Brasil

Jun/2016: Com frio recorde, GCM retira cobertor de moradores de rua

Na madrugada mais fria de São Paulo, Guarda Civil Metropolitana recolhe cobertores e papelão dos moradores de rua

Morador de rua em São Paulo: GCM admitiu que recolhe colchões e cobertores para evitar a "privatização" das calçadas (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Morador de rua em São Paulo: GCM admitiu que recolhe colchões e cobertores para evitar a "privatização" das calçadas (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

DR

Da Redação

Publicado em 14 de junho de 2016 às 08h14.

Última atualização em 8 de julho de 2019 às 08h32.

São Paulo - Após o dia mais frio registrado na capital paulista em 22 anos, com 3,5°C de temperatura mínima, moradores de rua reclamaram de ter colchões e papelões, usados como proteção, levados por agentes da Guarda Civil Metropolitana.

A GCM admitiu a retirada de itens, mas afirmou que deixa objetos pessoais e a ação é para evitar que a população de rua "privatize" espaços públicos, como calçadas. Na segunda-feira, 13, mais um homem foi achado morto na rua, na região central.

A Pastoral do Povo de Rua, pertencente à Igreja Católica, afirma que pelo menos cinco pessoas já morreram na capital por causa do frio - a Prefeitura não confirma. Ontem, um morto foi achado na Rua Amazonas, no Bom Retiro, por volta das 14 horas.

Mais duas vítimas foram encontradas anteontem no bairro de Santana, zona norte. Nenhum deles foi identificado até o fim da noite de segunda-feira.

Anteriormente, haviam sido relatados os óbitos de Adilson Roberto Justino, achado morto na calçada da Avenida Paulista (região central) anteontem, e João Carlos Rodrigues, de 55 anos, encontrado por seguranças do Metrô na Estação Belém (zona leste), na sexta-feira.

O comandante da GCM, inspetor Gilson Menezes, disse que seus agentes apoiam as ações das subprefeituras para evitar a permanência de barracas nas ruas da cidade e, por isso, retiram papelões.

"Damos auxílio nesse trabalho de remoção de material inservível. E são retirados os colchões, realmente. É para tirar moradias precárias. A ideia de retirar os colchões é evitar que o espaço público seja privatizado. Porque existe também uma demanda de reclamações de muitos cidadãos, que dizem que, muitas vezes, têm de andar no leito carroçável (a rua) porque têm dificuldade de caminhar pela calçada", afirmou o comandante.

Menezes, por outro lado, disse que há duas normas internas da GCM que regulamentam a remoção do material e vetam expressamente a retirada de cobertores. "Isso seria condenável, ainda mais nesses dias frios", afirmou.

"Nenhum morador de rua é importunado à noite na cidade de São Paulo. Ao contrário, o trabalho da GCM no período noturno é orientar as pessoas a procurar um abrigo e, caso solicitem, auxiliar no encaminhamento dessa população", garantiu o chefe da Guarda.

Ele reconheceu, no entanto, que os guardas-civis, pelas manhãs, auxiliam agentes das subprefeituras em um trabalho de "reorganização do espaço público".

Frio

Alvo dessas operações, os moradores de rua afirmam que tudo o que juntaram para escapar do frio é levado pelos guardas, incluindo as proteções de papelão.

"Eles passam aqui às 7 horas. O que a gente ainda não guardou, eles levam", contou a moradora de rua Sara Patrícia, de 49 anos, que vive na Praça 14 Bis, no Bexiga, região central.

Dona de cinco cães e quatro gatos, a moradora afirmou que não teria com quem deixar seus animais de estimação caso fosse para os abrigos municipais.

Ainda na praça, outro morador de rua, João da Luz, de 60 anos, disse que, há duas semanas, seus papelões, madeira e cobertores foram levados. "Já arrumei outros, mas agora deixo em um bar aqui perto."

Na zona leste, a também moradora de rua Ana Paula de Jesus Souza, de 37 anos, relatou que teve cobertores, roupas e até documentos e remédios levados por guardas. "Estava tudo no meu carrinho. Tinha comida, remédio, ração para os cachorros", reclamou.

Após o padre Julio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua, postar um vídeo no Facebook sobre o caso e cobrar explicações do prefeito Fernando Haddad (PT), ela afirmou que o material foi devolvido.

Ontem, sem meias e enrolada em três edredons sujos, ela tossia enquanto explicava por que não queria ir para abrigos. "Lá, tenho de acordar muito cedo e não consigo caminhar de volta para cá por causa da artrose."

Na periferia

Já Lancellotti reclamou do fechamento de vagas de acolhida emergenciais nas áreas centrais, transferidas para bairros mais afastados. Ele citou um abrigo que funcionou até o ano passado sob o Viaduto Guadalajara, no Belenzinho.

O Estado visitou o local ontem e encontrou famílias desalojadas de outras ocupações. O espaço, da Prefeitura, foi cedido à Igreja Católica por 99 anos.

A secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, Luciana Temer, afirma que chegou a negociar com a Pastoral da Rua o uso do espaço como abrigo neste inverno, e não conseguiu - por causa da invasão.

"O abrigamento da população de rua embaixo de viadutos não está de acordo com a política nacional", ressaltou a secretária.

Ela afirmou ainda que a Prefeitura abriu 1.517 vagas de emergência nos abrigos e a descentralização é uma demanda do Comitê para a População de Rua.

Próximos dias. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), as temperaturas devem subir um pouco nesta semana: com mínima de 11ºC amanhã e 12° C na quinta-feira.

(Colaborou Fábio de Castro)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:cidades-brasileirasFernando HaddadFrioMetrópoles globaisPolítica no BrasilPolíticos brasileirosPrefeitossao-paulo

Mais de Brasil

G20: Argentina quer impedir menção à proposta de taxação aos super-ricos em declaração final

Aliança Global contra a Fome tem adesão de 41 países, diz ministro de Desenvolvimento Social

Polícia argentina prende brasileiro condenado por atos antidemocráticos de 8 de janeiro

Homem-bomba gastou R$ 1,5 mil em fogos de artifício dias antes do atentado