A candidata Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula durante caminhada em Recife (Ricardo Stuckert/Instituto Lula/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 24 de outubro de 2014 às 15h36.
Brasília - Há quatro anos, a imagem de gestora competente e a participação onipresente de Luiz Inácio Lula da Silva na campanha foi suficiente para eleger Dilma Rousseff (PT) presidente da República, sem nunca ter disputado uma eleição pública.
A fama de técnica eficiente no comando dos Ministérios de Minas e Energia e da Casa Civil sofreu um grande estrago ao longo de seu mandato, tanto pelo fraco crescimento da economia, como pelos escândalos de corrupção, especialmente o da Petrobras.
Hoje, a presidente é retratada, até por aliados, como uma comandante muito apegada a detalhes, que intervém exageradamente na economia, dialoga pouco e que foi politicamente inábil para realizar as reformas necessárias ao país.
Na disputa atual, a candidata tentou se apresentar como a presidente que merece mais quatro anos para manter e aprofundar o modelo petista, deixando um pouco de lado a face de grande gestora e tentando provar que sua imagem de durona e intransigente ficou mais suave desde 2010.
Um dos estrategistas campanha atual acredita que Dilma aprendeu algumas lições nesses quase quatro anos na Presidência. "No fundo, ela está mais madura", disse à Reuters sob condição de anonimato.
Um ministro do governo avalia que Dilma, de 66 anos, já mudou e isso ocorreu depois das manifestações de junho de 2013, quando milhares de pessoas foram às ruas para protestar, principalmente, contra a qualidade dos serviços públicos.
À época, Dilma perdeu parte da força quando sua popularidade despencou de um pico de 65 por cento de avaliação de ótimo e bom do governo - registrado pelo Datafolha em março de 2013 - para 30 por cento após as manifestações.
O alto índice de aprovação havia dado força política a Dilma, mas também a tinha isolado das críticas e conselhos.
"Ali a presidente entendeu que precisava se abrir, dialogar mais com os políticos, com os movimentos sociais", disse o ministro, sob a condição de anonimato.
No seu entorno, porém, nem todos acreditam que o mandato serviu de experiência para Dilma a ponto de transformá-la numa presidente menos obcecada por detalhes e intransigente politicamente.
"O que existe na verdade é uma torcida para que ela tenha aprendido com os erros. A campanha eleitoral está sendo uma grande lição para ela, para o governo e para o PT", disse uma pessoa que esteve perto de Dilma na campanha de 2010.
Um fato ocorrido nesta campanha deixou evidente a resistência da presidente para fazer correções de rota.
Ela vinha sendo aconselhada por aliados há meses a sinalizar que em um novo mandato faria mudanças, reconhecendo que o governo não acertou em tudo, e que também indicasse que trocaria a equipe econômica, cuja credibilidade junto ao mercado havia sido abalada. Diante desses apelos, Dilma resistia a uma inflexão.
Somente depois de uma conversa franca com Lula, seu tutor político, ela passou a dizer que faria mudanças na economia se reeleita.
"Foi preciso dizer a ela que teria que escolher entre o ministro da Fazenda (Guido Mantega) e a reeleição", contou um aliado, referindo-se à conversa com Lula.
Se conseguiu ou não suavizar sua postura de durona nos últimos meses o fato é que Dilma criou entre aliados e escalões inferiores do governo um clima tenso.
Esse aliado que contou sobre a conversa com Lula faz um diagnóstico crítico do resultado de tanta intransigência.
"Ao longo dos anos ela dinamitou pontes com setores econômicos, partidos aliados e inclusive com o PT. Se for reeleita terá que reconstruir essas pontes e num ambiente político mais hostil, com desconfiança", disse.
Controle e Tortura
Parte do fracasso da Dilma gestora está diretamente relacionado à postura controladora que sempre teve à frente do Ministério de Minas e Energia e da Casa Civil, cargos cujo perfil era mais gerencial e não de liderança.
Ela gosta de estar de olho em tudo, mesmo em questões banais.
Também costuma discutir projetos dividindo o governo em áreas estanques, que não dialogam entre si e recebem recomendações diferentes, sem saber qual a posição exata da presidente sobre o tema em discussão.
A presidente adota essa estratégia, em parte, porque é avessa a vazamentos para a mídia.
Isso também pode estar relacionado ao passado de Dilma na luta contra a ditadura, quando as organizações clandestinas atuavam por células, com segredos bem guardados até dos amigos.
Dilma participou da luta armada contra a ditadura que governou o país por 21 anos. Ela começou sua atuação na resistência ao regime militar em Belo Horizonte, onde era uma jovem de classe média. Mas o segundo ex-marido, Carlos Araújo, disse que Dilma "nunca pegou numa arma e nunca deu um tiro".
Presa, sofreu torturas "extremamente cruéis", segundo o ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Fernando Pimentel, seu amigo desde a juventude e eleito governador de Minas Gerais pelo PT, no primeiro turno.
É muito raro ela se referir publicamente a esse período, mas os xingamentos de que foi alvo na abertura da Copa do Mundo este ano, em São Paulo, levaram-na a abrir uma exceção.
No dia seguinte, em um evento oficial no Distrito Federal, Dilma disse que em sua vida tinha enfrentado agressões que chegaram "ao limite físico" e que não seriam ataques verbais que a abateriam ou a fariam se atemorizar.
"Suportei agressões físicas quase insuportáveis e nada disso me tirou do meu rumo, nada me tirou dos meus compromissos", disse a presidente, indicando o quão importante é para ela manter suas posições independentemente do tipo de pressão.
Helvécio Ratton, de 65 anos, um cineasta que é amigo da presidente desde a universidade, disse que ele e Dilma foram atraídos para a resistência de esquerda por conta da impressionante desigualdade no país naquela época.
A descrição da adolescente estudiosa que Ratton faz é bem diferente da imagem pública hoje identificada com a presidente. Segundo o cineasta, ela era "muito engraçada", o tipo de pessoas que "sempre ficava fazendo piadas".
Ratton disse que ela mudou justamente depois ter sido presa e torturada. Para ele, o fato de Dilma ter feito carreira no mundo "masculino" da política brasileira também pode ter ajudado no seu novo comportamento.
A carreira administrativa e política, porém, a presidente construiu bem longe das montanhas de seu Estado natal, Minas Gerais. Os traços dessa nova Dilma foram moldados no Rio Grande do Sul, onde viveu e ajudou a fundar o PDT, partido ao qual pertenceu antes de se filiar ao PT em 2001.
Ratton faz uma ressalva sobre a personalidade da amiga: "Em particular, você ainda encontra a velha Dilma."
Distração da Vovó
Não por acaso, a pessoa que consegue distrair a presidente de seus objetivos não tem nada a ver com sua vida pública. Trata-se do neto Gabriel, que abala a concentração dela quando está em Brasília ou mesmo pela Internet, quando ele está em Porto Alegre, onde mora.
Os assessores mais próximos costumam comemorar quando sabem que a ilustre visita está no Palácio da Alvorada.