O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou financiamento para a Eve Air Mobility (Eve) desenvolver a unidade de produção do eVTOL (carro voador) (Eve Air Mobility/Divulgação)
Repórter
Publicado em 26 de janeiro de 2025 às 06h15.
A aprovação de recursos de instituições governamentais para projetos de inovação na indústria decolou ao longo de 2024 e beneficiou o programa Nova Indústria Brasil (NIB), que acaba de completar um ano.
Na Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), as aprovações cresceram 232,8% na comparação com 2023, e somaram R$ 22,3 bilhões no ano passado. Na Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), por sua vez, os 610 projetos financiados totalizaram R$ 1 bilhão em investimentos em inovação e pesquisa, também um recorde para a instituição criada em 2013.
Em novembro do ano passado, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já apontava também uma nova marca, com R$ 11,1 bilhões aprovados para projetos à inovação industrial brasileira. O resultado é o melhor de toda a série histórica, iniciada em 1995 e cuja média é de R$ 1,8 bilhão por ano, e um aumento de 385% sobre o total aprovado em todo o ano de 2022, de R$ 2,3 bilhões. Os dados de dezembro do banco de fomento ainda serão consolidados em balanço.
"No BNDES, a indústria ultrapassou o agro e tornou-se uma prioridade. O apoio ao agro também cresceu 26%, mas para a indústria também. Queremos continuar apoiando o agro, mas queremos apoiar a indústria e a sua volta mais forte. E, obviamente, a NIB tem um papel estratégico de puxar os investimentos", afirma José Luiz Gordon, diretor de desenvolvimento produtivo, inovação e comércio exterior do BNDES.
A nova política industrial foi lançada em janeiro do ano passado pelo governo federal com metas específicas para seis missões que têm como objetivo reindustrializar o Brasil.
Elas abrangem áreas como agroindústria; complexo industrial da saúde; infraestrutura, moradia e mobilidade; transformação digital; bioeconomia e transição energética e tecnologia de defesa. E são viabilizadas principalmente pelo Plano Mais Produção, que, além de recursos das instituições governamentais citadas, também conta com investimentos de outros bancos públicos, somando atualmente com R$ 506,71 bilhões, a maior parte – R$ 300 bilhões – do BNDES.
De 2023 a 2024, R$ 181,3 bilhões de reais do banco de fomento foram alocados no setor industrial, dividido nos quatro eixos do Plano Mais Produção: inovação, verde, produtividade e exportação. A maior aprovação, no entanto, não aproxima os números aos do passado. Na década de 1990, por exemplo, o setor liderava as aprovações, obtendo mais de 50% dos recursos concedidos pela instituição.
Além disso, a maior parte dos projetos aprovados, até o momento, são do eixo da produtividade, com R$ 131 bilhões aprovados. Em segundo aparece a exportação, com R$ 32 bilhões, seguida pela inovação, R$ 13,8 bilhões, e verde, com R$ 4,1 bi.
Gordon justifica que as empresas que inovam ainda são em "menor quantidade, mas mesmo assim recorde no banco". O executivo observa também que muitos projetos se enquadram em mais de um ou até todos os eixos. Ele cita um projeto de aquisição de novas máquinas, que entra em produtividade, mas que no fim do dia promoverá também ganhos na agenda verde.
"Não queremos fazer dupla contagem. Então é mais fácil caracterizar como produtividade. Por isso que tem mais, tem muita demanda por máquinas, equipamentos e produção fabril. O que é bom, significa que a economia está aquecida também, as empresas estão investindo em algo que é super importante, que é ganho de produtividade", afirma.
Acompanhando de perto a NIB e as empresas, o diretor do BNDES destaca que, na busca pela neoindustrialização, o Brasil caminha para ser o grande líder de uma indústria verde. "E o grande líder de uma indústria inovadora", diz.
Nessa agenda, ele destaca iniciativas como o carro voador, o eVTOL, cujo protótipo vem sendo desenvolvido pela Eve Air Mobility (Eve), subsidiária da Embraer. O projeto, considerado o futuro da aviação ao utilizar energia elétrica em vez de combustível fóssil, foi objeto de duas operações de financiamento do BNDES.
Assim como o financiamento no valor total de R$ 1 bilhão para a Raízen Energia S/A construir uma Unidade de Etanol Celulósico de segunda geração, o E2G, em Andradina (SP), com capacidade instalada de produção de até 82 milhões de litros por ano. A aprovação foi divulgada em meados de janeiro.
"Fazer a reindustrialização dentro de um conceito de descarbonização da economia é determinante para a gente", diz Celso Pansera, presidente da Finep.
O órgão, considerado o principal braço financeiro para projetos de inovação, também vê correta a estratégia de tornar a inovação e a sustentabilidade como eixos transversais da nova política industrial do país.
Segundo o dirigente, a NIB tem sido o "plano de voo" da Finep. Desde 2023 foram contratados mais de R$ 29 bilhões somente para a indústria — R$ 22 bilhões no ano passado e R$ 7,82 bi em 2023.
"Por isso a NIB é um plano de voo para a gente. Não só ela resolve um problema de modernizar e inovar nossa indústria, gerando mais e melhores empregos, como ela também dá um sentido para a pós-graduação brasileira, uma das melhores do mundo, mas que precisa formar essa pessoa e ela ter onde trabalhar, sem precisar sair do Brasil para arranjar um bom emprego", afirma Pansera.
