Agência de notícias
Publicado em 26 de outubro de 2024 às 10h48.
O governo federal analisa a possibilidade de realizar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) durante a reunião de cúpula do G20, nos dias 18 e 19 de novembro no Rio. Diferentemente de outras ações do gênero já adotadas na cidade, desta vez a ação com militares das Forças Armadas seria limitada ao entorno do Museu de Arte Moderna (MAM), no Parque do Flamengo, local das reuniões dos líderes de 19 países-membros, da União Africana e da União Europeia. O cinturão de segurança incluiria a casa de shows Vivo Rio, onde ficará a imprensa, e a Marina da Glória, ponto de apoio para as delegações.
A discussão sobre a adoção de GLO já vinha ocorrendo no Palácio do Planalto antes da escalada da violência nos últimos dias no Rio. No início da semana, bandidos fortemente armados invadiram a Favela da Muzema, no Itanhangá, e sequestraram nove ônibus para fazer barricadas. Na quinta-feira, após três inocentes serem mortos durante um tiroteio na Avenida Brasil, na altura das favelas do Complexo de Israel, o governador Cláudio Castro disse que o ataque dos traficantes foi um ato de terrorismo.
Entre os chefes de estado que devem desembarcar no Rio para a cúpula estão os presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e da China, Xi Jinping. Semana passada, o presidente russo, Vladimir Putin, disse que não virá ao encontro.
"A segurança do G20 vem sendo alvo de reuniões com todas as esferas de governo há meses. Tratamos não apenas de segurança, mas de rotas que serão usadas nos deslocamentos das delegações e de operações de trânsito. Entre os cenários analisados está a hipótese de uma GLO específica", confirmou o coronel Maurílio Nunes, subsecretário de Segurança Pública do Rio e representante do governo do estado nos preparativos para o encontro.
A ideia é bem aceita na Casa Civil, em Brasília, que avaliará o caso antes de levá-lo para a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A discussão envolve a pasta comandada por Rui Costa e o Ministério da Defesa. Um dos argumentos favoráveis é que, sem GLO, não é possível usar militares do Exército para dar apoio ostensivo à segurança. Se a operação for adotada, será nos moldes da GLO de Portos e Aeroportos do Rio e de São Paulo, que ocorre em áreas delimitadas, e não em toda cidade.
No início do ano, o governo federal avaliava que só decretaria GLO em último caso, mas a postura mudou. Segundo fontes, na época, a ideia era evitar um papel mais ativo dos militares, após o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. A GLO é um ato que só pode ser adotado por ordem expressa do presidente, que permite aos militares atuarem com poder de polícia durante um período estabelecido.
"A maior preocupação das delegações não é com a violência urbana. Até agora, mesmo depois do que aconteceu no Complexo de Israel. O que os representantes das delegações querem saber é o que estamos planejando para que não ocorram ações de terroristas", contou uma fonte do Itamaraty.
O GLOBO apurou algumas medidas que serão adotadas. Da base aérea do Galeão, onde as autoridades vão desembarcar, as delegações usarão a Linha Vermelha para fazer o deslocamento até o MAM e os hotéis da Zona Sul. Para algumas delegações, como a americana, a operação deve contar com apoio aéreo, além dos batedores que vão acompanhar todos os comboios.
No caminho, as comitivas passarão pelo Complexo da Maré, do qual terão apenas uma visão parcial. Há duas semanas, a prefeitura concluiu a instalação de novos painéis acústicos ao longo da via expressa. Além da questão urbanística, a medida tenta com isso afastar o risco de pedestres entrarem na Linha Vermelha durante a passagem das delegações. As estruturas antigas, com mais dez anos, estavam danificadas, com buracos que permitiam o acesso à pista.
Já foi descartada a restrição às operações de pouso e decolagem no Aeroporto Santos Dumont, que fica nas proximidades da conferência. O espaço aéreo no entorno do MAM terá patrulhamento feito pela Aeronáutica. O esquema também mobilizará a Marinha, para evitar a aproximação de barcos não autorizados pela Baía da Guanabara.
A adoção de GLO é uma prática recorrente em grandes eventos na cidade. A maior delas, a primeira, envolveu 20 mil militares, que atuaram durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92. A medida se repetiu na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), na Copa do Mundo (2014) e na Olimpíada (2016). Nesses dois últimos eventos, as ações se estenderam aos estados onde foram realizadas as partidas preliminares do futebol. A última ação de GLO que incluiu todo o estado ocorreu em 2018, quando o governo federal decretou intervenção na segurança fluminense.
Em meio aos casos de violência no estado, o secretário nacional de Segurança Pública, Mario Luiz Sarrubbo, virá ao Rio na próxima terça-feira para discutir a ampliação da ajuda da União no combate ao crime organizado. Após o episódio no Complexo de Israel, Castro cobrou participação mais intensa do governo federal na segurança do Rio.
Ao GLOBO, Sarrubbo disse que recebeu a ordem do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, de “ouvir e atender” aos pedidos, mas ressaltou que o papel do governo federal é “limitado”:
"O papel do governo federal é limitado, e dentro das nossas limitações estamos fazendo o máximo possível".
Em entrevista à TV Globo, a porta-voz da PM, a tenente-coronel Claudia Moraes, afirmou que o planejamento das operações vai mudar, considerando que os criminosos passaram a atirar na direção da população:
"A gente está falando de áreas onde há dificuldades (para fazer incursões). Se não fizéssemos ações de retirada de barricadas e de apreensões de fuzis, a tendência seria que essa situação se agravasse ainda mais. O papel da Polícia Militar é atuar levando mais segurança para as pessoas".
A porta-voz destacou que as operações são planejadas com base nos resultados das ações anteriores. Segundo ela, os traficantes do Complexo de Israel fizeram uma “cortina de fumaça” ao atirar contra a população, situação inesperada pelos agentes.
Sobre esses casos de violência, o presidente do HotéisRio, Alfredo Lopes, disse ontem que a imagem da cidade está se dissolvendo. Para ele, a responsabilidade é de todos os governos:
"E essa crise afeta não só hotéis, mas outras atividades relacionadas como bares, restaurantes e shoppings, que faturam menos".