Linha Verde: em nota, a Secretaria dos Transportes Metropolitanos (STM) informou que "acompanha com atenção a divulgação dos conteúdos das delações" (Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
Estadão Conteúdo
Publicado em 13 de abril de 2017 às 19h03.
Em delação premiada à Operação Lava Jato, o executivo Fábio Gandolfo, da Odebrecht, apontou pagamento de propina sobre contrato da Linha 2-Verde do metrô de São Paulo para um suposto intermediário do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Luís Carlos Ferreira, para o ex-presidente da Companhia do Metropolitano Luiz Carlos Frayse David e aos funcionários da estatal Sérgio Brasil e Décio Tambelli.
O pagamento era chamado de "compromisso".
A Procuradoria-Geral da República (PGR) questionou Gandolfo se "compromisso" era sinônimo de propina.
"Propina, propina", afirmou.
"O meu antecessor (Marcos Vinícius) me passou que tinha um compromisso com uma determinada pessoa de nome Luís Carlos Ferreira. Esse compromisso assegurava a aprovação do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo para que esses aditivos - você precisava do aditivo contratual para estender o prazo de eficácia - fossem aprovados."
A função do TCE é a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do governo de São Paulo e das prefeituras, exceto a da capital paulista, que tem o Tribunal de Contas do Município (TCM).
De acordo com Gandolfo, houve pagamentos a David, de codinome "Estrela", Brasil, de alcunha "Brasileiro", Ferreira, de apelido "Corinthiano", e Tambelli, o "Bragança".
"Eu detectei pagamento para o 'Estrela', na ordem de R$ 10 milhões ao longo de 2004, 2005 e 2006. Eu detectei tanto para o 'Brasileiro' como para o 'Bragança' pagamentos na ordem, cada um de R$ 1,5 milhão. Esse 'Corinthiano' era 0,9% do valor do contrato original sempre pago em cinco vezes a partir do início. Detectei dois pacotes de cinco parcelas que totalizam R$ 2,754 mil, que bate com esse número", relatou.
O suposto intermediário do TCE teria recebido valores em casa e no escritório.
"O Luís Carlos Ferreira, eu entreguei a maioria das vezes no escritório dele." De acordo com o executivo, para o ex-presidente do Metrô, a entrega era na residência. Para Brasil em "alguns restaurantes".
A Tambelli, "lá no Metrô".
"Era o único que eu levava no Metrô. No gabinete dele no Metrô", disse.
"Eu juntava. Como tinha pagamento de R$ 15 mil, de R$ 10 mil, muitas vezes eu guardava e depois eu levava de uma vez só, para não ir todo mês." Gandolfo relatou que soube do "compromisso" pelo antecessor na Odebrecht.
De acordo com o executivo, o primeiro "compromisso" passado por Vinícius era "da ordem de 0,9% do valor do contrato".
"Nessa época, nós tínhamos dois lotes, portanto, dois contratos. O contrato do lote 2 da Linha 2, que era Estação Ipiranga, da ordem de R$ 125 milhões e o contrato do Lote 3, da ordem de R$ 150 milhões. Basicamente, quando eu cheguei, nós já tínhamos assinado 20 aditivos contratuais sem ter iniciado o contrato", disse.
"O Metrô tinha interesse em manter esses contratos. Um processo de licitação leva muito tempo. O problema que é o Metrô não dava eficácia ao contrato porque ele não tinha recurso para tocar o contrato. A posição do Metrô era essa. O grande problema era se o Tribunal de Contas aprovava ou não esses aditivos. O tribunal podia dizer: 'Não, não aprovo, faça nova licitação'. Foi para isso, para manter o contrato vivo."
Gandolfo declarou que o contato era somente com o "Luís Carlos", intermediário do TCE.
"Sinceramente, não sei se isso envolvia os conselheiros", prosseguiu.
"Não sei se esse acordo envolvia todos os conselheiros, um conselheiro ou o quadro técnico do TCE. Eu não sei."
"Eu nunca tive contato com nenhum membro do Tribunal de Contas. Eu tive com o Luís Carlos Ferreira." O executivo garantiu que, certa vez foi, convocado por David. "Eu fui convocado por ele, fui sozinho. Ele disse-me que precisava do apoio nosso nesse contrato para um grupo de deputados, apoio político, que ele precisava contribuir para que não tivesse pressão da Assembleia contra esse contrato. Vamos convir que você ficar com dez anos de contrato em stand-by é um negócio que é discutível. Por que não fazer nova licitação? Vai perder tempo. Mas é discutível. Ele disse-me que precisaria da ordem de 4% ou 5% do valor do contrato para que fosse destinado a ele, e ele, então, se encarregaria de fazer essa distribuição. Me disse mais", afirmou.
"Ele pediu para designar 0,5%, que seria entregue ao diretor de Operação do Metrô."
O diretor apontado é Tambelli.
"Se esse Décio tinha algum apoio político por trás dele, eu não sei", acentuou.
A reunião com o então presidente do Metrô se deu no gabinete no centro da capital.
"Nessa mesma reunião, ele falou-me que precisaria de um outro apoio porque nós tínhamos de fazer toda a mudança contratual."
"(Ele) me disse desse 0,5% porque esse funcionário, de segundo escalão, um gerente (Brasil), ia cuidar da parte de todo ajuste contratual porque você tinha mudado projeto, prazo, preço para baixo, tinha de fazer um realismo de preço", acrescentou. "Saí dessa reunião e, não sei no mesmo dia ou dia seguinte, fui conversar com o Benedicto Júnior (mais conhecido como BJ, responsável pelo Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht), era diretor-superintendente, cuidava de Sul e Sudeste."
"Falei para ele, tem um pedido do presidente, diz que vai envolver parte política, não me disse o que. Tem dois compromissos menores que são mais para ele ter um apoio operacional de viabilizar isso." "Ele me falou: cabe no contrato?" "Falei: Cabe."
"Comunicou a Marcelo (Odebrecht, ex-presidente da empresa) por e-mail e o Marcelo aprovou esses pagamentos."
Defesas
Em nota, a Secretaria dos Transportes Metropolitanos (STM) informou que "acompanha com atenção a divulgação dos conteúdos das delações. Em casos que possam envolver pessoas de seus quadros, a STM ressalta que é a maior interessada no avanço e resolução dos processos, pois preza pela transparência de seus trabalhos e exige de seus funcionários uma conduta ética condizente com os mais elevados padrões do serviço público do Estado. No caso da participação efetiva de funcionários públicos em qualquer tipo de crime, a posição da STM é clara: que se aplique a lei, que sejam julgados e, se condenados, punidos."
O Tribunal de Contas de São Paulo divulgou nota de esclarecimento:
"O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP), em face de notícias sobre supostas declarações prestadas no âmbito da Operação Lava Jato, reitera a disposição de prestar todas as informações que se fizerem necessárias para o esclarecimento de quaisquer fatos. O TCE determinou o levantamento da situação de todos os processos referentes aos contratos citados. O relatório com essas informações estará disponível, de forma transparente, a todas as autoridades competentes e a quem possa interessar."