Operação Carne Fraca: Fábio Zanon foi nomeado em outubro de 2015 para o Ministério da Agricultura, à época chefiado pela senadora atual Katia Abreu (PMDB-TO) (Ueslei Marcelino/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 27 de março de 2017 às 19h50.
São Paulo - O fiscal federal Fábio Zanon Simão, um dos alvos da Operação Carne Fraca, que apura corrupção no Ministério da Agricultura, foi indicado ao cargo pelo deputado Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC).
O parlamentar foi flagrado em grampo da Polícia Federal nas investigações sobre suposto esquema de propinas envolvendo fiscais do Ministério da Agricultura, em especial do Paraná, e funcionários do de empresas de carnes e processados, entre elas, unidades da BRF e JBS.
À reportagem, Peninha afirmou que tinha "relação de amizade" com o fiscal preso preventivamente e admite ter participado, ao lado da bancada do PMDB, da indicação de Zanon à Agricultura.
As investigações apontam que Fábio Zanon Simão teria negociado R$ 300 mil em propinas para autorizar a abertura de um abatedouro de cavalos, a pedido do empresário Nilson Umberto Sachelli Ribeiro, preso preventivamente, e seu pai Nilson Alves Ribeiro, alvo de mandado de prisão.
O dinheiro, segundo o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da Operação Carne Fraca, teria sido entregue a Marcelo Zanon, irmão de Fábio.
Fábio Zanon foi nomeado em outubro de 2015 para o Ministério da Agricultura, à época chefiado pela senadora atual Katia Abreu (PMDB-TO).
A indicação de Zanon à chefia da assessoria parlamentar do gabinete da ex-ministra da Agricultura veio do PMDB. O Estado apurou que o nome dele foi articulado pelo deputado federal Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC).
O parlamentar, citado em grampos da PF, diz ter conhecido o fiscal em 2014, e que a relação entre ambos era "simplesmente de amizade".
"Eu participei da indicação em conjunto com a bancada do PMDB. Nunca imaginava que ele pudesse cometer qualquer delito ou irregularidade. Inclusive foi grampeado e tenho certeza que nunca citou meu nome. Assim como está sendo interrogado e tenho certeza absoluta que não vai envolver nem meu nome nem qualquer deputado da nossa bancada, pois simplesmente nunca participei de nada de errado", afirma o deputado.
Ao grampear, com autorização da Justiça, telefonemas do executivo Roney Nogueira dos Santos, da BRF, a Polícia Federal captou uma conversa entre o executivo e o deputado Rogério Peninha.
De acordo com relatório da PF, Roney "tem feito contatos com políticos para solicitar ajuda para cumprimento/descumprimento de Normas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento".
Segundo a PF, Roney "precisa de apoio (lobby)' sobre a IN 39 - norma estabelecida em 27 de outubro de 2015 pela então ministra Kátia Abreu (PMDB-TO), que regula documentação sobre importação e exportação. Para os investigadores, a BRF não queria cumprir a IN 39.
Peninha tem direito a foro especial, por prerrogativa de função e só pode ser investigado no Supremo Tribunal Federal (STF). A Carne Fraca já encaminhou a parte da apuração que envolve deputados.
Fábio Zanon Simão ainda passou por outra pasta controlada pelo PMDB.
O agente público deixou o Ministério da Agricultura em junho de 2016 para assumir vaga na Pasta da Integração Nacional, chefiada por Helder Barbalho (PMDB-PA). A
indicação foi feita pelo Secretário Nacional de Desenvolvimento Regional, Marlon Cambraia, que trabalhou com o fiscal à época em que foi também servidor do Ministério da Agricultura.
Fábio Zanon Simão permaneceu no cargo de Diretor do Departamento de Gestão de Programas de Desenvolvimento Regional até a deflagração da Carne Fraca, quando foi exonerado.
A Carne Fraca mira corrupção na Superintendência Federal de Agricultura no Estado do Paraná (SFA/PR) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
No rol de empresas investigadas pela Polícia Federal estão a JBS, dona da Seara e da Big Frango, a BRF, controladora da Sadia e da Perdigão, e os frigoríficos Larissa, Peccin e Souza Ramos.
Na lista de irregularidades identificadas pela PF estão o pagamento de propinas a fiscais federais agropecuários e agentes de inspeção em razão da comercialização de certificados sanitários e aproveitamento de carne estragada para produção de gêneros alimentícios.
Os pagamentos indevidos teriam o objetivo de atender aos interesses de empresas fiscalizadas para evitar a efetiva e adequada fiscalização das atividades, segundo a investigação.
Defesas
Fábio Zanon Simão
A reportagem contatou o escritório de advocacia de Fábio Zanon Simão e Marcelo Zanon, mas não obteve retorno.
O espaço está aberto para manifestação.
Em depoimento à Polícia Federal, Marcelo Zanon nega ter recebido propinas dos empresários Nilson Umberto Sachelli Ribeiro e Nilson Alves Ribeiro.
Peninha Mendonça
"Eu participei da indicação em conjunto com a bancada do PMDB. Nunca imaginava que ele pudesse cometer qualquer delito ou irregularidade. Inclusive foi grampeado e tenho certeza que nunca citou meu nome. Assim como está sendo interrogado e tenho certeza absoluta que não vai envolver nem meu nome nem qualquer deputado da nossa bancada, pois simplesmente nunca participei de nada de errado."
Senadora Kátia Abreu (PMDB-TO)
Questionada a respeito da manutenção de Fábio Zanon Simão no Ministério da Agricultura, a senadora Kátia Abreu, não se manifestou.
