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Crises, revezes e demissões: a linha do tempo da passagem de Vélez no MEC

A passagem de Ricardo Vélez Rodrigues pela liderança do Ministério da Educação foi marcada por crises internas, revezes e dezenas de baixas à pasta.

Ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues em reunião do LIDE em Campos do Jordão. 5 de abril de 2019.  (Amanda Perobelli/Reuters)

Ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues em reunião do LIDE em Campos do Jordão. 5 de abril de 2019. (Amanda Perobelli/Reuters)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 8 de abril de 2019 às 11h44.

Última atualização em 8 de abril de 2019 às 12h07.

São Paulo - A passagem de Ricardo Vélez Rodrigues pela liderança do Ministério da Educação (MEC) foi marcada por crises internas, revezes e dezenas de baixas à pasta. O professor foi substituído nesta segunda-feira pelo economista Abraham Weintraub, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

No cargo desde o início do governo Bolsonaro por indicação de Olavo de Carvalho, o colombiano naturalizado brasileiro disse adeus sem nem contar com o apoio do guru dos bolsonaristas, a quem acabou desagradando. Passou todo o tempo de sua gestão sendo criticado pela falta de articulação para conter o conflito entre alas militaristas, técnicas e olavistas dentro do Ministério. Nesse clima de instabilidade, 17 pessoas foram demitidas nas últimas semanas, entre elas, o presidente do Inep - órgão responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e pelo Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja).

A seguir, veja a linha do tempo com as polêmicas vividas pelo Ministério da Educação de janeiro para cá:

Livro didático sem fonte

A primeira polêmica envolvendo o primeiro ministro da Educação de Jair Bolsonaro foram alterações em regras para compra de livros didáticos a jovens do 6º ao 9º anos do ensino fundamental. O novo edital deixava de exigir temas sobre diversidade étnica e cultural no Brasil e sobre violência contra a mulher. Também passava a permitir propagandas nos livros escolares. Mas a mudança mais comentada foi a eliminação do item que impedia erros de revisão e impressão no conteúdo, e que obrigava que os materiais tivessem referências bibliográficas.

Após repercussão negativa, o governo decidiu tornar “sem efeito” algumas mudanças nas diretrizes. A alegação foi que as alterações haviam sido feitas pela gestão anterior, apesar de publicadas no Diário Oficial no dia 02 de janeiro, já sob a gestão do novo governo.

"Brasileiros viajando são canibais"

No início de fevereiro, Vélez Rodrigues afirmou, em entrevista às páginas amarelas da revista Veja, que “brasileiro viajando é um canibal”.  "Rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião; ele acha que sai de casa e pode carregar tudo. Esse é o tipo de coisa que tem de ser revertido na escola”, disse. Essa foi a resposta que o ministro deu ao ser questionado sobre o motivo de defender a volta da disciplina educação moral e cívica ao currículo escolar. 

Após a publicação da entrevista, Vélez foi interpelado criminalmente por um advogado, o que levou a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber a pedir um esclarecimento sobre sua fala. Sua resposta era facultativa, mas o ministro preferiu se explicar com um pedido de desculpas.

Hino nas escolas e Deus acima de todos

Em fevereiro, o MEC mandou um e-mail para as instituições de ensino de todo o país, no qual solicitava que professores e alunos fossem filmados cantando o hino nacional na frente da bandeira do Brasil diariamente. O pedido também incluía a leitura de uma carta às crianças, que terminava com o slogan de campanha do governo: “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”.

O pedido irritou instituições de ensino e foi criticado pelas maioria dos estados, que ressaltaram a autonomia das escolas no país. Além disso, gerou polêmica o fato de o ministério ter cogitado fazer as filmagens sem a devida autorização dos pais.  

No dia seguinte à publicação de matéria do Estadão revelando o envio do e-mail, o MEC enviou nova carta às escolas reiterando o pedido de filmagem durante o hino, mas sem a exigência da leitura do slogan do governo. A nova mensagem também dizia que a filmagem dos alunos só poderia ser feita “voluntariamente” e com autorização do responsável legal dos estudantes.

