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Governo Bolsonaro mais que dobra presença de militares em cargos civis

Antes de 2020, no período levado em conta para a comparação, não havia esse tipo de contrato destinado a militares da reserva

Bolsonaro: governo mais que dobrou a presença de militares em cargos civis; são 6,1 mil, diz TCU (Ricardo Moraes/Reuters)

Bolsonaro: governo mais que dobrou a presença de militares em cargos civis; são 6,1 mil, diz TCU (Ricardo Moraes/Reuters)

AO

Agência O Globo

Publicado em 17 de julho de 2020 às 21h45.

A quantidade de militares da ativa e da reserva que ocupam cargos civis no governo federal mais do que dobrou nos dois primeiros anos da gestão de Jair Bolsonaro. É o que revela um levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU), concluído na tarde desta sexta-feira. Em 2018, havia 2.765 militares em cargos civis do governo federal. Em 2019, o número chegou a 3.515 cargos destinados a servidores oriundos da caserna. E em 2020, o total chegou a 6.157, um aumento de 122%.

O levantamento mostra pela primeira vez o tamanho da militarização dos espaços civis na União. Os dados mostram que já atuam no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) 1.969 militares da reserva. Eles têm contratos temporários, numa estratégia definida para tentar reduzir a fila de processos de aposentadoria e outros benefícios à espera de uma deliberação do órgão. Antes de 2020, no período levado em conta para a comparação, não havia esse tipo de contrato destinado a militares da reserva.

Um dos aumentos mais expressivos ocorreu entre militares que passaram a ocupar cargos comissionados. Eram 1.965 em 2016, número que foi caindo até 2018, para 1.934. Já no primeiro ano do governo Bolsonaro, a quantidade subiu para 2.324, um aumento de 20%. Neste ano, são 2.643 militares ocupando esses cargos, ou 34,5% a mais.

A quantidade de militares que acumulam cargos de profissionais de saúde na esfera civil quase dobrou entre 2016 e 2020: de 642 para 1.249. Entre os professores, houve uma pequena redução, de 197 em 2016 para 179 neste ano.

O levantamento feito pelo TCU inclui ainda os militares que acumulam a função com cargos temporários, um número baixo e que permaneceu estável ao longo dos anos (são 37 em 2020). Há ainda 72 que foram para a reserva e que tomaram posse em outros cargos antes de dezembro de 1998, o que foi permitido por uma emenda constitucional naquele ano. Há cinco anos, havia 121 militares nessa condição, conforme os dados compilados pelo TCU.

Uma outra novidade do governo Bolsonaro, segundo os números levantados pelo TCU referentes aos últimos cinco anos, é a presença de militares em conselhos de administração de estatais, função pela qual recebem pagamentos adicionais, e em "cargos na alta administração do Poder Executivo". Oito militares estão nessas posições, conforme o TCU. Nenhum as ocupou em 2016, 2017, 2018 e 2019, afirma o tribunal. O levantamento pode estar defasado por inexistir acesso do tribunal a todas as bases das estatais.

Já os 1.969 militares da reserva que estão no INSS foram escolhidos a partir de um processo seletivo. A atuação deles no órgão, focada na tentativa de redução das filas formadas para obtenção de benefícios, é por tempo determinado.

O levantamento sobre a presença de servidores da caserna em cargos civis do governo Bolsonaro foi feito a pedido do ministro Bruno Dantas. Os dados foram repassados ao presidente do TCU, ministro José Mucio Monteiro, e então enviados aos gabinetes de todos os ministros do tribunal.

Caso algum deles entenda ser necessário adotar alguma providência, como a realização de uma auditoria ou o questionamento sobre a regularidade dessas contratações, poderá fazer um pedido nesse sentido, uma vez que não há um processo específico tratando do assunto.

Os dados não incluem militares da reserva que continuam trabalhando na caserna. A lei já prevê contratações do tipo, chamadas "tarefa por tempo certo". Como já era prevista por lei, esses dados não entraram no levantamento, que focou em cargos civis ocupados por militares.

Os dados do TCU vêm a público num momento em que Bolsonaro enfrenta uma sucessão de questionamentos sobre o excesso da militarização em áreas estratégicas do governo. Um de seus ministros mais próximos, o general Luiz Eduardo Ramos, se viu pressionado a ir para a reserva do Exército em razão da presença decisiva dentro do Palácio do Planalto. Ele é ministro da Secretaria de Governo da Presidência, e só deixou a ativa do Exército nos últimos dias.

Bolsonaro também é pressionado a afastar o general Eduardo Pazuello da liderança do Ministério da Saúde. Ele permanece na ativa e, há mais de dois meses, é o ministro interino da Saúde. Pazuello levou para a pasta militares da ativa e da reserva, que substituíram técnicos com anos de experiência em suas respectivas áreas de atuação.

Nesta semana, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) solicitou que seja apurada a participação de militares da ativa em funções públicas civis no governo federal. O pedido — do subprocurador Lucas Rocha Furtado — foi feito em meio a críticas à presença dos militares no governo. De acordo com Furtado, o trecho da Constituição que autoriza o uso de militares da ativa em cargos civis principalmente para "melhorar o atendimento a populações de regiões de fronteira e distantes dos grandes centros urbanos".

No fim de semana, o ministro Gilmar Mendes chegou a dizer que "o Exército está se associando a esse genocídio", numa referência à incapacidade do Ministério da Saúde, sob comando de militares, em frear o avanço do novo coronavírus e as mortes provocadas pela doença. Em resposta, o Ministério da Defesa anunciou uma representação contra Gilmar à Procuradoria-Geral da Repúblcia (PGR). Nesta sexta-feira, o vice-presidente, Hamilton Mourão, no entanto,disse considerar como "superado" o "incidente" com o ministro Gilmar Mendes.

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