Sara Winter ao centro: militante está acampada desde 1º de maio no estacionamento do Ministério da Justiça, em Brasília (Wallace Martins/Futura Press/Estadão Conteúdo)
Clara Cerioni
Publicado em 15 de junho de 2020 às 10h54.
Última atualização em 15 de junho de 2020 às 16h17.
A militante bolsonarista Sara Winter foi presa preventivamente na manhã desta segunda-feira, 15, no âmbito do inquérito que investiga a realização e o financiamento de atos antidemocráticos contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional.
A autorização veio do relator do caso, o ministro do STF Alexandre de Moraes. Esse inquérito em questão não tem relação com o das fake news, que também é relatado por Moraes. A ativista já foi alvo de busca e apreensão nesta outra investigação.
A prisão acontece dois dias depois que o grupo de inspiração militar que Winter lidera, chamado "300 do Brasil, lançar fogos de artifício contra o prédio do STF em Brasília.
Outros cinco pedidos de prisão foram feitos, também de ativistas do mesmo grupo. Todos os mandados foram apresentados na última sexta-feira, 12, e são temporários, ou seja, têm duração de cinco dias.
De acordo com nota divulgada pelo Ministério Público Federal, há indícios de que o grupo continua organizando e captando recursos financeiros para ações que se enquadram na Lei de Segurança Nacional (leia mais abaixo). O objetivo das prisões, diz o órgão, é ouvir os investigados e reunir informações de como funciona o suposto esquema criminoso.
O ataque ao STF aconteceu no último sábado, 13, depois que o governo do Distrito Federal removeu o acampamento do grupo, por conta das medidas restritivas decretadas durante a pandemia do novo coronavírus.
O "300 do Brasil" se instalou no estacionamento do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, no Eixo Monumental, em Brasília, em 1º de maio e, desde então, vêm participando de atos em apoio ao presidente Jair Bolsonaro.
Recentemente, em entrevista à BBC News, Winter disse que os membros guardavam armas no acampamento para segurança. A revelação fez o Ministério Público do DF entrar com pedido para remover os ativistas. Há um mês, eles vinham travando uma disputa judicial com o órgão para permanecer no local.
O inquérito em curso no STF foi instaurado em 21 de abril deste ano, após o Procurador-Geral Augusto Aras pedir para que a corte investigasse a realização e o financiamento de atos antidemocráticos que aconteceram na época.
As investigações, segundo a PGR, têm como objetivo apurar uma possível violação da Lei de Segurança Nacional. Os protestos reivindicaram, entre outras pautas, a reedição do AI-5, ato institucional que, em 1968, endureceu o regime militar no país e abriu espaço para o fechamento do Congresso. Os manifestantes pediram, ainda, o fechamento do STF e a prisão dos ministros.
Na ocasião, o próprio presidente participou das manifestação pró-intervenção militar em Brasília, mas ele não entrou como um dos investigados. A ação foi instaurada uma vez que a Constituição Federal de 1988 proíbe o financiamento e a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado democrático de Direito.
Ao autorizar a abertura do inquérito, no fim de abril, Moraes disse que "é imprescindível a verificação da existência de organizações e esquemas de financiamento de manifestações contra a Democracia e a divulgação em massa de mensagens atentatórias ao regime republicano, bem como as suas formas de gerenciamento, liderança, organização e propagação que visam lesar ou expor a perigo de lesão os Direitos Fundamentais, a independência dos Poderes instituídos e ao Estado Democrático de Direito, trazendo como consequência o nefasto manto do arbítrio e da ditadura".
De lá para cá, as investigações do STF sobre os atos antidemocráticos têm se costurado com as apurações no processo das fake news, apesar de serem ações diferentes. Ambas acabam mirando aliados de Bolsonaro e as duas investigações querem esclarecer se por trás dos protestos e da disseminação de informações enganosas pelas redes sociais há uma rede de financiamento.
A ação que investiga os protestos antidemocráticos mira empresários e ao menos dois deputados federais bolsonaristas, mas os nomes não foram revelados porque o processo corre sob segredo de Justiça.
No início do mês, o jornal O Globo revelou que a PGR pediu para Moraes autorizar o cumprimento de diligências no inquérito dos atos antidemocráticos. Entre os alvos estão youtubers e influenciadores digitais. A equipe de Aras pediu foco em operações virtuais, que podem pegar usuários de internet que disseminam mensagens ofensivas e antidemocráticas.
O nome do grupo, "300 do Brasil", é uma referência aos 300 de Esparta, que resistiram à invasão persa na Batalha de Termópilas, em 480 a.C., mas acabaram derrotados.
É composto por cerca de 20 pessoas, que ficaram mais de dois meses acampadas em Brasília. A principal porta-voz do grupo é Sara Winter, 27 anos, cujo nome de batismo é Sara Fernanda Giromini.
Seu nome atual, Sara Winter, é homônimo ao de uma socialite britânica que foi espiã de Hitler e membro da União Britânica de Fascistas, mas ela nega a relação e diz que o nome foi inspirado em uma cantora.
Antes de ser uma das líderes mais populares da extrema-direita, ela atuou por causa feministas. Em 2014, a militante passou por uma mudança radical e começou a defender pautas conservadoras. Neste ano, veio à tona que ela lidera o grupo "300 do Brasil".
Segundo relatos de uma jornalista que está nos chats privados do movimento, os organizadores se intitulam "o maior acampamento pelo fim da corrupção e da esquerda no Brasil". Instigam, ainda, aqueles que aderiram ao treinamento com frases como "você não é mais um militante. Você agora é um militar".
Além dos dois inquéritos em curso no STF, a militante também é investigada por improbidade administrativa, a pedido do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Os procuradores investigam possíveis irregularidades na utilização de 25 mil reais recebidos por ela do fundo eleitoral em 2018. Na última eleição, Winter concorreu para deputada federal pelo DEM, mas não foi eleita.