Linha 4: (ViaQuatro/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de fevereiro de 2017 às 19h42.
São Paulo - Cópias de dois e-mails trocados entre dirigentes do Metrô de São Paulo e do consórcio espanhol Corsan Corviam revelam suspeitas de pagamentos superfaturados de mais de R$ 9 milhões referentes a trechos de obras da Linha-4 Amarela realizadas em 2014.
A investigação do Ministério Público Estadual (MPE) mostra que, naquele ano e em 2015, as construções ficaram completamente paradas. Mesmo assim, a estatal fez pagamentos milionários à empresa. Os desvios chegam a R$ 47,8 milhões.
Em um e-mail enviado pelo então coordenador de medição da empreiteira Renato dos Santos Figueiredo ao Metrô no dia 5 de fevereiro de 2014, a Corsan encaminha o resultado da medição 19, referente ao que foi feito no canteiro e obras no mês de janeiro daquele ano pedindo aprovação no valor de R$ 3,19 milhões.
No dia 14 de fevereiro, o chefe de departamento de obra civil do Metrô, Mauro Monteiro, responde dizendo "liberado para faturamento" o valor de R$ 6,41 milhões referente à mesma medição 19 de janeiro de 2014, ou seja, mais do que o dobro do valor apontado pela empreiteira.
Em outro e-mail, trocado em junho de 2013, o valor apontado pela Corsan foi de R$ 1,68 milhão referente à medição de número 11, mas o Metrô autorizou pagamento de R$ 2,62 milhões, 56,1% a mais.
Segundo relatório elaborado pelos promotores Cassio Conserino e Fernando Henrique de Moraes Araújo, responsáveis pela investigação, foram identificados 29 irregularidades e 50 funcionários do Metrô e do consórcio devem ser investigados.
Há suspeita de prática de vários crimes como fraude em licitação, peculato (corrupção praticada por funcionário público), corrupção ativa e passiva, falsidade ideológica, falsificação de documentos, apropriação indébita previdenciária, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Os promotores encaminharam a documentação para a Procuradoria Geral da República, pois há indícios de prática de crimes federais.
Cabe ao procurador Rodrigo Janot decidir se o MPE prossegue com as investigações ou se encaminha o caso para o Ministério Público Federal.
Pagamentos
A investigação anexou uma série de documentos sobre as fraudes, como comprovantes de pagamentos feitos pelo Metrô por serviços não prestados, papéis que indicam sonegação de impostos, provas de saques em dinheiro na boca do caixa, além de e-mails trocados entre os gerentes da estatal e do consórcio que indicam o superfaturamento nas medições da evolução física da obra.
Parte da documentação foi obtida a partir de uma denúncia anônima, que também motivou a abertura do inquérito.
Em um dos casos, a investigação aponta que as obras do trecho 2 da Linha 4 (Estação Vila Sônia e extensão) pararam totalmente a partir de novembro de 2014, mas já não tinham nenhuma evolução física desde agosto daquele ano.
Mesmo com o canteiro completamente paralisado, foram repassados pelo Metrô ao consórcio R$ 12,6 milhões, segundo os promotores.
O contrato com a Corsan Corviam foi assinado em 2012. De acordo com o MPE, desde novembro de 2013 o trecho 2 "andou" apenas 3%, mas o Metrô desembolsou R$ 55,3 milhões, valor que correspondia a 14,3% do custo total.
Já na Estação São Paulo-Morumbi, as obras pararam em março de 2014, mas continuaram recebendo repasses por mais de um ano, ainda segundo o relatório da Promotoria.
"Foram feitas 16 medições após a interrupção. Constatamos pelo menos 11 repasses que totalizaram R$ 8,5 milhões. No mês de março de 2015, houve um pagamento de mais de R$ 1,4 milhão para obras no trecho - parado há mais de um ano."
O Metrô de São Paulo afirmou, em nota, que não teve acesso ao inquérito criminal aberto pelo Ministério Público Estadual, mas destacou que as duas licitações vencidas pelo consórcio Corsan Corivam, em 2012, para as obras da fase 2 da Linha 4-Amarela "seguiram as severas regras de compliance do Banco Mundial", órgão internacional que financiou parte da construção e possui regras próprias para as contratações.
O Metrô alega ainda que "mesmo nos casos de redução do ritmo das obras e até paralisação está previsto em contrato a responsabilidade da contratada de manutenção e segurança patrimonial dos canteiros de obras e principalmente das atividades imprescindíveis para a segurança física das escavações e estruturas paralisadas".
A companhia ressalta que o contrato com o consórcio espanhol foi rescindido unilateralmente em setembro de 2015 por "abandono da obra, não atendimento das normas de qualidade, segurança do trabalho e meio ambiente e ausência de pagamento das subcontratadas".
Foram aplicadas multas de R$ 23,4 milhões à Corsan Corviam, que perdeu uma ação na Justiça para tentar suspender a sanção.
A empresa Corsan Corviam afirmou, em nota, ter ficado "surpresa" com a investigação e diz que nunca foi procurada nem intimada para prestar esclarecimentos sobre o caso.
Ela informou ainda que "está segura de que não cometeu nenhuma irregularidade durante o período em que permaneceu como responsável pelas obras".