Brasil

Governo publica novo decreto e diz que civil não pode comprar fuzil

Texto original, assinado no começo do mês pelo presidente Bolsonaro, foi alvo de diversos questionamentos sobre sua constitucionalidade

Armas: governo publicou um novo decreto sobre a posse e porte de armas (Anadolu Agency / Contributor/Getty Images)

Armas: governo publicou um novo decreto sobre a posse e porte de armas (Anadolu Agency / Contributor/Getty Images)

Mariana Martucci

Mariana Martucci

Publicado em 22 de maio de 2019 às 09h14.

Última atualização em 22 de maio de 2019 às 13h46.

São Paulo — O governo federal publicou nesta quarta-feira (22) um novo decreto sobre o porte de armas de fogo no Brasil, com o objetivo de "sanar erros formais" do último decreto, editado no começo do mês pelo presidente Jair Bolsonaro.

Em nota enviada à imprensa, o Palácio do Planalto afirma que foram modificados pontos questionados na Justiça "pelo Congresso e pela sociedade em geral".

Apesar das alterações, que segundo o comunicado chegam a 20, o governo diz que a medida não perdeu "sua essência".

Nesta semana, a fabricante de armas brasileira Taurus disse que o decreto abria a possibilidade de a população ter acesso a um fuzil, o modelo T4 da marca.

A empresa informou que havia uma fila de dois mil clientes para adquirir o produto.

Com as alterações desta quarta-feira, o governo estabeleceu que terá "vedação expressa" a concessão de armas de fogo portáteis, como fuzis e carabinas, ao cidadão comum. Esse tipo de armamento será permitido apenas para donos de imóvel rural.

Questionamentos

Na terça-feira (21), o governo já havia feito um comunicado sobre possíveis revisões no decreto. A proposta, editada por Jair Bolsonaro no último dia 7, facilita porte de arma para 20 categorias, entre elas políticos, caminhoneiros e moradores de área rural – estimativas de ONGs apontam para até 19,1 milhões de beneficiados.

O decreto também garante que colecionadores, atiradores desportivos e caçadores levassem a arma carregada no trajeto entre o local de prática até a respectiva residência.

A medida foi alvo de diversos questionamentos por entidades que representam a sociedade, o que fez com que a Câmara e o Senado analisassem a constitucionalidade das decisões. Na ocasião, consultores das duas casas indicaram em parecer que o decreto havia “extrapolado os limites legais” ao desrespeitar o Estatuto do Desarmamento.

A ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa Weber também pediu esclarecimentos ao governo. Já a Anistia Internacional e o Ministério Público Federal solicitaram a total revogação do texto, alegando riscos à garantia de direito à vida da população brasileira.

Nesta terça-feira (21), governadores de 13 estados e do Distrito Federal divulgaram uma carta contra o decreto de armas, alegando que a medida aumentaria a violência no país.

Veja o que foi mudou no novo decreto

Porte de armas

PERMITIDO: armas de porte, como pistolas, revólveres e garruchas
PROIBIDO: armas portáteis, como fuzis, carabinas, espingardas, e armas não portáteis

Armas em voos

A Anac será a responsável por definir as regras de transporte de armas em voos, que no decreto anterior ficava a cargo do Ministério da Justiça

Munições incendiárias

O novo decreto esclarece a proibição de munições incendiárias, químicas e outras vedadas em acordos e tratados internacionais

Prática de tiro por menores

Menores só poderão praticar tiro esportivo a partir dos 14 anos e com a autorização dos dois responsáveis. O decreto anterior não estipulava idade mínima e exigia autorização de apenas um dos responsáveis.

Veja abaixo a íntegra do comunicado divulgado pelo Planalto

"Serão publicadas no Diário Oficial da União algumas retificações no Decreto nº 9.785, de 7 de maio de 2015, com o objetivo de sanar erros meramente formais identificados na publicação original, como numeração duplicada de dispositivos, erros de pontuação, entre outros.

Ao mesmo tempo, será publicado novo decreto, este alterador.

Ele modifica materialmente alguns pontos do Decreto nº 9.785, de 7 de maio de 2019, que por determinação do Presidente da República foram identificados em trabalho conjunto da Casa Civil, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministério da Defesa e Advocacia-Geral da União a partir dos questionamentos feitos perante o Poder Judiciário, no âmbito do Poder Legislativo e pela sociedade em geral.

Esse trabalho de identificação resultou na proposta de alteração dos pontos abaixo no decreto original, entretanto, sem alterar sua essência.

Mudanças relacionadas ao porte de arma para o cidadão comum

Conceito de arma de fogo de uso permitido e de arma de fogo de uso proibido: inclusão do calibre nominal nos conceitos, de modo a possibilitar o estabelecimento de critérios mais claros de aferição da energia cinética gerada e, consequentemente, a definição acerca da natureza da arma (se de uso restrito ou de uso permitido);

Atividades profissionais de risco: A lei 10.826/2003 em seu art. 10 §1º estabelece que a efetiva necessidade do porte se dá pela demonstração do exercício de atividade profissional de risco. Atendendo aos limites do comando legal, o decreto estabelece o rol exemplificativo de atividades profissionais que estão inseridas em uma conjuntura que ameace sua existência ou sua integridade física em virtude de vir, potencialmente, a ser vítima de um delito envolvendo violência ou grave ameaça. O Decreto uniformiza a interpretação da Administração pública e confere maior segurança jurídica aos pretendentes ao porte de arma para defesa pessoal;

