(Câmara Municipal RJ/Divulgação)
Agência de notícias
Publicado em 25 de julho de 2023 às 08h52.
Um acordo de delação poderá fornecer informações para que a investigação chegue aos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018.
A avaliação foi feita ontem pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, que anunciou a colaboração premiada do ex-policial Élcio Queiroz, base para nova prisão e revelações relacionadas ao caso.
A investigação passou a ser acompanhada pela Polícia Federal em fevereiro deste ano, após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O delator citou o nome de um suposto intermediário responsável por contratar o ex-policial militar Ronnie Lessa, acusado de efetuar os disparos que mataram a vereadora carioca, e indicou a origem da arma utilizada no crime (mais informações na pág. A8).
A partir dos relatos, a PF prendeu na manhã de ontem o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, suspeito de dar "auxílio moral e material" aos assassinatos.
A execução de Marielle - que estava em exercício de seu mandato - permeou nos últimos anos a mais aguda polarização que marcou a política brasileira. No atual governo do PT, a elucidação do caso se tornou uma "questão de honra do Estado brasileiro", segundo Dino. Lula deu à irmã da vereadora, Anielle Franco, o posto de ministra da Igualdade Racial.
O titular da Justiça afirmou que a delação de Élcio Queiroz colocou o caso em um "novo patamar" e confirmou o que já se sabia sobre a execução do crime. "Há uma espécie de mudança de patamar da investigação. Se conclui a investigação sobre a execução e há elementos para um novo patamar, a identificação dos mandantes. Nas próximas semanas provavelmente haverá novas operações derivadas das provas colhidas hoje."
Conforme o ministro, as diligências realizadas ontem concluíram uma fase da investigação. A operação cumpriu sete mandados de busca e apreensão e um de prisão.
Marielle e Anderson Gomes foram atingidos por tiros dentro do carro em que estavam, na região central do Rio, após a vereadora participar de um evento do PSOL.
Uma assessora sobreviveu ao atentado. As investigações e acusações apontam que o crime foi praticado por ex-agentes do Estado. Ronnie Lessa e Élcio Queiroz estão presos na Penitenciária Federal de Porto Velho, em Rondônia.
Após assinar a colaboração premiada, o agora delator prestou depoimento no dia 14 de junho, na sede do Comando de Aviação Operacional, em hangar da PF no Aeroporto de Brasília.
O Estadão teve acesso ao documento. Élcio Queiroz confessou sua participação no crime e implicou diretamente Ronnie Lessa e Maxwell.
Os relatos apontam a dinâmica do assassinato, detalhando itinerários e roteiros dos criminosos. Conforme já descrito na ação penal, o delator afirmou que Lessa atirou contra a vereadora e o motorista, e que ele dirigiu o carro que perseguiu o veículo das vítimas.
Segundo a delação, o suposto contratante do crime foi o então policial militar Edimilson Oliveira da Silva, conhecido como "Macalé", assassinado em novembro de 2021.
De acordo com Dino, há convergência entre a narrativa do ex-PM e informações levantadas pela PF. "Esse evento de enorme importância, a ocorrência da delação premiada, com a confirmação de outros personagens, da dinâmica do crime, dos executores, permitirá esse caminho, que nós temos a convicção, a esperança - como é o nome da operação - de que conduzirá aos mandantes", reforçou o ministro.
Preso preventivamente na operação de ontem, Maxwell já tinha sido condenado por obstrução judicial por ajudar a esconder provas desse caso. A ação conjunta de policiais federais e promotores do Ministério Público do Rio de Janeiro foi batizada de "Élpis" - nome de uma deusa da mitologia grega que personificaria a esperança.
"A gente segue esperançosa de que vai descobrir e vai chegar aos mandantes de quem mandou matar Marielle e por quê", afirmou Anielle Franco. Em agenda oficial na Colômbia, a ministra da Igualdade Racial elogiou o trabalho realizado pela PF na apuração do assassinato da irmã.
"Que bom que hoje a gente tem um governo sério, tem pessoas à frente de pastas importantes, que a gente pode confiar e contar", disse. "Sigo dizendo que, enquanto a gente não combater a violência política nesse país, enquanto a gente não souber quem mandou matar Marielle, a nossa democracia segue fragilizada."
Já a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), associou a saída de Jair Bolsonaro (PL) da Presidência ao avanço das investigações. "Muito bom o avanço da Polícia Federal nas investigações sobre o assassinato de Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
Só foi Bolsonaro sair da Presidência para o inquérito andar. Agora é chegar ao mandante", escreveu Gleisi em uma rede social. Na campanha presidencial do ano passado, o então candidato Lula insinuou que Bolsonaro possuía proximidade com milicianos e afirmou que "gente dele não tem pudor em ter matado a Marielle".
As notícias envolvendo o caso Marielle suscitaram ainda críticas do deputado cassado Deltan Dallagnol, que questionou o uso da delação premiada de Élcio Queiroz na investigação do assassinato da vereadora. Em postagem nas redes sociais, ele ironizou o fato:
"A esquerda, os garantistas de ocasião e os prerrogativistas todos festejarão o que até ontem eles criticavam na Lava Jato", escreveu o ex-procurador responsável pela coordenação da Operação Lava Jato no Paraná, que usou extensamente as delações premiadas em suas investigações.
Na coletiva de imprensa, Dino precisou falar sobre o tema. "A delação premiada, sozinha, não constitui um meio de prova suficiente, mas a delação premiada se soma a um conjunto que já havia sido apurado antes", afirmou.