Funcionário da prefeitura de Porto Alegre higieniza região central da cidade: O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), unidade referência da covid-19, não tem mais respiradores adequados em meio à escalada da pandemia na capital gaúcha (Cesar Lopes/PMPA/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 7 de março de 2021 às 11h40.
Última atualização em 8 de março de 2021 às 09h22.
O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) não tem mais respiradores adequados e suficientes para o número de pacientes que atualmente necessitam do equipamento.
A unidade é referência para atendimento de casos da covid-19 no Rio Grande do Sul, estado que assiste a um recrudescimento sem precedentes da pandemia na última semana.
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O hospital está operando além da capacidade. De 105 leitos críticos inicialmente previstos para casos de pacientes com o novo coronavírus, o número já passou para 132, com 27 pacientes instalados em leitos extras no Centro de Tratamento Intensivo (CTI) e também na área da emergência. A taxa de ocupação, portanto, é de 126%.
O crescimento nos atendimentos fez com que a unidade, ligada à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), não conseguisse atender a demanda por ventiladores pulmonares, conhecidos por respiradores, equipamento que supre a necessidade de respiração em pacientes com pulmões comprometidos pela covid-19.
Hoje, o hospital usa respiradores de menor capacidade em parte dos pacientes com lesões pulmonares que demanda um modelo de maior capacidade, e também possui uma fila de espera para aqueles que estão em métodos não invasivos aguardando qualquer tipo de respirador.
O médico infectologista do Hospital de Clínicas Alexandre Zavascki, de 46 anos, disse que a situação tem feito com que pacientes aguardem a disponibilidade do equipamento mesmo já tendo indicação para serem intubados. “Temos pacientes que já teriam indicação, mas como não entraram em falência, eles ficam na enfermaria na modalidade possível. Há pacientes falecendo sem acesso ao ventilador”, relatou na noite deste sábado, 6.
Ele disse que a intensificação da doença no Estado ocorre de uma maneira “nunca antes vista”. “É uma aumento exponencial, com mudança completa da capacidade de atendimento do hospital, com necessidade de expansão rápida de leitos e recrutamento de novas equipes. Estamos usando muita criatividade para conseguir manter o atendimento diante da explosão de casos”, disse.
O Rio Grande do Sul está sob bandeira preta, o que representa risco altíssimo na avaliação do governo do Estado. A gestão do governador Eduardo Leite (PSDB) adotou novas medidas restritivas nesta semana para tentar frear a propagação do vírus, mas os efeitos ainda devem levar um tempo indeterminado para serem sentidos sobre os indicadores.
Neste sábado, 6, o Estado registrou 182 mortes pela doença, segunda maior marca local da pandemia, só atrás dos 184 da terça-feira, 2. Nos últimos sete dias, os óbitos chegaram a 1.027, segundo dados reunidos pelo consórcio de veículos de imprensa. Todas as 3 mil UTIs das cidades gaúchas estão ocupadas.
Em nota, o Hospital de Clínicas disse que nesse momento a demanda por respiradores “ultrapassa a capacidade de resposta hospitalar mesmo com realocações e compras emergenciais de equipamentos”. “O HCPA solicitou auxílio aos gestores municipais e estaduais para aquisição de equipamentos com características técnicas que atendam às necessidades dos pacientes com covid-19, e segue realizando esforços para suprir a demanda e garantir a assistência.”
A unidade explicou que tem 167 ventiladores para uso em adultos, dos quais 22 são ventiladores de anestesia, usados idealmente para curtos períodos de tempo, enquanto outros 145 são adequados para ventilação mecânica continuada. Um total de 105 ventiladores são considerados de alta performance.
No hospital, 185 pacientes estavam sendo atendidos na sexta-feira, 5, em leitos críticos (132 covid e 53 não covid), dos quais 109 estavam em ventilação mecânica. Entre os 53 classificados como não covid, 17 são de pacientes que já tiveram o novo coronavírus, não transmitem mais a doença, mas continuam se tratando.
Há ainda 34 pacientes em leitos de enfermaria com o chamado “suporte ventilatório não invasivo”. São pacientes que, segundo o hospital, “também deveriam estar em ambientes de tratamento crítico, que têm risco de apresentarem piora em seus quadros clínicos e necessitarem uso de ventilação mecânica.”
Entenda a estrutura do hospital e a atual demanda de pacientes com covid-19
Ventiladores disponíveis
- 22 de anestesia (usados geralmente em pacientes sem lesões pulmonares prévias e em casos de cirurgia com anestesia geral)
- 145 adequados para ventilação mecânica continuada. Entre eles, há 105 de alta performance, ideais para tratamento de pacientes com covid-19 em estado crítico.
Pacientes no Hospital de Clínicas
- 185 pacientes em leitos críticos, dos quais 132 diagnosticados com covid e 53 não covid. Entre os 53 considerados não covid, há um terço de pacientes que tiveram a doença, não propagam mais o vírus, mas ainda necessitam de tratamento intensivo por problemas causados pelo novo coronavírus.
- Entre os 185, há 109 em ventilação mecânica (74 em leitos críticos covid e outros 20 chamados covid não contaminantes, que não propagam mais o vírus, em outras áreas do hospital)
- 34 pacientes em leitos de enfermaria em suporte ventilatório não invasivo (pacientes que também deveriam estar em ambientes de tratamento crítico, que têm risco de apresentarem piora em seus quadros clínicos e necessitarem uso de ventilação mecânica)
“É importante ressaltar que os pacientes com covid-19 possuem doença pulmonar grave, necessitando de ventiladores de alta performance por longo período para que possam ser adequadamente tratados - aparelhos mais antigos ou mais simples, que são adequados para tratar pacientes sem patologia pulmonar, não são suficientes para a ventilação mecânica desses pacientes”, reforçou a administração do hospital.
Zavascki informou à reportagem que ventiladores de anestesia têm sido usados nos pacientes com quadro grave de covid-19. Isso é inadequado, segundo ele, porque esses aparelhos são projetados para servir a pacientes sem lesão pulmonar prévia e geralmente são designados para cirurgias com anestesia geral, onde funcionam por um breve período.
O médico fez uma analogia comparando os ventiladores de maior e menor capacidade com ferraris e fuscas, respectivamente. “A condição dos pacientes requer, para diminuir danos, ventiladores comparáveis a Ferraris. Colocar em ventilação inapropriada vai impactar na mortalidade”, disse, chamando atenção para o aumento na proporção pessoas mais jovens, de 20 a 40 anos, que estão recebendo atendimento na unidade.
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