Fernando de Noronha: O governo de Pernambuco criticou o plano do governo federal e disse que o modelo "não respeita a natureza" (Andras Jancsik/Getty Images)
Estadão Conteúdo
Publicado em 3 de março de 2020 às 21h24.
O governo decidiu liberar a entrada de cruzeiros marítimos em Fernando de Noronha, um dos ecossistemas mais sensíveis de biodiversidade do País e hoje administrado com forte rigor ambiental. Além de abrir o arquipélago para receber os navios de grande porte, o governo também pretende instalar novos "recifes artificiais" na área, com naufrágio de embarcações em determinados locais para atrações de mergulho.
A informação foi confirmada pelo senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), que esteve na ilha com o presidente da Embratur, Gilson Machado. Em vídeo, Flavio diz que o governo está agindo para "desatar os nós" da legislação e permitir e ampliar a exploração turística de Fernando de Noronha. "Estamos desatando os nós dessa legislação para permitir que esses segmentos sejam muito melhor explorados por nosso País", declara.
Gilson Machado afirma que já obteve aprovação da Marinha para instalação de 12 novos pontos de recifes artificiais. "Noronha é um dos melhores lugares do mundo para o mergulho de contemplação. Acabamos de aprovar, junto à Marinha, mais 12 pontos novos de naufrágio, para agregar ao turismo de Noronha, como também estamos destravando a volta dos cruzeiros marítimos em Noronha", afirmou o presidente da Embratur. "Estamos fazendo a vistoria dos pontos dos recifes artificiais em Fernando de Noronha."
Há sete anos Noronha não recebe cruzeiros marítimos com regularidade. O motivo passa por restrições impostas às operadoras para fretamento dos navios e licenças ambientais. A administração do arquipélago é feita pela Agência Estadual de Meio Ambiente e pelo Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio), que no ano passado chegou a ter seu gestor afastado do cargo pelo governo.
Os barcos que tinham autorização para atracar em Noronha tinham capacidade de 150 a 200 passageiros, mas agora o plano, conforme apurou o Estado, é liberar para embarcações com 600 passageiros ou mais, o que pode colocar em xeque a capacidade de suporte do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha.
Em julho do ano passado, logo depois de a taxa de preservação cobrada na ilha ser criticada pelo presidente Jair Bolsonaro, o Ministério do Meio Ambiente declarou que iria rever regras para o local, como a proibição para a pesca de sardinhas e a realização de voos noturnos em Fernando de Noronha.
Hoje, o valor dos ingressos do Parque Nacional Marinho Fernando de Noronha é de R$ 111,00 para brasileiros e R$ 222,00 para estrangeiros. Este ingresso, válido por dez dias, dá ao visitante o direito de acessar todas as áreas deste Parque Nacional destinadas ao uso público, porém serviços terceirizados especializados devem ser contratados a parte.
A arrecadação deste ingresso tem cerca de 70% do seu valor revertido a ações de melhorias diretas ao Parque Nacional, por meio de projetos de reforma e manutenção de trilhas, sinalização interpretativa, implementação e manutenção do centro de visitantes, entre outros.
Ao entrar na ilha, o visitante é solicitado a pagar uma taxa de permanência chamada Taxa de Preservação Ambiental - TPA. Esta taxa é cobrada e arrecadada pelo governo estadual de Pernambuco, que administra o Distrito de Fernando de Noronha. A taxa varia de acordo com os dias de permanência. Um dia custa R$ 75,93.
O governo de Pernambuco, Estado ao qual o arquipélago de Fernando de Noronha é vinculado, criticou o plano do governo federal. Para o secretário de Meio Ambiente pernambucano, José Bertotti, o modelo proposto não "respeita a natureza".
Em nota, Bertotti declarou, que "a informação de que o governo federal vai 'autorizar' a entrada de cruzeiros marítimos em Fernando de Noronha deixa mais uma vez evidente a maneira como a União lida" com o meio ambiente. "As referidas autoridades desconhecem a existência da limitação do número de visitantes em Fernando de Noronha e as consequências de colocar na ilha mais de 600 pessoas de uma só vez, como acontece no caso dos navios de cruzeiro", declara Bertotti.
"As 21 ilhas do arquipélago abrigam uma biodiversidade única e não podem ser alvo do modelo de turismo predatório sugerido no vídeo publicado pelo senador Flávio Bolsonaro e o presidente da Embratur, Gilson Machado". Bertotti afirmou que "fica claro como os representantes do governo federal se ocupam muito mais em querer impor um tipo de visitação que não respeita a natureza do que focalizar sua energia em iniciativas que respeitam o meio ambiente ou que ofereçam melhores condições de vida aos moradores do arquipélago".
O governo de Pernambuco é responsável pela administração do território estadual de Fernando de Noronha e, segundo o secretário, tem investido em programas sustentáveis como o Plástico Zero, que impede a entrada de embalagens plásticas descartáveis na ilha; e o Carbono Zero que, por lei, determina a substituição gradativa dos veículos a combustão por elétricos no local.
No passado, declarou Bertotti, o governo de Pernambuco investiu R$ 10,5 milhões na construção de casas populares, uma nova creche, a sede do Centro de Referência de Assistência Social e novos equipamentos para o Hospital São Lucas, além da requalificação do porto. "Novas ações estão em processo de contratação como o novo estudo de capacidade de suporte, plano diretor e a lei de uso e ocupação do solo. Seguiremos firmes no propósito de manter Fernando de Noronha como uma referência de preservação ambiental e de boas práticas de sustentabilidade e de turismo", afirmou.