A previsão para este ano é de novo recorde, se confirmada a ampliação do orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para R$ 15 bilhões — em 2024, a quantia foi de R$ 12,7 bilhões. O volume de recursos da instituição vem aumentando desde o descontingenciamento de cerca de R$4,2 bilhões e a sanção da Lei 14.554/23, que retorna para a Taxa Referencial a base de indexadora nos financiamentos via Finep.
Neste ano, o foco em inovação da Finep estará sobretudo na produção de Combustíveis Sustentáveis de Aviação (SAFs), minerais estratégicos e semicondutores.
No início do ano, a financiadora pediu um aporte de R$ 220 milhões para o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (CEITEC), do Rio Grande do Sul. "A área de semicondutores terá a nossa atenção em 2025", afirma o presidente da Finep.
Há, contudo, desafios a serem superados. Apesar de a NIB alavancar investimentos em inovação, eles ainda estão concentrados nas regiões Sudeste e Sul. Um balanço de outubro do ano passado da Finep apontou que as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste detinham apenas 11% dos recursos até aquele momento.
O presidente reconhece essa assimetria. A meta da entidade na área de crédito é atingir no mínimo, a proporção do PIB de cada região.
Para isso, a Finep mira projetos na cadeia de agroindústria principalmente no Nordeste, onde 2% da agricultura familiar tem algum tipo de equipamento — número abaixo do de outras regiões —, e na bioeconomia no Norte.
"Lançamos três editais esse ano especificamente voltados para desenvolver tecnologia para a agricultura familiar. Essa iniciativa é um exemplo que pode melhorar o movimento de inovação no Nordeste. A mesma coisa no Norte: aproveitar essa riqueza natural que temos lá para extrair óleos e essências raras e transformá-las, industrializar isso, não vender apenas planta bruta ou a essência bruta para o exterior", diz Pansera.
A Embrapii, por sua vez, possui uma carteira ativa de 1.059 projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I), totalizando R$ 2,4 bilhões em investimentos. No ano passado, a agroindústria e as indústrias de alimentos e bebidas, contabilizadas como uma única categoria, foram as campeãs em número de projetos contratados, com 94 iniciativas.
Entre os financiados, está o nanossatélite VCUB1, o primeiro de alto desempenho com tecnologia 100% nacional. O equipamento foi desenvolvido pela Unidade Embrapii de Sistemas Embarcados (ISI-Embarcados), do Senai, em Florianópolis (SC), e pode ser aplicado no monitoramento agrícola e georreferenciamento de plantações e rebanhos. A Embrapii entrou com R$ 2,9 milhões em recursos.
A área de tecnologias transversais com aplicações em educação, serviços e financeiro ficou em segundo lugar, com 74 projetos. Nessa categoria, destacam-se iniciativas de inteligência artificial, internet das coisas (IoT) e realidade aumentada. O ramo da Saúde ficou em terceiro lugar, com 54 projetos financiados.
"Uma série de ações está sendo desenvolvida para ampliar o número de projetos contratados. A Embrapii tem investido na promoção do modelo, na capacitação das suas Unidades para captar mais projetos, assim como na mobilização de novas empresas clientes por meio de reuniões, eventos e Embrapii Days [workshop para negociação de projetos entre empresas e Unidades]", afirma Alvaro Prata, diretor-presidente da Embrapii.
Valter Pieracciani, fundador da Pieracciani Desenvolvimento de Empresas, considerado um centro de referência em consultoria, educação e funding para inovação, diz ser "justo" que o governo brasileiro seja sócio em projetos de inovação da indústria.
"Todos os países inovadores financiam a inovação. A inovação precisa ter apoio do governo porque ela envolve risco e promove desenvolvimento e competitividade", afirma.
Há 40 anos atuando como consultar na área, ele comenta que "nunca viu tanto dinheiro" para a inovação. "A Nova Indústria Brasil realmente alavancou", diz.
Esse apoio à inovação também movimenta outros mecanismos de financiamento do setor, como a Lei do Bem que, desde 2005, oferece incentivos fiscais a empresas que investem em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica.
Nos últimos dois anos, segundo dados levantados pela consultoria junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), foram investidos aproximadamente R$ 63 bilhões em iniciativas por meio da legislação.
Esses recursos financiaram 27 mil projetos desenvolvidos por 6.505 empresas, refletindo a robustez do programa. Como resultado, as companhias beneficiadas obtiveram cerca de R$ 13 bilhões em renúncia fiscal.
Pieracciani observa, porém, que o impacto poderia ser ainda maior, se novas indústrias, principalmente no setor de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), fossem contempladas.
"Três mil empresas usam a Lei do Bem. Mas tem 190 mil empresas que poderiam usar, que estão em regime de Lucro Real. E por que esse número pequeno? Porque a legislação é muito restritiva e beneficia apenas a inovação de laboratório, e não é nosso caso. A nossa realidade é a industria e a engenharia, a solução que três encarregados se juntaram e fizeram escondidos e chamaram de gambiarra, mas na verdade é uma baita de uma máquina que consegue resolver um problemaço", pondera o especialista.
Os dados do programa indicam que as empresas dos setores financeiro, saúde, seguros e educação, agrupadas em uma única categoria pelo MCTI, responderam por 43% do montante investido.
Em seguida, os setores de mecânica e transporte representaram 10%, enquanto software e eletroeletrônicos somaram 8%. Outras indústrias relevantes incluem química/petroquímica com 5%, fármacos e mineração com 5%, alimentos com 3%, e agronegócio e bens de consumo com 2%.