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Governo reduz em 80% o número de cursos gratuitos para policiais

Em 2018, a rede de EAD para policiais tinha 72 cursos disponíveis, com 292 mil matrículas; em 2019, os números caíram para 47 cursos e 44,5 mil matrículas

PMs: Os treinamentos, feitos na modalidade de ensino a distância, o EaD, foram criados em 2005, ainda na gestão do ex-presidente Lula (Fernando Frazão/Agência Brasil)

PMs: Os treinamentos, feitos na modalidade de ensino a distância, o EaD, foram criados em 2005, ainda na gestão do ex-presidente Lula (Fernando Frazão/Agência Brasil)

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Clara Cerioni

Publicado em 25 de agosto de 2020 às 15h05.

Eleito com discurso de suporte aos policiais e endurecimento da repressão à criminalidade, o governo Jair Bolsonaro reduziu a quantidade de cursos de formação e aperfeiçoamento fornecidos pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, o que levou a uma queda na ordem de 80% na instrução de agentes em todo o país.

O motivo alegado foi a necessidade de atualizar e revisar o conteúdo. Os treinamentos, feitos na modalidade de ensino a distância, o EaD, foram criados em 2005, ainda na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A plataforma do governo oferece três tipos de cursos, todos virtuais e gratuitos. Os de aperfeiçoamento pessoal incluem conteúdos como ética, gestão e direitos humanos. Já os exclusivos para policiais são focados em técnicas relacionadas ao trabalho, como perícia (balística e papiloscopia), inteligência cibernética e investigação de homicídio e estupro.

Eles podem ser autoinstrutivos ou acompanhados por tutores, como os da área de inteligência, que devem ser retomados neste ano.

Ao fim do governo Michel Temer, em 2018, a rede de ensino a distância do governo federal tinha 72 cursos disponíveis, que receberam 292 mil matrículas. Ao todo, 204 mil profissionais da segurança concluíram cursos do catálogo.

Em 2019, os números caíram para 47 cursos e 44,5 mil matrículas. Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, em resposta a pedido feito pelo Instituto Sou da Paz.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública é alvo de uma disputa política para que seja desmembrado, uma forma de recriar a pasta dedicada exclusivamente à área de segurança. Aliados do presidente querem emplacar um nome ligado às PMs.

Eles alegam, entre outras razões, que o ministro André Mendonça, ex-advogado-geral da União e pastor presbiteriano, tem experiência apenas em assuntos jurídicos e não com gestão de segurança.

O ministro sofre pressão também por causa do dossiê produzido por uma unidade de inteligência da pasta. O relatório, revelado pelo UOL em julho, lista dados pessoais de policiais e acadêmicos autodeclarados "antifascistas" e potencialmente adversários políticos do governo. O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que na quinta-feira passada proibiu a pasta de monitorar opositores.

Um dos alvos do relatório, o professor Ricardo Balestreri, especialista em direitos humanos e secretário nacional de Segurança Pública na gestão de Lula, foi um dos idealizadores do sistema de aulas a distância. Ele afirma que os demais poderes devem monitorar o programa de cursos para evitar um risco de formação de "milícias políticas no lugar de polícias".

"Uma coisa muito revolucionária é que todas as disciplinas tinham conteúdo transversal de direitos humanos, porque a ideia era mudar a prática da polícia brasileira no seu dia a dia na rua", disse Balestreri.

Números

Questionado pelo Estadão, o ministério informou números que apontam para uma retomada neste ano, com 92 mil inscritos e 71 mil aprovados até julho. Atualmente, há 46 títulos disponíveis, além de 14 cursos novos em produção e 18 em revisão, segundo a pasta.

"Ao longo de seis meses a Senasp aprimorou um novo ambiente de estudos, revisando seu catálogo de cursos quanto à atualização de legislação, técnicas e procedimentos. Os cursos foram encaminhados aos setores técnicos para identificação de possíveis impropriedades e a necessidade de adaptação de nova linguagem", disse o ministério.

A diretora executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, afirmou faltar clareza ao governo sobre como induzir a política de segurança pública no país.

"Não acho que seja uma motivação política, de tirar temas, algo ideológico, mas sim uma falta de capacidade de gestão e de escolha do que é prioridade, do que cabe ao ministério fazer em política de segurança", disse Carolina.

"Para muitos Estados sem recursos, o sistema acaba sendo uma fonte de repertório para os policiais e parece que ficou para segundo plano. A plataforma podia ter problemas, mas estava consolidada", completou ela.

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