Brasil

Dilma mira empresas de Internet após espionagem dos EUA

Presidente está apoiando uma nova legislação que buscará forçar companhias como Google e Facebook a armazenarem dados coletados localmente dentro do Brasil


	Manifestante durante protesto em apoio a Snowden: denúncias do ex-agente apontam que os EUA monitoraram emails, telefonemas e outras comunicações do Brasil
 (Kai Pfaffenbach/Reuters)

Manifestante durante protesto em apoio a Snowden: denúncias do ex-agente apontam que os EUA monitoraram emails, telefonemas e outras comunicações do Brasil (Kai Pfaffenbach/Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 12 de setembro de 2013 às 19h27.

São Paulo - Irritada com denúncias de que o governo dos Estados Unidos espionou a ela e a outros brasileiros, a presidente Dilma Rousseff está apoiando uma nova legislação que buscará forçar Google, Facebook e outras empresas de Internet a armazenarem dados coletados localmente dentro do Brasil.

A exigência será de difícil execução, segundo especialistas em tecnologia, dados os altos custos e a natureza global da Internet. Ainda assim, a iniciativa de Dilma é o sinal tangível mais recente do abalo provocado pelas revelações de que a Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) monitorou emails, telefonemas e outras comunicações no exterior.

A lei, que está sendo elaborada por um parlamentar do PT e deve estar completa na semana que vem, forçaria empresas de Internet com sede no exterior a manterem data centers dentro do Brasil que seriam então regulamentados pelas leis brasileiras de proteção à privacidade, disseram autoridades.

As empresas de Internet que operam no Brasil podem atualmente colocar data centers onde quiserem. O Facebook, por exemplo, armazena seus dados nos Estados Unidos e em novo complexo inaugurado na Suécia.

Dilma acredita que esta mudança ajudaria a proteger os brasileiros da espionagem norte-americana em suas atividades, e a presidente está considerando fazer um apelo para que outros países adotem uma medida parecida em seu discurso na abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) no fim deste mês, disse uma autoridade do governo brasileiro à Reuters.

"Esse seria o momento da virada para essas companhias", disse a autoridade, citando Facebook, Google e Microsoft como exemplos, embora elas não sejam as únicas empresas que podem ser afetadas. "Se você quiser operar aqui, terá de obedecer nossas regras." A fonte falou em condição de anonimato para que pudesse discutir abertamente os planos de Dilma e as consequências da lei.


O projeto de lei surge depois de uma série de denúncias da imprensa, baseadas em documentos vazados pelo ex-prestador de serviços da NSA Edward Snowden, que está atualmente em asilo na Rússia.

Embora o Brasil seja apenas um dos vários alvos apontados da espionagem norte-americana, as revelações aqui foram especialmente polêmicas por causa da desconfiança de longa data em relação às atividades das agências de espionagem dos Estados Unidos e de uma reportagem que afirmou que as comunicações privadas de Dilma foram comprometidas.

O deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), foi convidado para encontrar Dilma no Palácio do Planalto na terça-feira para discutir com ela, ministros e assessores do alto escalão o projeto de lei.

Molon pressiona desde 2012 para que o Congresso aprove o chamado Marco Civil da Internet. A lei criaria o primeiro marco legal para os direitos dos usuários online e, entre outras exigências, forçaria as redes sociais a apagar os dados dos usuários quando eles encerram seus perfis.

Segundo o assessor de imprensa de Molon, Leonardo Santos, Dilma pediu ao parlamentar que acrescente no projeto de lei a exigência da instalação de data centers no Brasil.

Após a reunião com Molon, o governo publicou no Diário Oficial pedido para que o projeto de lei tramite em regime de urgência no Congresso Nacional, o que significa que a proposta teria 45 dias para ser votada na Câmara.

Difícil, mas pode não ser impossível

As propostas de mudanças são "difíceis, como elas (as empresas) dizem, mas não sei se são impossíveis", disse Santos.


O assessor de Molon se recusou a dar mais detalhes sobre o projeto de lei, sobre quais tipos de dados seriam afetados pela lei ou quais categorias de empresas estariam sujeitas às exigências, alegando que esses pontos ainda estão sob estudo.

Representantes de Google, Facebook e Microsoft não responderam imediatamente os pedidos de comentários.

Alguns países europeus já exigem que alguns dados pessoais sensíveis sejam armazenados localmente. Microsoft, Amazon e outros grandes provedores de serviços de computação remotos já possuem data centers nesses países, então seus clientes podem cumprir essas regras locais.

As redes sociais podem ser mais difíceis de regular. Se um usuário do Facebook no Brasil comentar o post de um amigo francês, por exemplo, não está claro se os dados ficariam no Brasil.

Dependendo das especificidades da lei, o impacto nas empresas "pode ser realmente grande", disse Dennis Julian, especialista em data center do Integrated Design Group, em Boston.

"A questão é quão longe você vai com isso", afirmou.

Julian disse que a tendência recente tem sido na direção das empresas se consolidarem em alguns poucos data centers em vez de uma série de data centers pequenos. Isso se deve aos altos custos --grandes data centers podem custar centenas de milhões de dólares, disse ele-- e aos problemas em encontrar trabalhadores qualificados para o serviço e a manutenção.

Estudos apontam que a construção de data centers no Brasil é mais caro e logisticamente difícil do que em qualquer outro lugar.


Um relatório de 2012 da empresa imobiliária Cushman & Wakefield e da consultoria em engenharia hurleypalmerflatt elencou os 30 países em termos de riscos para operações de data centers. O Brasil ficou em último lugar, devido principalmente aos altos custos de eletricidade, baixos níveis educacionais e um ambiente ruim para os negócios.

No entanto, como maior economia da América Latina e casa de alguns dos mais frequentes usuários de redes sociais, o Brasil pode ser grande demais para que as empresas simplesmente saiam dele porque não gostaram da lei.

Enquanto isso, a taxa de penetração da Internet no Brasil é de apenas 44 por cento --metade da dos Estados Unidos--, o que significa que ainda há muito potencial para crescimento.

A proposta de lei é uma das várias respostas de Dilma às denúncias de espionagem.

Ela exigiu uma explicação detalhada de Washington sobre a amplitude da espionagem realizada pelos Estados Unidos sobre o Brasil, e disse que, caso isso não ocorra, ela pode cancelar uma visita de Estado que tem marcada para Washington no mês que vem.

O governo Dilma tem rejeitado até agora o argumento de Washington de que coletou informações para se proteger de ameaças à segurança nacional norte-americana. O Brasil é uma democracia pacífica sem histórico de terrorismo internacional e sem acesso a armas de destruição em massa.

A fonte do governo brasileiro expressou a crença de que o Marco Civil da Internet vai não só funcionar, como outros países vão seguir esses passos, citando como exemplo os demais membros dos Brics --China, Índia, Rússia e África do Sul.

"Quando fizermos isso, se tornará padrão", disse a fonte.

Acompanhe tudo sobre:Dilma RousseffEspionagemNSAPersonalidadesPolítica no BrasilPolíticosPolíticos brasileirosPT – Partido dos Trabalhadoresseguranca-digital

Mais de Brasil

Após investimentos de R$ 3 bi, Tamoios terá free flow e percurso 30 minutos mais rápido

Emmanuel Macron é visto caminhando por Copacabana após chegar ao RJ para o G20

Congresso deve finalizar até esta terça votação de projeto que muda regras de emendas parlamentares