A ex-ministra afirma, por meio de nota, que, quando estava à frente da pasta, não cedeu à pressão exercida por alguns deputados do Paraná para manter Daniel Gonçalves Filho na função de superintendente do Ministério da Agricultura. Ao contrário, suspendeu o servidor do trabalho e o demitiu do cargo.
Daniel Gonçalves Filho, servidor de carreira do Mapa, foi indicado pela bancada do PMDB paranaense da Câmara do Deputados assim que Kátia Abreu assumiu o ministério.
Até aquele momento, nenhum processo contra o servidor havia chegado ao gabinete ministerial. A nomeação, portanto, ocorreu dentro da legalidade.
Quando o primeiro Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra Daniel Filho chegou ao gabinete ministerial - última instância desse tipo de procedimento - a senadora comunicou aos deputados Osmar Serraglio e Sérgio Souza.
O PAD não dizia respeito aos episódios revelados pela Operação Carne Fraca.
Baseava-se no fato de que Daniel teria atuado para aliviar a punição administrativa de um servidor acusado de desvio.
Em vez de dar prosseguimento às investigações,
Daniel teria se limitado a aplicar a branda pena de advertência ao funcionário acusado sem ter prerrogativa para tal.
Todas as instâncias por onde o PAD havia tramitado (Comissão Processante, Corregedoria e Consultoria Jurídica) recomendavam, com base na lei, a demissão de Daniel Filho.
Ciente de que deveria acatar a conclusão dos pareceres jurídicos, a senadora comunicou Osmar Serraglio e Sergio Souza que dispensaria e puniria o então superintendente, como exigem os regulamentos.
Nesse momento, teve início uma grande pressão para que Daniel continuasse no cargo.
A pedido de Serraglio, uma cópia física do volumoso processo foi enviada ao seu gabinete na Câmara dos Deputados.
Em seguida, Serraglio e Souza argumentaram com a ministra que Daniel Filho era um ótimo superintendente e que as acusações contra ele eram, na realidade, revanche ou retaliação por parte de alguns servidores que resistiam à sua ativa e eficiente forma de trabalhar.
Mesmo diante da pressão dos deputados, a então ministra cumpriu a Lei 8.112, dispõe sobre o regime dos servidores públicos federais.
A exoneração foi publicada na edição do dia 12 de abril de 2016 do Diário Oficial da União.
Ministério da Integração Nacional
O Ministro da Integração Nacional, Helder Barbalho (PMDB-PA) atribui a indicação de Fábio Zanon Simão ao secretário nacional de Desenvolvimento Regional, Marlon Cambraia, e afirma que, assim que tomou conhecimento das investigações, exonerou o ex-servidor. "As investigações não tem ligação com atividade dele no ministério da integração.
Nenhum programa que esteja investigados pela carne fraca", ressalta o ministro.
Já o secretário nacional de Desenvolvimento Regional, Marlon Cambraia, afirma que Fábio Zanon Simão "deixou ótima impressão pela eficiência e cordialidade" quando trabalhou ao lado dele no Ministério da Agricultura.
"Ele foi aprovado pela casa civil. Foi nomeado e permaneceu pela coordenação por dois ou três meses. Numa vacância de um departamento, pelo desempenho, ele se provou versátil e eficiente. Eu promovi para essa diretoria de programa de desenvolvimento regional. Ele ficou nessa papel até o momento em que foi deflagrada a operação", afirma Cambraia.
O secretário nacional de Desenvolvimento Regional, Marlon Cambraia, diz ter sido surpreendido pelas investigações e avalia que, se Zanon cometeu algum crime, "deve ser exemplarmente punido".
BRF
A reportagem procurou a BRF na noite de quarta-feira, 22.
Em comunicado após a deflagração da Operação Carne Fraca, a empresa informou:
"Sobre a suspeita de uso de papelão, a companhia informou que "não há papelão algum nos produtos da BRF. Houve um grande mal entendido na interpretação do áudio capturado pela Polícia Federal. O funcionário estava se referindo às embalagens do produto e não ao seu conteúdo. Quando ele diz 'dentro do CMS', está se referindo à área onde o CMS é armazenado".
"A BRF não compactua com práticas ilícitas e refuta categoricamente qualquer insinuação em contrário. Ao ser informada da operação da PF, a companhia tomou imediatamente as medidas necessárias para a apuração dos fatos.
Essa apuração será realizada de maneira independente e caso seja verificado qualquer ato incompatível com a legislação vigente, a BRF tomará as medidas cabíveis e com o rigor necessário.
A BRF não tolera qualquer desvio de seu manual da transparência e da legislação brasileira e dos países em que atua.
Sobre a prisão de Roney Nogueira dos Santos, a empresa diz que ele "apresentou-se voluntariamente às autoridades brasileiras (...) para prestar todos os esclarecimentos necessários às autoridades.
A BRF está acompanhando as investigações e dará todo o suporte às autoridades".
"A BRF nunca comercializou carne podre e nem nunca foi acusada disso. As menções a produtos fora de especificação, no âmbito da operação Carne Fraca, dizem respeito a outras empresas, como pode ser comprovado no material divulgado pela Polícia Federal.A BRF lamenta que parte da imprensa tenha inserido o seu nome de maneira equivocada em reportagens que tratam desse assunto, confundindo os consumidores e a sociedade".
"A BRF vem a público manifestar seu apoio à fiscalização do setor e ao direito de informação da sociedade com base em fatos, sem generalizações que podem prejudicar a reputação de empresas idôneas e gerar alarme desnecessário na população".