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Doenças causadas pela falta de saneamento afasta 6 milhões de crianças da escola, aponta estudo

Estudo inédito revela impacto da falta de saneamento na saúde e no desenvolvimento escolar de crianças e adolescentes

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 10 de outubro de 2024 às 00h01.

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Mais de 6 milhões de crianças de até seis anos se afastam de suas atividades escolares e sociais por doenças ligadas à falta de saneamento básico, segundo o estudo inédito "Futuro em risco: os impactos da falta de saneamento para grávidas, crianças e adolescentes", do instituto Trata Brasil. O número equivale à população do Paraguai.

Os dados consideram a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na época, a população de crianças no país de até seis anos era de 18,3 milhões, o equivalente a 361,8 casos de afastamento por doenças a cada mil crianças naquele ano.

Com isso, 4 a cada 10 crianças com idade até 6 anos se afastaram de suas atividades rotineiras em razão de diarreias e doenças transmitidas por insetos e animais.

O estudo mostra que o afastamento por doenças de veiculação hídrica foi influenciado pelos hábitos sociais, como a maior frequência em creches e pré-escolas, o que eleva a exposição das crianças a vírus que se propagam mais rapidamente com o contato social, como o Rotavírus, por exemplo.

No caso das doenças respiratórias, observa-se um crescimento da taxa de incidência conforme aumenta a faixa etária. Em 2019, houve 23,6 milhões de afastamentos por doenças respiratórias nessas crianças. Esse número superou a população de 18,3 milhões de crianças, indicando que, em média, cada criança ficou afastada mais de uma vez ao longo do ano devido a gripes e pneumonias. A maior frequência em creches e pré-escolas também eleva a exposição das crianças a gripes.

O levantamento mostra que o aumento do acesso à coleta de esgoto está diretamente ligado à redução das taxas de incidência de internações pelos dois tipos de doenças. De 2010 a 2022, o país viu sua taxa de cobertura se elevar em mais de 10 pontos percentuais, enquanto a taxa de incidência de internações caiu 12,5 pontos, resultado de 8,6 pontos de queda nas internações por doenças de veiculação hídrica e 3,9 pontos de queda nas doenças respiratórias.

Faixa etáriaDoenças por veiculação hídrica*  (casos por mil crianças)Respiratória (casos por mil crianças)
Menor de 1 ano188,2546,4
De 1 a 2 anos361,81.258,90**
De 3 a 6 anos451,71.475,50**
Média (0 a 6 anos)359,21.293,50**

*Doenças por veículação hídrica são enfermidades causadas por água parada ou contaminada: dengue, cólera, diarreia e etc.

** Cada criança ficou afastada mais de uma vez ao longo do ano devido a gripes e pneumonias

Impacto no desempenho escolar

O estudo relaciona que o afastamento das atividades escolares por doenças relacionadas à falta de saneamento traz prejuízos ao desenvolvimento escolar das crianças.

Segundo o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) de 2021, que mediu o desempenho escolar dos alunos do 5º ano do ensino fundamental, a maioria com idade entre 10 e 11 anos, o grupo de alunos sem água tratada na rua obteve uma nota em língua portuguesa 20,9 pontos (em uma escala de 100 pontos) inferior à do grupo com água tratada. Na prova de matemática, a diferença foi semelhante, de 19,1 pontos entre os dois grupos.

Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, destaca a gravidade do cenário: “Os efeitos da falta de infraestrutura adequada são catastróficos no curto, médio e longo prazo, colaborando para a perpetuação de um ciclo de subdesenvolvimento que não é o que queremos para o nosso país. Somente priorizando o tema na agenda pública reverteremos essa situação.”

No caso da disponibilidade de banheiro, nota-se que o grupo sem essa comodidade teve, em média, uma nota em língua portuguesa 45,5 pontos inferior à do grupo com acesso a banheiro. Na prova de matemática, a diferença foi menor, mas ainda expressiva: 39,5 pontos.

No caso de adolescentes, o estudo aponta que os afastamentos começam a comprometer o potencial de desenvolvimento profissional ao longo da vida.

De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, na população de adolescentes houve cerca de 5 milhões de afastamentos por doenças de veiculação hídrica ao longo daquele ano. Dada a população de 24,9 milhões de adolescentes no país, esse número equivale a 202,6 casos de afastamento por doenças de veiculação hídrica a cada mil adolescentes naquele ano.

Em outras palavras, aproximadamente 2 a cada 10 adolescentes com idade entre 12 e 19 anos se afastaram de suas atividades rotineiras em razão de diarreias e doenças transmitidas por insetos e animais.

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