Poucos dias depois, o MEC anunciou a desistência do pedido. Segundo a pasta, a decisão foi tomada pelo ministro Vélez devido a "questões técnicas de armazenamento e de segurança".

Avaliação do ensino básico

O MEC chegou a suspender a avaliação do nível de alfabetização das crianças brasileiras por dois anos, segundo publicação no Diário Oficial da União. Mas, após polêmica, revogou a portaria. Vélez disse que não havia sido consultado sobre a mudança e demitiu o presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), Marcos Vinicius Rodrigues. “Ele puxou o tapete. Mudou um acordo e não me consultou", disse o ministro. 

Na noite do dia em que foi exonerado, o então presidente do Inep criticou Vélez em entrevista ao Estadão. “O Brasil precisa de um ministro da Educação que tenha responsabilidade de gestão, competência e experiência”. Ao jornal, ele disse que havia sido convencido pelo secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim, a cancelar a avaliação, mas que, por ser um assunto do qual não tem domínio, pediu um ofício justificando o pedido.

Uma Tabata no meio do caminho 

A imagem de Vélez ficou ainda mais desgastada na quarta-feira, 27, quando participou da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, para falar sobre seus planos à frente da Educação. Pressionado pela deputada federal Tabata Amaral (PDT) por propostas concretas, o ministro deu respostas vagas durante as mais de quatro horas de reunião, deixando no ar quais são seus projetos para o MEC.

Vélez demitido. Não, pera...

Nesse mesmo dia, a jornalista Eliane Catanhêde informou no programa "Em Pauta", da Globo News, que o presidente Bolsonaro havia decidido demiti-lo. O presidente, no entanto, rebateu a jornalista pelo Twitter, dizendo que o furo de reportagem tratava-se de "fakenews".

Bolsonaro seguiu sinalizando que iria demitir o ministro, no entanto. O último sinal foi dado em um café da manhã que teve com jornalistas no fim da semana passada. Na ocasião, Bolsonaro disse que “na segunda, vamos resolver a situação do MEC”, disse. “Está bem claro que não está dando certo, falta gestão. Vamos tirar a aliança da mão esquerda e pôr na direita”, afirmou o presidente.

Após a sinalização, Olavo de Carvalho disse em seu perfil no Facebook que não irá lamentar a suposta demissão do ministro.

Demissões irritam guru

As baixas no MEC começaram em março após a repercussão negativa da determinação às secretarias de Educação do país para que os alunos fossem filmados cantando o hino nacional diariamente. Os servidores cortados eram indicações de Olavo de Carvalho e chatearam o filósofo. Segundo informações de bastidores reveladas pelo Estadão, Vélez deixou os “olavistas” de lado e passou a se aconselhar com um grupo que defende o abandono do discurso ideológico. “Olavistas”, por sua vez, dizem que o grupo é “tucano” e não segue as ideias de Bolsonaro. Os técnicos rivalizam com outros dois segmentos dentro do MEC, o de seguidores de Olavo e o de alguns militares.

Bastante ativo no Twitter, Olavo de Carvalho negou na rede social que estivesse participando de alguma forma dos conflitos internos no MEC e disse não ter a intenção de “derrubar ministros”: "O ministério é do Velez. Que o enfie no c*.”

Na última quinta-feira, 4, o Ministério - que já acumulava 15 baixas nas últimas 3 semanas - perdeu mais dois nomes. Foram demitidos um dos principais assessores de Vélez, Bruno Meirelles Garschagen, e a chefe de gabinete, Josie de Jesus, substituída pelo tenente brigadeiro Ricardo Machado Vieira. No cargo desde 30 de janeiro, Garschagen foi indicado por Olavo de Carvalho para cuidar da área de comunicação do MEC. O assessor também teria participado da decisão sobre o hino nas escolas.

 

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