Renan Calheiros e Michel Temer: na prática, o Planalto tem feito de tudo para não contrariar o senador peemedebista (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 2 de novembro de 2016 às 11h40.
Brasília - O Palácio do Planalto atuou nos bastidores, nos últimos dias, para o Supremo Tribunal Federal (STF) adiar o julgamento que pode complicar a vida do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
A sessão do Supremo que vai examinar a ação pedindo que réus sejam impedidos de ocupar cargos na linha sucessória da Presidência da República está marcada para amanhã, mas o governo avalia que este cronograma é inconveniente do ponto de vista político.
O Estado apurou que pelo menos dois auxiliares do presidente Michel Temer procuraram informalmente ministros da Corte para falar do momento inoportuno de se julgar a ação apresentada pelo partido Rede Sustentabilidade.
Na prática, o Planalto tem feito de tudo para não contrariar o senador peemedebista, às vésperas da votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 no Senado, que na Casa segue como PEC 55.
Considerada a âncora do ajuste fiscal, a medida limita o aumento dos gastos públicos por 20 anos e já foi aprovada na Câmara, mas, para entrar em vigor, ainda tem um calendário de tramitação no Senado. A votação no plenário, em primeiro turno, está prevista para o próximo dia 29 e, na segunda etapa, em 13 e 14 de dezembro.
A Rede quer que o Supremo estabeleça que pessoas com denúncias admitidas pela Corte não possam substituir o presidente da República, nem mesmo em caso de viagens. Alvo de 11 inquéritos, Renan é o segundo na linha sucessória de Temer, após o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O ministro do STF Edson Fachin já liberou para julgamento uma denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Renan.
Caso o plenário do Supremo aceite a denúncia, ele se tornará réu e responderá a uma ação penal por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. A data desse julgamento, no entanto, ainda não foi definida.
O cenário ideal para o Planalto é que a decisão sobre a linha sucessória seja postergada, mesmo porque Renan deixa a cadeira de presidente do Senado em fevereiro de 2017, quando haverá eleição para renovar o comando do Congresso.
Ausências
O feriado de hoje ainda pode ajudar o governo. Com um plenário esvaziado, o STF pode acabar mesmo adiando o julgamento da ação movida pela Rede. Para que haja quórum e a matéria seja apreciada é necessária a presença de oito dos 11 ministros.
O ministro Gilmar Mendes não participará do julgamento por ter tirado dias de folga no exterior. Ricardo Lewandowski, por sua vez, é aguardado amanhã em Porto Seguro, na Bahia, onde fará a palestra de abertura do 6.º Encontro Nacional de Juízes Estaduais (Enaje). Os organizadores do evento confirmaram que ele estará na cidade já no horário do almoço.
Existe ainda a possibilidade de que um dos ministros presentes à sessão se declare suspeito para analisar o caso. Para o relator do processo, ministro Marco Aurélio Mello, um eventual adiamento seria negativo.
"Precisamos definir essa matéria porque a época é propícia, já que não temos ninguém na linha de substituição do presidente da República na condição de réu no Supremo. Então, estaremos decidindo mesmo em tese. A matéria não tem complexidade maior", disse Marco Aurélio ao Estado.
"Estarei presente à sessão, pronto a fazer o relato, a votar e a ouvir. A sociedade precisa ouvir, até mesmo porque não podemos colocar em segundo plano o valor ético e moral. Todo adiamento é negativo e trunca a apreciação da matéria", afirmou o ministro.
Caráter
O julgamento foi marcado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, antes do desentendimento com Renan em virtude da deflagração de uma operação que resultou na prisão de quatro policiais legislativos suspeitos de obstruir as investigações da Lava Jato.
Na semana passada, o peemedebista ligou para Cármen Lúcia, pediu desculpas por ter chamado de "juizeco" o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara Federal de Brasília, que autorizou as prisões, e afirmou que a presidente do Supremo é "um exemplo de caráter".
Na denúncia oferecida ao Supremo, a Procuradoria-Geral da República considerou que Renan recebeu propina da construtora Mendes Júnior para apresentar emendas que beneficiariam a empreiteira.
Em troca, o senador peemedebista teria pagas pela empresa as despesas pessoais da jornalista Monica Veloso, com quem o parlamentar mantinha relacionamento extraconjugal.
A investigação tramita na Corte desde 2007 e a acusação foi formalizada em 2013. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.