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Governo monitora redes sociais e condiciona verba a apoio de parlamentares

Para liberar dinheiro, o governo federal inclui uma espécie de compromisso de adesão a um "pacote" de interesses, como a aprovação de Eduardo para embaixada

Bolsonaro: o maior foco de tensão está no Senado, que ainda vai apreciar as mudanças nas regras da aposentadoria (Isac Nóbrega/PR/Flickr)

Bolsonaro: o maior foco de tensão está no Senado, que ainda vai apreciar as mudanças nas regras da aposentadoria (Isac Nóbrega/PR/Flickr)

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Clara Cerioni

Publicado em 14 de setembro de 2019 às 13h00.

Última atualização em 14 de setembro de 2019 às 13h01.

O governo vai condicionar a liberação de verbas para emendas parlamentares e a distribuição de cargos nos Estados ao apoio no Congresso. Para medir a taxa de fidelidade ao presidente Jair Bolsonaro, o Palácio do Planalto começou a monitorar as redes sociais de deputados e senadores, bem como os discursos feitos na tribuna, além de acompanhar a votação de cada um no plenário.

A ideia é usar até R$ 2 bilhões dos cerca de R$ 15 bilhões do Orçamento que devem ser desbloqueados nas duas próximas semanas para pagar emendas prometidas quando a reforma da Previdência começou a ser discutida, mas as negociações incluem agora uma espécie de compromisso de adesão a um "pacote" de interesse do governo.

O maior foco de tensão está no Senado, que ainda vai apreciar as mudanças nas regras da aposentadoria. É por lá também que passará a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, para o cargo de embaixador nos Estados Unidos.

Dois senadores aliados de Bolsonaro afirmaram que Eduardo ainda não tem votos suficientes para ter o nome aprovado e consideraram "prudente" esperar o pagamento de emendas, que deve ocorrer em outubro, quando a equipe econômica destravar parte dos recursos do Orçamento.

Primogênito do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) tem atuado como uma espécie de ministro dos bastidores no Congresso. Na tentativa de quebrar as resistências, ele tem levado o irmão em jantares, como ocorreu recentemente na casa do senador Lucas Barreto (PSD-AP), para que o caçula fale sobre seus planos nos EUA.

Além do interesse em aprovar Eduardo para a embaixada americana, Augusto Aras para o comando da Procuradoria-Geral da República e a reforma da Previdência, o Planalto também tenta impedir a abertura da CPI da Lava Toga no Senado, que tem o objetivo de investigar o chamado "ativismo judicial".

Na Câmara, deputados já foram avisados que o governo está de olho em tudo o que os parlamentares publicam nas redes sociais e não fará "concessões" a quem agir como oposição. O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho "02" do presidente, também é conhecido por "inspecionar" as redes e influenciar a comunicação do Planalto.

Responsável pela articulação política com o Congresso, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, fez um périplo pela Câmara, nesta semana, e teve vários encontros a portas fechadas.

Na terça-feira ele almoçou com deputados do PSL e, no dia seguinte, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a bancada do PSDB. Teve, ainda, encontros reservados com parlamentares do Paraná e com líderes de outros partidos, como DEM, PL e Podemos.

Alinhamento

Ramos afirmou que o governo está empenhado em construir uma base de sustentação no Congresso, mas pediu que os parlamentares não o cobrassem em público sobre emendas, porque, na sua avaliação, tudo o que é dito serve para "pautar" os jornalistas.

Na prática quem seguir a cartilha ditada pelo Planalto avançará algumas casas para ter suas demandas atendidas, mas o discurso oficial ainda é o de que essas negociações não significam um "toma lá, dá cá".

"Creio que o parlamentar tem de ser coerente. Ou está alinhado com o governo ou é contra", disse Ramos, quando questionado se quem criticar Bolsonaro nas redes sociais poderá receber emendas extras e ocupar cargos em diretorias de estatais, por exemplo.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou, por sua vez, que o governo quer desbloquear mais R$ 5 bilhões até outubro, além dos R$ 15 bilhões previstos pela equipe econômica, para ter mais "tranquilidade", inclusive na relação com o Congresso. "Vamos atender as prioridades."

O loteamento de cargos tem provocado atrito no Congresso. Ainda ontem, o deputado Marco Feliciano (Podemos-SP) atacou Ramos por entregar a presidência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) a um apadrinhado do líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA), que em maio atacou o governo na tribuna (mais informações nesta página). O DEM, no entanto, controla três ministérios (Casa Civil, Saúde e Agricultura) e todos os seus parlamentares aprovaram a reforma da Previdência.

"Inicia-se agora uma nova fase de articulação do governo, que não quer mais namorico. Quer casamento de papel passado", comparou o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (MG), usando a metáfora preferida de Bolsonaro.

Quatro meses depois de anunciar que criaria um "banco de talentos" para preencher cargos de confiança nos Estados, as nomeações estão saindo a conta-gotas. O líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP), ironiza a expressão "banco de talentos". "Tucanaram as indicações políticas." 

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