Aliados: reconhecem que Aécio deve renunciar à presidência da legenda, mas esperam uma "saída honrosa" (Nacho Doce/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 17 de julho de 2017 às 09h43.
Última atualização em 17 de julho de 2017 às 12h53.
A pressão desencadeada pelo prefeito João Doria pela saída definitiva e imediata do senador Aécio Neves (MG) da presidência do PSDB agravou ainda mais a crise no partido, que está dividido entre permanecer ou deixar o governo Michel Temer. Os tucanos enfrentam agora outro racha, desta vez envolvendo a realização de uma convenção nacional tucana e a mudança da configuração de sua Executiva.
Parte da cúpula partidária avalia que Doria se excedeu ao defender publicamente, anteontem, durante um evento na capital, a saída de Aécio "desde já" da presidência do PSDB. O prefeito também pediu mudanças na Executiva da legenda para acomodar um representante dos prefeitos eleitos em 2016 e indicou para a vaga o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando.
Até aliados de Aécio reconhecem que o senador deve renunciar à presidência da legenda, mas esperam uma "saída honrosa". Por isso, dizem acreditar que as declarações do prefeito dificultam o diálogo interno.
"João Doria é um prefeito desfocado. A cidade está piorando, os buracos aumentando, os faróis estão quebrados, o capim aumentando e ele desconhece isso. Fica brigando com o Lula e nomeando gente na Executiva. Esse cara está delirando. Precisa focar na Prefeitura e mostrar resultado. Tem gente tão ou mais competente do que ele pensando no Brasil", disse o ex-senador José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela.
Aníbal é um dos mais próximos interlocutores de Aécio na cúpula tucana. O senador mineiro se licenciou da presidência do PSDB após a divulgação de um áudio no qual foi flagrado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da JBS, para pagar custos de sua defesa na Operação Lava Jato.
O conteúdo da gravação está nas delações do Grupo J&F, que controla a JBS. O senador também foi afastado, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, das funções parlamentares, retomadas após decisão do ministro Marco Aurélio Mello. Aécio manteve, entretanto, o cargo de "presidente licenciado".
A resposta do prefeito a Aníbal veio por meio do secretário adjunto das Prefeituras Regionais, Fábio Lepique. "Nunca convivi com alguém tão focado na cidade como o João. Mas, como líder político que é, sei que pensa um partido acima de interesses menores ou pessoais. Para ele, o Brasil está acima das boquinhas, sejam de governo, sejam de partido", afirmou.
Configuração
Idealizada pelo deputado Silvio Torres (SP), secretário-geral do PSDB e aliado do governador Geraldo Alckmin, a proposta de mudar a estrutura da Executiva em uma convenção nacional, marcada para agosto, tem o apoio de parte dos prefeitos tucanos, entre eles Nelson Marchezan, de Porto Alegre, e Morando.
O senador tucano Tasso Jereissati (CE), que simpatiza com a tese, tentou duas vezes convocar a Executiva do PSDB em Brasília para formatar a convenção, mas esbarrou na relutância de parte da legenda.
O grupo de Aécio resiste à ideia de uma mudança total do comando partidário, que viria acompanhada de uma "autocrítica" e "atualização do programa" da legenda. O meio-termo encontrado foi a realização, em agosto, de uma reunião ampliada com todos os membros do Diretório Nacional do PSDB. Nesse encontro, Tasso seria efetivado presidente do partido, e Aécio se afastaria.
Em seguida, o partido começaria um processo de convenções municipais e estaduais que elegeriam os delegados da reunião nacional. Só então, provavelmente entre outubro e novembro, é que haveria mudanças mais amplas no partido. "Não é o momento agora de se discutir espaços para cargos. Isso só vai acontecer após a posse do novo presidente do partido", disse Torres.
O pano de fundo da disputa interna na legenda é a vaga de candidato do PSDB à Presidência da República em 2018. A atual Executiva do partido foi composta por Aécio em maio de 2013, quando ele foi eleito presidente do PSDB e já era pré-candidato ao Palácio do Planalto para a disputa de 2014.
Mesmo após a derrota para Dilma Rousseff no ano seguinte, o senador mineiro continuou comandando a máquina partidária. Em dezembro de 2016, renovou o próprio mandato e de toda a Executiva até maio de 2018, o que irritou aliados de Alckmin. Procurado por meio de sua assessoria, Aécio não quis se manifestar.
O acirramento da disputa interna ocorre no momento em que a maioria dos deputados tucanos e o próprio presidente Tasso Jereissati pressionam a sigla a entregar os cargos no governo Temer. "O PSDB está se suicidando, como o antigo PFL. Está entregando o futuro do País nas mãos da Procuradoria-Geral da República", avaliou o professor da USP José Augusto Guilhon-Albuquerque.
Já o cientista político Rafael Cortez, analista da Tendências Consultoria, disse que a saída seria inócua. "Sair neste momento não significa para o PSDB o descolamento da imagem de Temer. A associação com o governo já está consumada." (Colaborou Alberto Bombig)