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Empresa de Picciani até terceirizou lavagem de dinheiro, diz MP

Ministério Público Federal afirma que o principal propósito da empresa Agrobilara é a lavagem de dinheiro

Bois: em delação, uma executiva da empresa disse que comprou vacas superfaturadas da Agrobilara (foto/Site Exame)

Bois: em delação, uma executiva da empresa disse que comprou vacas superfaturadas da Agrobilara (foto/Site Exame)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 15 de novembro de 2017 às 11h14.

São Paulo - Na manifestação ao Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF2), que originou a Operação Cadeia Velha, desdobramento da Lava Jato, o Ministério Público Federal afirma que o principal propósito da empresa Agrobilara, controlada pelo presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Jorge Picciani (PMDB) e sua família, é a lavagem de dinheiro.

A Agrobilara tem sede em Uberaba (MG), cidade onde a Polícia Federal prendeu Felipe Picciani, filho de Jorge, na manhã desta terça-feira, 14. O presidente da Assembleia fluminense foi levado para depor.

A Procuradoria cita, no documento, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) e a empreiteira Carioca Engenharia. Em delação, uma executiva da empresa disse que comprou vacas superfaturadas da Agrobilara.

"Os negócios no ramo de gado de Jorge Picciani servem para lavagem do produto de crimes antecedentes de corrupção praticados por ele, mas também, em demonstração de grande sofisticação, praticados por terceiros (Carioca Engenharia), para pagamento de propina em espécie a Cabral e para lavagem do produto do crime de corrupção de outros funcionários públicos", afirma o Ministério Público Federal.

Controlam a Agrobilara os peemedebistas Leonardo Picciani, ministro dos Esportes (Governo Michel Temer), Jorge Picciani, presidente da Assembleia Legislativa do Rio, e Rafael Picciani, deputado estadual.

"Sem dúvida o deputado Jorge Picciani conta com a colaboração indispensável de seu filho Felipe Picciani, que no site do Grupo Monte Verde (Agrobilara) é apresentado como zootecnista que se dedica integralmente à Monte Verde. Aliás, a dedicação à Agrobilara, além da submissão às diretrizes de seu pai na condução dos negócios fica patente nos e-mails trocados entre eles, o que significa dizer que Felipe age em consonância com o principal propósito da empresa, ou seja, lavagem de ativos dos crimes praticados por seu pai e por outras pessoas da esfera de conhecimento do seu pai (empresários e funcionários públicos)", diz a Procuradoria.

Jorge e Felipe Picciani foram citados também na delação premiada do ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro Jonas Lopes de Carvalho Júnior. O delator relatou que ajustou com Picciani pai o subfaturamento da operação de compra do gado.

"Procurou, então, Felipe Picciani para lhe auxiliar; que chegou a ir a Fazenda de uma agropecuária da família Picciani em Uberaba/MG (Agrobilara), por meio de avião particular, jato, que saiu do aeroporto Santos Dummont", narrou. "Nessa oportunidade, estava acompanhado do deputado estadual Jorge Picciani e seu filho Felipe Picciani, ambos sócios da referida agropecuária."

Segundo o delator, na ocasião, ele comprou 100 novilhas Girolando, ao custo de R$ 600 mil. Jonas Lopes Júnior declarou ter ajustado com pai e filho a emissão de notas fiscais referentes ao gado em valores inferiores da quantia real do preço ajustado.

"O valor correspondente às notas fiscais foi quitado mediante pagamento em 24 parcelas de R$ 50 mil cada; que Felipe comparecia ao Gabinete da Presidência do TCE/RJ para recolher o dinheiro ou na residência do colaborador (Jonas Lopes Júnior); que os recursos utilizados no pagamento em espécie do gado eram provenientes dos ativos auferidos ilicitamente em razão do cargo de Conselheiro do TCE/RJ", relatou.

Jonas Lopes Júnior disse na delação premiada que o velho cacique Jorge tinha conhecimento da origem ilícita dos recursos porque sabia especificamente que o colaborador ajustava o recebimento de vantagens indevidas para o Tribunal de Contas.

O ex-conselheiro narrou ainda uma segunda compra junto a família Picciani. Desta vez, afirmou, Felipe o procurou e disse que outra empresa de sua propriedade, de nome Agrocopa, iria vender seu plantel.

Notas

De acordo com Jonas Lopes Júnior, foi usado o mesmo modus operandi da primeira compra. O ex-presidente da Corte de Contas fluminense relatou que os recursos usados para aquisição do gado da Agrocopa também tinham origem ilícita.

"Não sabe afirmar se foram pagos pelo gado R$ 450 mil ou R$ 500 mil", afirmou. "As notas fiscais eram emitidas em valor inferior ao de fato devido; que registra que alguns animais foram adquiridos de forma correta, com registro na nota fiscal do valor efetivamente pago; que a diferença paga em espécie foi entregue a Felipe Picciani e André Monteiro, sócios da Agrocopa; que os pagamentos se deram no Gabinete da Presidência do TCE/RJ e também na residência do colaborador."

Para os investigadores da Cadeia Velha, a segunda compra é marcada pela iniciativa de Felipe, evidenciando que esse tipo de negócio faz parte da sua rotina, tanto é que sem qualquer pudor recolhia o dinheiro no próprio Tribunal de Contas do Estado do Rio.

"As circunstâncias não dão margens a dúvidas acerca da vontade de Felipe e Jorge Picciani colaborarem em operação de lavagem de recursos procedentes de corrupção por parte do conselheiro do TCE/RJ. Afinal, ambos concordaram em emitir nota fiscal abaixo do preço devido das mercadorias, bem como receber a diferença em espécie, além de Jorge Picciani estar a par do caráter venal do funcionário público com quem negociou, até porque participou de negociatas com ele em mais de uma oportunidade", afirma a Procuradoria da República na 2ª Região.

Os procuradores destacam que o sucesso de Jorge Picciani nos negócios está ligado à sua posição política. "O poder político aparece como o caminho para o enriquecimento pessoal, na medida em que quanto mais poder mais negócios", anota o Ministério Público Federal.

"Não por acaso foi escolhido pelo político um ramo de negócio propício a manipulações e acertos entre as partes, que se beneficia da tributação favorável dada ao setor agropecuário e, sobretudo, com pouco controle e fiscalização do Estado, tudo a dificultar o controle de lavagem de ativos por esse setor da economia, apesar das normas implementadas em 2012, para coibir tal prática em negócios com gado."

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