Ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello em depoimento à CPI da Covid (Jefferson Rudy/Agência Senado)
Alessandra Azevedo
Publicado em 20 de maio de 2021 às 18h53.
Última atualização em 24 de maio de 2021 às 10h58.
Em dois dias de depoimento à CPI da Covid, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello se recusou a assumir responsabilidade por erros durante os 10 meses que esteve à frente da pasta, em meio à pandemia de covid-19. Para ele, a origem da maioria dos problemas apontados pelos senadores não era o Ministério da Saúde, muito menos o Palácio do Planalto.
Questionado por mais de 20 senadores entre quarta-feira, 19, e quinta-feira, 20, o general disse que o ministério não comprou “nenhum comprimido” de cloroquina para tratamento de covid-19, que não ignorou a Pfizer quando a empresa ofereceu vacinas ao Brasil em 2020 e que a responsabilidade pela crise no Amazonas foi da secretaria de saúde do estado e da fornecedora de oxigênio, White Martins, não do governo federal.
Já os governadores levaram a culpa pela propagação do vírus em épocas festivas, apesar de o próprio presidente Jair Bolsonaro ter desencorajado medidas de isolamento social em vários momentos. “O desconhecimento dos riscos da pandemia levou alguns gestores a manterem e incentivarem o carnaval em 2020”, disse Pazuello. O presidente, segundo ele, “em momento algum” se posicionou contra o distanciamento social.
A falta de conhecimento sobre as variantes do vírus que circulavam no fim do ano passado também “permitiu às autoridades estaduais e municipais conduzirem os processos eleitorais e as festas de final de ano”, acrescentou o ex-ministro, que garantiu também sempre ter sido a favor de medidas de proteção, como uso de máscaras.
No caso da vacina da Pfizer, segundo Pazuello, o problema não foi desinteresse do governo, mas o fato de que a empresa tinha cláusulas “assustadoras” no contrato. Em uma das várias vezes que foi questionado sobre o assunto, ele deixou claro que Bolsonaro não teve nada a ver com a recusa em fechar acordo com a Pfizer -- mais uma tentativa de blindar o presidente.
Nas quase 14 horas de depoimento, Pazuello tentou não só se livrar de acusações, mas também proteger o presidente e até os filhos dele, com quem assegurou ter se encontrado “pouquíssimas vezes” ao longo dos 10 meses como ministro. “Não havia nenhuma influência dos três filhos políticos do presidente”, assegurou, em referência a Carlos, Flávio e Eduardo.
Várias falas se contrapõem a depoimentos anteriores ao dele, como de Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, que o precederam no ministério. Além de ter dito que não sabe de nenhum “assessoramento paralelo” em relação à covid, como apontou Mandetta, Pazuello garantiu que Bolsonaro não o pressionou pela indicação de cloroquina -- a insistência na recomendação do medicamento foi um dos motivos para que Teich deixasse o cargo.
Perguntado sobre cloroquina, o ex-ministro voltou a fugir da responsabilidade e lembrou que é “prerrogativa dos médicos” a prescrição de medicamentos off-label. Apesar de ter confirmado que o governo distribuiu o remédio, ele ressaltou que foi a pedido dos estados. “Eu não fomentei o uso da hidroxicloroquina. Eu mandei distribuir tudo o que me foi pedido. Se o estado pedir e eu tenho, eu entrego”, disse.
Senadores lembraram que o Ministério da Saúde lançou uma nota informativa sobre o uso do medicamento, em 20 de maio, quando Pazuello já estava à frente da pasta. Segundo o ex-ministro, o documento estava em conformidade com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e não recomendava o uso, apenas orientava os médicos, caso eles fossem prescrever o medicamento.
Mesmo diante de vídeos e evidências apresentadas por senadores em sentido contrário, Pazuello negou qualquer interferência de Bolsonaro na condução do ministério. “Em nenhum momento o presidente da República me desautorizou ou me orientou a fazer qualquer coisa diferente do que eu estava fazendo. As ações foram todas minhas", afirmou.
Integrantes da CPI o acusaram de mentir e lembraram de pelo menos uma vez em que ele foi desautorizado por Bolsonaro: em outubro, quando o presidente ordenou que a compra da vacina CoronaVac fosse cancelada, um dia depois que o ex-ministro anunciou acordo para a aquisição de 46 milhões de doses de imunizantes. "Um manda, outro obedece", disse o ex-ministro, em live ao lado do presidente, logo após o ocorrido.
Pazuello também deu declarações controversas sobre assuntos como o aplicativo TrateCov, que indicava cloroquina e ivermectina a pessoas com sintomas de covid-19, inclusive grávidas e crianças, e a crise de oxigênio em Manaus. Em relação ao aplicativo, ele negou que tenha sido oficialmente lançado -- o que aconteceu em 19 de janeiro deste ano, com a presença dele.
Sobre Manaus, Pazuello se contradisse. No depoimento, ele afirmou ter sido avisado a respeito da falta de oxigênio em 10 de janeiro. Mas, em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Advocacia-Geral da União (AGU) diz que o Ministério da Saúde foi avisado em 8 de janeiro. O governo do Amazonas avisou que a situação estava "no limite" em 6 de janeiro.
Senadores também reclamaram quando Pazuello disse que não ignorou a Pfizer em relação a ofertas de vacinas ao Brasil. "Nós respondemos a Pfizer inúmeras vezes. Nunca fechamos a porta", afirmou. A fala vai de encontro com o que disse Carlos Murillo, ex-presidente da Pfizer no Brasil, em depoimento à CPI. O executivo afirmou que o governo brasileiro rejeitou ou ignorou ofertas de vacinas contra a covid-19 seis vezes.