Michel Temer divulgou nota negando que tenha pedido o pagamento para conseguir o silêncio de Cunha (Adriano Machado/Reuters)
Reuters
Publicado em 18 de maio de 2017 às 08h24.
Última atualização em 18 de maio de 2017 às 09h59.
Brasília - A notícia de que Joesley Batista, um dos controladores do frigorífico JBS, gravou o presidente Michel Temer concordando com pagamentos para manter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha causou um terremoto político ao atingir o centro do poder e coloca em xeque a agenda de reformas do governo.
Na conversa gravada por Joesley com Temer, segundo reportagem divulgada pelo jornal O Globo e confirmada à Reuters por três fontes com conhecimento do assunto, o dono da JBS conta a Temer que pagava a Cunha e ao doleiro Lúcio Funaro, um dos operadores presos na Lava Jato, para que ficassem calados. Os dois estão presos.
De acordo com o jornal, ao receber a informação de Joesley, Temer respondeu: "Tem que manter isso, viu?"
Cerca de duas horas depois da divulgação da notícia e de reunião com seus principais auxiliares no Palácio do Planalto, Temer divulgou nota negando que tenha pedido o pagamento para conseguir o silêncio de Cunha ou tenha autorizado qualquer movimento nesse sentido.
"O presidente jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. Não participou e nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar", afirma nota da assessoria de imprensa da Presidência.
A nota do Planalto diz que "o encontro com o empresário Joesley Batista ocorreu no começo de março, no Palácio do Jaburu, mas não houve no diálogo nada que comprometesse a conduta do presidente da República".
Assim que a notícia chegou ao Congresso, a oposição não perdeu tempo para passar a pedir o impeachment de Temer, enquanto líderes governistas, pegos de surpresa, pediam cautela com a informação, evitando fazer defesas mais taxativas.
"O ponto final (do governo) se não for dado por sua própria renúncia, que nós esperamos seja feita, será feito por esta Câmara e por este Senado através de um impeachment", disse o líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP).
Do outro lado, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), considerava a denúncia como "tantas que estão sendo publicadas de delações às dezenas".
"É prematuro qualquer comentário sobre qualquer coisa de investigação porque eu não conheço os autos, não sei do que se trata, não se sabe que tipo de fita é essa", disse Jucá.
Para o deputado Efraim Filho (PB), líder do governista DEM, "esse é um momento importante que o Brasil precisa parar, ter serenidade".
A oposição não só defendeu o impeachment como um de seus deputados já protocolou um pedido de impedimento de Temer, ao mesmo tempo em que PDT, PT, PCdoB, PSOL, Rede e PSB --este último com um ministro no governo-- pediram a renúncia ou o afastamento de Temer e a realização de "diretas já".
Mas não foram só oposicionistas que pediram a renúncia de Temer e eleições antecipadas. O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que tem sido um crítico do governo também soltou nota neste sentido.
"Diante da gravidade do quadro e com a responsabilidade de não deixar o Brasil mergulhar no imponderável, só nos resta a renúncia do presidente Michel Temer e a mudança na Constituição. É preciso aprovar a antecipação das eleições presidenciais e do Congresso Nacional", defendeu Caiado.
Em meio ao choque causado pela notícia, analistas políticos e econômicos tentavam fazer uma primeira avaliação do impacto sobre o governo e as reformas em tramitação no Congresso Nacional, mas já era possível dizer que o estrago será grande.
"Dessa vez vai ser praticamente impossível alguma operação de engenharia política para garantir a estabilidade do governo", disse o cientista político e professor da Unicamp Roberto Romano. "A instabilidade política veio de vez. O ambiente vai ficar muito imprevisível."
Em relatório, a consultoria política Arko Advice apontou que o episódio gera "dramático enfraquecimento político do governo" capitaneado por Temer e disse não descartar o abandono da agenda de reformas.
Para a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, "o país fica no escuro".