Urna: “enquanto o político não mudar, o eleitor não vai legitimar esse cenário", diz professora de ciência política (Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 3 de outubro de 2016 às 20h29.
O número de <a href="https://exame.com.br/topicos/eleicoes-2016"><strong>eleitores</strong></a> que deixaram de comparecer às urnas neste domingo (2) chamou atenção de especialistas. A eleição municipal deste ano registrou o maior índice de abstenções da história: mais de 25 milhões de cidadãos aptos deixaram de votar em todo país.</p>
Segundo dados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a taxa de abstenção é crescente desde 2008, quando 14,6% dos eleitores não compareçam à votação.
No pleito deste ano, o índice chegou a 17,6%. O maior percentual de abstenções foi na cidade do Rio de Janeiro, 24,28%. Em seguida, ficaram Porto Alegre (22,51%) e São Paulo (21,84%). Os menores índices foram verificados em Manaus (8,59%), Vitória (10,76) e Recife (11,31%).
Para a professora do Departamento de Política do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Vera Chaia, os números refletem a desconfiança do eleitor com a classe política.
“Esse fenômeno é reflexo de todos os movimentos anteriores, as manifestações que começaram em 2013. Apesar de ter havido alguma mudança no cenário político, não foi substancial. O mesmo grupo político continua no poder, com o governo do presidente Michel Temer. Essa é uma demonstração de repúdio do eleitor, um reflexo da negação desse atual sistema político.”
A mudança desse cenário não deve ser sentida em curto prazo, diz a cientista política. “Enquanto o político não mudar, o eleitor não vai legitimar esse cenário, com práticas políticas que são negadas do ponto de vista ético. Porque é isso que está acontecendo, ele está deslegitimando o sistema eleitoral.”
O cientista político e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Geraldo Tadeu Moreira Monteiro ressalta que cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte tiveram mais votos brancos, nulos e abstenções do que os candidatos que saíram em primeiro lugar na disputa.
“A expectativa é que os prefeitos sejam eleitos nessas capitais com um número de votos pequeno, em torno de 35% dos votos válidos. Eles terão baixa legitimidade, o que é preocupante.”
Para Moreira, a reforma política, com a diminuição do número de partidos políticos para dar mais “coerência” aos governos, é imprescindível para a mudança do cenário de desconfiança por parte dos eleitores brasileiros.
“Há uma crise de representatividade. O sistema político resistiu e não lidou com ela, manteve-se do mesmo jeito. Assim, o eleitor desiste e vai cuidar da sua vida ou procura candidatos que não representem esse sistema, como os que se dizem administradores, e não políticos. O comportamento pode se reproduzir à medida que o sistema não responder a essas inquietações da população.”
Michel Temer
Em visita à Argentina, o presidente Michel Temer disse que o alto índice de abstenções nas eleições municipais é um recado da população para a classe política.
Segundo o presidente, o recado dos eleitores precisa ser assimilado para que políticos e partidos reformulem “eventuais costumes inadequados” da política brasileira.
“Há uma decepção, sem dúvida nenhuma, com a classe política em geral. Não se pode particularizar o partido A ou B. Temos 35 partidos no país. Quase todos com candidatos às prefeituras municipais. Mesmo assim, a abstenção foi realmente muito significativa”, disse Temer durante encontro com o presidente argentino, Maurício Macri.