Lista: cerca de 15 mil brasileiros formados em universidades fora do país aguardam a liberação. (Alexandre Schneider/Getty Images)
Clara Cerioni
Publicado em 20 de abril de 2020 às 08h00.
Última atualização em 20 de abril de 2020 às 16h40.
Em meio à pandemia do coronavírus (causador da covid-19) no Brasil, a capacidade do corpo médico disponível conseguir atender à demanda crescente é um dos pontos de grande preocupação. Somente em São Paulo, 1.557 profissionais de saúde foram afastados por estarem com suspeita ou infectados pelo vírus.
Para colocar no mercado, segundo estimativas do governo, até 15 mil médicos, surgiu na Câmara dos Deputados um projeto, ainda sem data de votação, que pretende acelerar o processo do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeira (Revalida).
O autor da proposta, o deputado Jorge Solla (PT-BA), explica que o objetivo do projeto é validar os diplomas em até 30 dias. "Estamos vivendo a maior crise sanitária mundial dos últimos 100 anos. Não vamos resolver em 30 dias, mas neste tempo vamos precisar desses profissionais", disse o parlamentar em entrevista à EXAME.
O Revalida foi criado em 2009 e teve a primeira edição em 2011. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) é o responsável pela aplicação do teste. Em 2017 foi realizada a última edição e o processo ainda não foi concluído.
No ano passado, foi aprovado no Congresso um projeto regulamentando o exame. O processo seria feito duas vezes por ano, uma em cada semestre, e em duas etapas: prova teórica e prática. O custo aproximado seria de 3.600 reais, pago pelo candidato.
O texto original dizia que universidades públicas e privadas poderiam aplicar os testes, mas a parte das instituições privadas foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro.
O deputado Solla sugere que o governo federal edite um novo chamamento do Mais Médicos e use o programa para avaliar a parte prática os profissionais, acelerando o Revalida. "A lei não impede que isso seja feito", diz Solla. Ele ainda complementa que o projeto não gera custos ao governo, uma vez que quem paga pela prova é o profissional que quer validar o diploma.
Procurado pela EXAME, o Inep informou que "trabalha com a formação de banca de especialistas para escolha das questões e a definição do cronograma de aplicação do exame 2020". Mas, por enquanto ainda não há previsão de quando o processo será feito.
Para alguns especialistas, fazer a prova teórica em até 30 dias é viável, o problema seria a prova prática.
Para o médico e professor do Centro Universitário Max Planck, em Indaiatuba (SP), Roberto Padilha, com uma força-tarefa seria possível fazer e corrigir a prova. "Temos capacidade e tecnologia para isso", diz ele que atuou por mais de dez anos como diretor de ensino e pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, responsável pela prova de residência médica.
"A segunda fase não é possível fazer tão rápido. Ainda mais se estamos pensando em colocar os profissionais no combate ao coronavírus. Neste processo é necessário mobilizar muitos laboratórios com a finalidade de simular o ambiente de trabalho", avalia Padilha.
Paralelo ao texto da Câmara, há um projeto de lei no Senado que autoriza médicos brasileiros com diplomas estrangeiros a exercerem a profissão enquanto durar o estado de calamidade. A proposta, do senador Telmário Mota (PROS/RR), dispensa a revalidação.
A Associação Médica Brasileira emitiu nota contrária ao projeto. "O Brasil possui quase 500 mil médicos, que são verdadeiros guerreiros, à disposição e capacitados para combater a covid-19 de forma segura e ética", diz o texto.
No começo de abril, o Departamento de Estado dos Estados Unidos emitiu um comunicado dando urgência à emissão de vistos de trabalho para médicos estrangeiros.
A norma estabelece que pedidos já aprovados mas que ainda dependem da entrevista consular, devem ser agilizados por conta da pandemia do coronavírus. Todas as entrevistas em consulados e embaixadas estão suspensos e só são feitas em casos de emergência.
Já o governo francês aceitou a ajuda de médicos cubanos para suprir a falta de profissionais nos territórios ultramarinos. Segundo a RFI, eles vão atuar nas ilhas de Martinica, Guadalupe, Saint-Pierre e Miquelon, além da Guiana Francesa. A Itália, um dos países com maior número de casos no mundo, também já aceitou a ajuda de médicos cubanos.
Na Inglaterra, centenas de refugiados pediram ao parlamento que autorize os profissionais a exercerem a medicina. Muitos deles, oriundos da Ásia e da África, têm experiências em pandemias.
Em entrevista ao The Guardian, o secretário de Estado da Saúde Matt Hancock disse que vai avaliar o ingresso dos médicos no NHS (o sistema público de saúde inglês) durante a crise sanitária.