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Correios: relator nega privatização e defende diálogo com o setor

Representantes de trabalhadores temem demissões, mas governo garante que exploração pela iniciativa privada vai garantir investimentos e gerar empregos

Correios: Otto Alencar Filho propôs um modelo intermediário para transformar os Correios em uma empresa de economia mista (Correios/Divulgação)

Correios: Otto Alencar Filho propôs um modelo intermediário para transformar os Correios em uma empresa de economia mista (Correios/Divulgação)

AM

André Martins

Publicado em 29 de abril de 2021 às 09h54.

O relator em Plenário da proposta que autoriza a exploração dos serviços postais pela iniciativa privada, deputado Gil Cutrim (Republicanos-MA), negou que o projeto trate de privatização dos Correios. "O texto não fala de privatização, mas de modernização, regulamentação do sistema postal brasileiro para torná-lo eficiente, sem interferência política e com segurança jurídica a quem presta bom serviço à população", afirmou.

As declarações foram feitas em audiência das comissões de Trabalho, Administração e Serviço Público; e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados, que ouviram nesta quarta-feira (28) representantes do governo e de trabalhadores dos Correios para discutir o Projeto de Lei 591/21.

Cutrim defendeu o diálogo entre os vários setores envolvidos no serviço postal e de entregas. "Não iremos de forma açodada e sem responsabilidade tratar de matéria tão importante e histórica para nação brasileira."

Antes, o presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Otto Alencar Filho (PSD-BA), havia lamentado a aprovação do regime de urgência para votação da proposta pelo Plenário. "Não sei por que se aprovou urgência. Não entendo agilidade para discutir assunto tão importante a toque de caixa", criticou.

Otto Alencar Filho propôs um modelo intermediário para transformar os Correios em uma empresa de economia mista. "Precisamos valorizar os ativos dos Correios, mantendo o monopólio, abrindo o capital ao mercado e preservando o controle acionário com o governo."

Qualidade e preço

Entre os argumentos contrários à desestatização dos Correios, o ex-presidente do Conselho de Administração da Empresa de Correios e Telégrafos Adroaldo Portal citou tentativas fracassadas de privatização na Argentina e em Portugal, que prejudicaram a qualidade dos serviços e resultaram em aumento dos preços. "O Correio dos Estados Unidos tem prejuízo, mas em nenhum momento pensam em privatizar ou reduzir o serviço, por ser estratégico para o país", comentou.

O presidente da Federação Interestadual dos Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras dos Correios (Findect), José Aparecido Gimenes Gandara, alertou para os riscos de prejudicar a universalização dos serviços postais. "Hoje os Correios atendem todo o País com subsídios cruzados, cobrindo 5,2 mil municípios que não dão lucro", comentou.

Gandara ainda notou que os Correios providenciam logística para envio de provas do Enem, urnas eletrônicas, medicamentos, vacinas e materiais didáticos. "Sem os Correios, esses produtos e muitos outros só chegarão onde der lucro."

O secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Vitor Menezes, retrucou que o processo de desestatização deve dar maior agilidade ao setor e aumentar a qualidade dos serviços. "Hoje 70% das entregas do setor privado são feitas no mesmo dia", disse.

Ele afirmou que a União deve garantir a universalização do serviço postal a preço acessível, com uma regulação mínima do setor. "O Ministério das Comunicações vai trazer planos de metas de universalização, com serviços de interesse social, como entrega de livros e vacinas."

Investimento

O vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP) Marcos César Alves Silva afirmou que o Brasil é o líder regional em serviços postais, que contam com a confiança da população e têm uma das menores tarifas do mundo, mesmo com sua grande extensão territorial. Ele observou que os Correios têm feito investimentos. "A empresa tem lucro e comprou 7 mil veículos no último ano."

Já a secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos do Ministério da Economia, Martha Seillier, rebateu que os Correios só têm lucro porque não pagam impostos e contam com uma isenção tributária de quase R$ 2 bilhões. "Isso gera distorções no mercado. União, estados e municípios poderiam estar arrecadando", ponderou.

Martha Seillier afirmou que o projeto de desestatização do governo tem o objetivo de atrair investimentos para o setor, que demanda mais encomendas e menos serviços de monopólio. Segundo a secretária, os Correios deveriam investir R$ 2 bilhões por ano para crescer e ganhar competitividade. Hoje, os investimentos dos Correios variam entre R$ 300 milhões e R$ 400 milhões por ano.

"A ordem é gerar empregos, crescer. Queremos contratar mais. Enquanto tivermos estatais, não haverá novas contratações e os trabalhadores ficarão sobrecarregados", disse a secretária.

Empregos

José Aparecido Gimenes Gandara negou que os Correios sejam um cabide de empregos e cobrou a realização de concursos públicos. "Em 2011, tínhamos 128 mil trabalhadores. Hoje são 90 mil", comentou.

O secretário-geral da Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos e Similares (Fentect), José Rivaldo da Silva, apelou para que os deputados mantenham a empresa pública. Ele teme que trabalhadores sejam demitidos caso os Correios sejam privatizados.

José Rivaldo da Silva denunciou a direção dos Correios por perseguição de dirigentes sindicais, que segundo ele foram suspensos do trabalho por participarem de greves reconhecidas pela Justiça. "O general Floriano Peixoto [presidente dos Correios] envergonha a empresa e atua para desmontá-la", lamentou.

O secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord de Faria, afirmou que o novo marco do serviço postal tem a capacidade de gerar mais empregos. "Profissionais que passaram em concurso e não conseguem ser promovidos terão facilidades em uma empresa privada", ponderou.

Ele ainda lembrou que o fundo previdenciário da empresa, o Postalis, tem déficit de R$ 13 bilhões por conta de problemas de gestão. "O trabalhador que esperava receber benefício de R$ 4 mil, hoje recebe R$ 3 mil", comentou.

Competição

O chefe de gabinete da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Guilherme Theo Sampaio, acusou os Correios de prejudicar a competitividade no setor e desequilibrar o mercado. "A empresa tem imunidade tributária e seus veículos não são parados pela fiscalização rodoviária", observou.

Ele defendeu a abertura do mercado de serviços de entrega para empresas de transporte de cargas, mantendo o monopólio das correspondências.

O diretor de Privatizações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Leonardo Cabral, afirmou que o projeto de desestatização prevê a prestação de serviços postais por regime de concessão, com a responsabilidade de universalizar o atendimento. "Haverá metas em todo o Brasil, como está sendo feito no marco do saneamento", anunciou.

O governo ainda planeja vender o controle da companhia ao mercado para os serviços de encomendas.

Pandemia

Um dos autores do pedido de audiência pública, o deputado Helder Salomão (PT-ES) lamentou a discussão do tema durante a pandemia do coronavírus. "Deveríamos estar discutindo a vacinação e geração de empregos. A agenda do governo traz temas que estão fora das reais necessidades do povo deste momento."

O deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP), que foi designado relator do PL 591/21 na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados, afirmou que uma empresa de capital misto poderia gerar R$ 4 bilhões em impostos. Ele defendeu a manutenção do monopólio por cinco anos para permitir a reorganização dos Correios.

"O novo marco do serviço postal deve salvar os Correios, que perdem valor ao longo do tempo. É um patrimônio nosso. Devemos abrir, receber investimentos e concorrer em outros países da América Latina", disse Fonteyne.

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