Vedação expressa à concessão de porte de armas de fogo portáteis e não portáteis para defesa pessoal (Art. 20, §6º do Decreto Alterador), ou seja, não será conferido o porte de arma de fuzis, carabinas, espingardas ou armas ao cidadão comum;

Para o correto entendimento da presente explicação é importante diferenciar a arma de fogo de porte, a arma de fogo portátil e a arma de fogo não portátil. A arma de fogo de porte (autorizada) é aquela que de dimensões e peso reduzidos, que pode ser disparada pelo atirador com apenas uma de suas mãos, a exemplo de pistolas, revólveres e garruchas. A arma de fogo portátil (não autorizada) é aquela que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, pode ser transportada por uma pessoa, tais como fuzil, carabina e espingarda; Já a arma de fogo não portátil (não autorizada) é aquela que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, precisa ser transportada por mais de uma pessoa, com a utilização de veículos, automotores ou não, ou sejam, fixadas em estruturas permanentes;

A autorização para aquisição de arma de fogo portátil (posse de arma) será concedida apenas para domiciliados em imóvel rural, considerado aquele que tem a posse justa do imóvel rural e se dedica à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, nos termos da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993;

Atribuição ao Comando do Exército para no prazo de 60 dias estabelecer os parâmetros de aferição da energia cinética a que se referem os conceitos de arma de fogo de uso permitido, arma de fogo de uso restrito e munição de uso restrito, bem como da lista dos calibres nominais que, dentro desses parâmetros, se enquadra em cada categoria;

Esclarecimento de que o porte de arma de fogo tem validade de 10 anos. O decreto original dispunha que ele seria renovado a cada 10 anos, porém, sem estabelecer que a validade seria de 10 anos;

Conceito de munição de uso restrito: vinculação do conceito à energia cinética gerada, além de outras características constantes do decreto original;

Conceito de munição de uso proibido: não estava expresso, procurou-se aclarar. São proibidas as munições incendiárias, as químicas e outras vedadas em acordos e tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário;

Exceções à limitação para aquisição de munição: ficam dispensados dos limites previstos no decreto apenas os integrantes das forças de segurança para as munições adquiridas para as armas de uso institucional, as munições adquiridas em stands, clubes e associações de tiros para utilização exclusiva no local, bem como as munições adquiridas às instituições de treinamento e instrutores credenciados para certificar a aptidão técnica para o manejo de arma de fogo. Caçadores e atiradores, portanto, passam a se submeter ao limite, com exceção das munições adquiridas nos stands e clubes de tiro.

Mudanças relacionadas às forças de segurança

As guardas municipais poderão atestar a aptidão psicológica e técnica de seus integrantes para portar armas de fogo;

Esclarecimento de que os integrantes das forças de segurança estão autorizados a adquirir armas de fogo de uso restrito;

A autorização dada pelo Comando do Exército às forças de segurança para aquisição de armas de fogo de uso restrito será realizada mediante comunicação prévia para controle de dotação;

A aquisição de armas de fogo não portáteis por forças de segurança estará sujeita à autorização do Comando do Exército;

Restabelecimento da possibilidade de o Comando do Exército autorizar a importação de Produtos de Defesa pelas forças de segurança;

Mudanças relacionadas aos colecionadores, caçadores e atiradores

Esclarecimento de que o porte de arma de fogo para os atiradores será expedido pela Polícia Federal aos que demonstrarem o cumprimento dos requisitos previstos na lei, quais sejam, aptidão técnica, aptidão psicológica, idoneidade moral, ocupação lícita e residência certa;

Parametrização quantitativa das armas de porte e portáteis que podem ser adquiridas pelos CACs registrados junto ao Comando do Exército mediante comunicação prévia: serão 5 armas de uso permitido e 5 armas de uso restrito de cada modelo por colecionador, 15 armas de uso permitido e 15 armas de uso restrito por caçador e 30 armas de uso permitido e 30 armas de uso restrito por atirador. Acima desses quantitativos, mesmos os CACs registrados precisam de autorização prévia do Comando do Exército;

Atiradores e caçadores não poderão adquirir armas de fogo não portáteis. Colecionadores poderão adquirir nos termos da regulamentação a ser expedida pelo Comando do Exército.

Esclarecimento quanto à prática de tiro esportivo de menores de idade: fixação de idade mínima de 14 anos, exigência de autorização de ambos os responsáveis, bem como limitada às modalidades reconhecidas pelas entidades de administração do tiro;

Mudanças relacionadas ao procedimento administrativo para a concessão do porte

Esclarecimento quanto ao termo inicial de contagem do prazo para apreciação de requerimentos pela Polícia Federal, Comando do Exército, SIGMA e SINARM, qual seja, 60 dias a partir do recebimento do requerimento devidamente instruído;

Regulamentação da transferência entre sistemas SIGMA e SINARM dos cadastros de armas de fogo;

Prazo para o adquirente informar ao SINARM ou ao SIGMA, conforme o caso, a aquisição de arma de fogo: o decreto original previa que essa comunicação deveria ser feita em até 48 horas após a aquisição. O prazo foi estendido para 7 dias úteis;

Esclarecimento que a autorização para venda de armas de fogo no comércio não se aplica às armas de fogo não portáteis.

Outros dispositivos 

Revoga-se o artigo 41 do Decreto 9.785/2019 confirmando-se a atribuição da ANAC para, dentre outras atribuições legais,  estabelecer as normas de segurança a serem observadas pelos prestadores de serviços de transporte aéreo de passageiros, para controlar o embarque de passageiros armados e fiscalizar o seu cumprimento"

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