO
Junto com o apoio popular, o governo perde também influência no Legislativo e Judiciário. Nos áudios, Lula afirma com todas as letras que presidentes da Câmara e Senado estão comprometidos e o STF está "acovardado".
Na base aliada, o presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB), Marcos Pereira, anunciou que a bancada do partido decidiu por unanimidade sair da base do governo da presidente Dilma Rousseff, também colocando o ministério do Esporte à disposição.
NAS RUAS
Um protesto contra a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro-chefe da Casa Civil, que começou na tarde desta quarta-feira, na porta do Palácio do Planalto, em Brasília, se espalhou por diversas regiões do país.
Manifestantes também se apresentam na Avenida Paulista, em São Paulo. Ainda não há números. Outras capitais, como Porto Alegre, Fortaleza, Recife, Manaus e Belo Horizonte também são palcos de protestos.
Depois que o juiz federal Sérgio Moro derrubou o sigilo de grampos telefônicos com conversas entre Lula e Dilma, as manifestações ganharam dimensão.
De volta a Brasília, a Polícia Militar e guardas presidenciais fizeram um cordão de isolamento para evitar que manifestantes invadissem o Palácio do Planalto.
No plenário da Câmara dos Deputados, congressistas fizeram uma batalha de gritos de ordem. Enquanto oposicionistas pedem "renúncia", aliados bradam "golpistas".