Dante Mantovani, novo chefe da Funarte, é membro da Cúpula Conservadora das Américas e aluno de Olavo de Carvalho (Youtube/Reprodução)
João Pedro Caleiro
Publicado em 5 de maio de 2020 às 10h10.
Última atualização em 5 de maio de 2020 às 13h22.
O maestro Dante Henrique Mantovani está novamente na presidência da Fundação Nacional de Artes (Funarte). Após dois meses da sua exoneração, ele voltou ao cargo. A nomeação consta em publicação do Diário Oficial, de segunda-feira, 4, assinada pelo ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto.
Criada em 1975, a Fundação Nacional de Artes é o órgão federal responsável pelas políticas públicas federais de estímulo à atividade artística brasileira.
Mantovani foi demitido no mesmo dia, 4 de março, em que Regina Duarte assumiu a Secretaria Especial da Cultura no governo do presidente Jair Bolsonaro. Regina já havia anunciado a exoneração dele e de outros nomes da secretaria no dia anterior à posse.
A primeira nomeação do maestro havia sido no dia 4 de novembro do ano passado, quando foi exonerado o pianista Miguel Angelo Oronoz Proença, ainda na gestão do antecessor de Regina, Roberto Alvim, que foi demitido na sequência após fazer discurso com apologia ao nazismo. Em vídeo sobre o Prêmio Nacional das Artes de 2020, o então secretário da Cultura parafraseou Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Hitler.
Outra polêmica se deu quando a Funarte divulgou um edital para anunciar o Prêmio de Apoio a Bandas de Música. O documento chamou a atenção por proibir a participação de alguns tipos de banda, incluindo as de rock.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Mantovani defendeu a lei Rouanet e disse que Bolsonaro valoriza a arte "como nunca antes no País".
A segunda nomeação de Dante Mantovani desponta num período em que Regina Duarte vem sofrendo constantes ataques de setores bolsonaristas. Na última semana, Jair Bolsonaro chegou a criticar a secretária.
Em conversa com apoiadores na frente do Palácio da Alvorada, o presidente reclamou da ausência de Regina em Brasília, apesar de dizer, em seguida, que também ama a "namoradinha do Brasil".
Apesar de afirmar que ninguém no seu governo vive sob tensão, Bolsonaro fez um comentário enigmático quando lhe perguntaram sobre mudanças na equipe. "Só não pode mudar o presidente e o vice, né? O resto..."
Graduado em música, Mantovani tem especialização em filosofia política e jurídica e é doutor em Estudos da Linguagem, ambos pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).
Membro da Cúpula Conservadora das Américas, autor dos livros “O Canto do Violino e Outros Ensaios” e “Ensaios Sobre a Música Universal (Canto Gregoriano a Beethoven)”, sobre música erudita.
Mantovani também foi produtor do curta-metragem “Deus acima de todos”, sobre a eleição de Jair Bolsonaro e a identificação com a fé de seus eleitores.
Em seu canal no Youtube, onde tem dezenas de vídeos e quase 9 mil seguidores, Mantovani mistura música, política, filosofia e teorias da conspiração para defender ideais da direita conservadora.
No vídeo “Qual a relação entre Beatles e Adorno?”, Mantovani afirma que agentes comunistas infiltrados na CIA, Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos, eram responsáveis por fazer distribuição de LSD para jovens no festival de Woodstock em 1969.
O objetivo seria destruir a família, que, segundo ele, é a base do capitalismo. Mantovani segue, associando o gosto pelo rock ao uso da droga, que “ativa a indústria do aborto”:
“O rock ativa a droga que ativa o sexo que ativa a indústria do aborto. A indústria do aborto por sua vez alimenta uma coisa muito mais pesada que é o satanismo. O próprio John Lennon disse que fez um pacto com o diabo”, diz.
Mantovani foi aluno do ideólogo de direita Olavo de Carvalho, citado como inspiração e usado como referência estética, com vídeos em frente a livros, mapas, partituras, e com uma cruz católica à vista.
A ligação dos Beatles com o filósofo alemão Theodor Adorno também vem de Olavo, que em setembro do ano passado, colocou o pesquisador da escola de Frankfurt como o real compositor das músicas da banda.
Em um vídeo de outubro deste ano, Mantovani cita Platão para defender Olavo, que por ser “filósofo”, deve estar acima de toda a sociedade, e assim, reger ideologicamente o país. “Se nós temos um filósofo, em primeiro lugar, vamos ficar quietinho e aprender com ele”, declara.
Em outro vídeo, Mantovani defende que o fascismo, regime político autoritário reconhecido como um fenômeno da direita por historiadores, é, na verdade, um movimento de esquerda, .
“‘Tudo dentro do Estado, pelo Estado e para o Estado’. Essa é a definição de Benito Mussolini, o próprio fundador do fascismo. Quem defende que tudo deva ser feito pelo Estado, para o Estado e em benefício do Estado, ora, são políticos de esquerda, são os socialistas, são os comuno-larápios, são os psolistas, os petistas, pcdobistas. Esse pessoal da esquerda que quer fazer tudo pelo Estado. As pessoas de direita são o extremo oposto do fascismo”, defende o maestro.
Em outra publicação do canal, o novo presidente da Funarte diz que nem todas as produções de rock podem ser consideradas como música, e dá ao gênero outras utilidades.
“Eu acho o rock bom porque quando você tá dirigindo no trânsito ou na estrada e começa te dar aquele sono você coloca o rock e acorda na hora, porque ele estimula o corpo.”
Ainda debatendo ritmos musicais, no vídeo “Fim do Sertanejo?”, Mantovani discute a “baixa qualidade” do sertanejo universitário. De acordo com ele, o ritmo fez com que muitos brasileiros perdessem o contato com a própria tradição cultural brasileira.
“É óbvio que estes que fazem sucesso hoje, com esse chamado sertanejo universitário, que não tem relação alguma com o campo com a vida rural, com a alma brasileira. Tem a ver sim com a ganância, com querer ganhar dinheiro com essas músicas de baixíssima qualidade que acabam inclusive por distorcer o nome da chamada música sertaneja (…) Então, é um procedimento gravíssimo que precisa ser discutido e trazido à tona e trazido às claras”.