Mortalidade infantil no Brasil: a diferença na queda anual da mortalidade infantil foi de 0,027 ponto percentual entre cidades que elegeram mulheres e cidades que elegeram homens (Ricardo Funari/Getty Images)
Clara Cerioni
Publicado em 7 de julho de 2020 às 17h06.
Última atualização em 7 de julho de 2020 às 17h32.
A importância da participação de mais mulheres na política é tema constante de debates eleitorais no Brasil. Até hoje, apesar de serem maioria na sociedade brasileira (51,9%), elas ocupam apenas 12,32% dos 70.000 cargos eletivos, de acordo com um estudo recente da Procuradoria da Mulher no Senado.
Além da própria questão da representatividade, outro efeito da escolha de mulheres para assumir cargos políticos é a redução dos índices de mortalidade infantil dos municípios do país. Essa é a conclusão de uma pesquisa, publicada na revista científica Health Affairs, conduzida por pesquisadores da Universidade Federal da Bahia, Unicamp, Universidade dos Andes, em Bogotá, e do Banco de Desenvolvimento Interamericano.
Para chegar nos resultados, os pesquisadores cruzaram dados de representatividade feminina em cargos de prefeita, deputada estadual e federal com índices de mortalidade infantil entre 2000 e 2015 de 3.167 municípios brasileiros. As cidades foram escolhidas por terem um sistema de registro de falecimento preciso, com baixa subnotificação.
Em um panorama geral, o estudo descobriu que a mortalidade entre crianças com menos de 5 anos, para cada 1.000 nascidos vivos, caiu de 25,1% em 2000 para 13,6% em 2015 nos municípios da amostra. Nesse mesmo período, a porcentagem de prefeitas eleitas aumentou de 4,5% para 9,7% nessas cidades.
A associação de maior representatividade feminina com redução da mortalidade infantil foi identificada com precisão nos municípios que, de fato, elegeram prefeitas. A diferença na queda anual da mortalidade infantil foi de 0,027 ponto percentual entre cidades que elegeram mulheres e cidades que elegeram homens.
"Embora vários estudos anteriores tenham encontrado correlações positivas entre mais mulheres na política e saúde infantil, uma de nossas principais conclusões é que essa associação não é apenas a nível nacional ou estadual, mas também em nível local", escrevem os pesquisadores.
Os pesquisadores fizeram uma série de ajustes de variáveis que pudessem interferir no resultado, como variável de pobreza, acesso ao saneamento básico, nível educacionais dos adultos e alfabetização de mulheres. O resultado seguiu o mesmo.
Além da mortalidade infantil, a análise dos dados concluiu também que nesse mesmo período de crescimento de eleição feminina, a cobertura média do programa Bolsa Família aumentou de 9,6% em 2000 para 15,3% em 2015 nos municípios. Já a ampliação da Estratégia da Saúde da Família cresceu de 25,2% para 54,7% no mesmo período analisado.
No nível municipal, o aumento da cobertura do Bolsa Família e da Estratégia da Saúde Família também está fortemente associado à redução da mortalidade de menores de 5 anos. Em média, o aumento de 1% na cobertura do programa de transferência de renda diminuiu 1% a morte de crianças. Já a alta de 1% da cobertura de saúde familiar reduziu 0,8% a mortalidade infantil.
Os pesquisadores argumentam que há na literatura acadêmica evidências robustas de que as políticas mulheres são geralmente mais propensas do que os homens a apoiar programas sociais. "Isso representa um caminho plausível sobre como maior representatividade das mulheres pode afetar a saúde infantil no Brasil", escrevem.
Ana Clara Duran, uma das pesquisadoras do estudo, avalia que esses resultados podem impulsionar os eleitores brasileiros a eleger mais mulheres com base em evidências. "Saúde é uma das maiores necessidades da população brasileira e essa pesquisa mostra que se os eleitores quiserem melhorar essa área, eles deveriam votar mais políticas e isso independe do espectro político", diz Duran, que é da Unicamp.