Barra da Tijuca vazia: início da pandemia fez comércio retrair 2,5% em março (Ricardo Moraes/Reuters)
Agência O Globo
Publicado em 2 de junho de 2020 às 07h20.
No mesmo dia em que a capital do Rio ultrapassou os 30 mil casos de infectados pelo novo coronavírus, com 3.671 mortes, o prefeito Marcelo Crivella anunciou o plano de reabertura da economia e redução das medidas de isolamento social. As mudanças, que vão ser implementadas em seis fases, começam nesta terça-feira, quando os cariocas poderão voltar a andar no calçadão e a fazer atividades esportivas individuais no mar, como natação ou surfe (ainda está vetado permanecer na areia ou dar um mergulho). Lojas de móveis, agências de automóveis e hotéis também poderão levantar as portas. A prefeitura liberou ainda o funcionamento de templos religiosos, mas a Justiça barrou, na semana passada, a iniciativa, e, nesta segunda-feira, negou recurso do município.
A previsão é que cada uma das seis fases dure 15 dias, fazendo com que o plano só deva ser concluído em agosto. A prefeitura salientou, porém, que as medidas poderão ser adiantadas ou adiadas, de acordo com a capacidade da rede hospitalar de absorver casos de Covid-19. Por isso, o monitoramento do número de infectados, de óbitos e de leitos disponíveis será diário.
Se o cronograma inicial for mantido, as aulas começarão a ser retomadas, gradativamente, a partir de julho. No primeiro momento, serão liberadas as turmas do quinto ao nono ano, com rodízio de alunos. Estudantes do ensino médio e de universidades só deverão voltar às atividades na sexta fase, em meados de agosto, caso não haja mudanças.
Os shoppings centers poderão reabrir as portas na segunda fase, daqui a duas semanas, mas com horário restrito, das 12h às 20h, e com apenas um terço da capacidade de estacionamento. Neste período, as praças de alimentação só poderão funcionar para delivery. O comércio só voltará totalmente a partir da quinta etapa. Bares e restaurantes, por sua vez, só poderão receber clientes na fase três, com metade da capacidade.
Segundo Crivella, um dos motivos para decidir pela reabertura foi a ausência, neste momento, de fila por vaga em UTIs na rede pública municipal. Os pacientes que ainda precisam ser internados, segundo ele, estão aguardando por motivos secundários, como falta de ambulância para a transferência. Na capital, a fila chegou a mais de 500 pessoas. O estado pretendia fazer a retomada da economia no dia 8, mas uma reunião nestsa segunda debateu se a data será mantida.
Para entidades de comércio e do setor de turismo, o momento agora é de expectativa e adaptações. A Associação Brasileira de Shopping Centers, por exemplo, fez uma cartilha com 20 orientações a lojistas, entre elas, o reforço da higienização. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Rio de Janeiro lançou uma cartilha com recomendações aos estabelecimentos, preconizando até distância mínima entre as mesas. O desafio é saber se todos vão reabrir: segundo Pedro Hermeto, presidente entidade, a previsão é que o setor tenha 20% de quebra. Para Alfredo Lopes, presidente de Associação de Hotéis do Rio, a reabertura hoje não beneficia nem prejudica:
— Ainda vai demorar para voltarmos a receber turistas. Isso só deve acontecer a partir de setembro.
A flexibilização anunciada pelo prefeito Marcelo Crivella é vista com preocupação por especialistas. O epidemiologista Roberto Medronho, da UFRJ, teme uma explosão de casos de Covid-19 no Rio com o afrouxamento.
— Não é para abrir. É para fechar mais — opinou ele, destacando que a queda do número de internações não significa redução do número de mortes. — Temos visto um número de óbitos em casa bem maior do que o ano passado.
Medronho ressalta que o Rio atingirá o pico do novo coronavírus quando registrar entre 55 e 56 mil casos, o que deve acontecer ainda esta semana:
— Mesmo os países europeus que fizeram a abertura na descendência (da curva de casos), com a população bem treinada para isso, o número de casos subiu. Aqui, eu tenho muito medo que exploda. Nenhum país do mundo abriu na ascendência da curva — disse ao Bom Dia Rio, da Rede Globo.
O médico infectologista e professor da UFRJ Rafael Galliez, contrário à reabertura econômica, também destaca o alto número de óbitos domiciliares “sem causa definida” durante a pandemia.
— Além dos óbitos, os estudos mostram que o índice de reprodução do vírus hoje no Rio ainda é alto, então se aumentar a mobilidade da população nas ruas agora vai ser jogar gasolina no processo.
Para especialistas, o relaxamento do isolamento social deveria aguardar mais cerca de duas semanas. Professor do Instituto de Medicina Social da UERJ, o médico Mario Roberto dal Poz chama de precipitada a abertura feita pela prefeitura:
— O mais correto seria levar essas medidas para além do dia 8, quando a curva deve chegar ao platô —avalia dal Poz, para quem o anúncio do prefeito fez muitos comerciantes “se sentirem autorizados” a abrir, mesmo fora do cronograma.
O professor teme ainda que falte controle sobre os moradores da cidade em relação ao cumprimento das regras, principalmente nas praias.