Hackers: parlamentares da base e da oposição pretendem explorar politicamente a prisão dos suspeitos de invadir celulares de autoridades (Oliver Nicolaas Ponder / EyeEm/Getty Images)
Mariana Martucci
Publicado em 29 de julho de 2019 às 09h00.
Última atualização em 29 de julho de 2019 às 09h43.
Brasília — Parlamentares da base e da oposição no Congresso pretendem explorar politicamente a prisão de quatro suspeitos de invadir celulares de autoridades dos três Poderes, incluindo o presidente Jair Bolsonaro. Uma das ideias é utilizar a recém-criada CPI das fake news para interrogar os presos.
A comissão ainda não começou a funcionar. Os partidos precisam indicar os nomes que vão integrar o colegiado, o que só deve ocorrer a partir da segunda semana de agosto, após o fim do recesso parlamentar.
O líder da bancada da bala, Capitão Augusto (PL-SP), no entanto, já avisou que pretende fazer parte. "E vou apresentar o requerimento para que todos os envolvidos sejam ouvidos", disse ele à reportagem.
Um dos focos dos parlamentares é descobrir se os ataques foram encomendados e tiveram motivação política. Desde o início de junho, o site The Intercept Brasil e outros veículos de imprensa têm publicado supostas trocas de mensagens obtidas nas contas do aplicativo Telegram de integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Segundo o site, as conversas indicam conluio entre procuradores e o então juiz do caso e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro. Os alvos dos ataques negam irregularidades e afirmam não ser possível confirmar a autenticidade dos diálogos.
Em depoimento à Polícia Federal, Walter Delgatti Neto, conhecido como "Vermelho", afirmou que a ex-deputada federal Manuela D'Avila (PCdoB-RS) foi quem intermediou o contato com o jornalista Glenn Greenwald, fundador do The Intercept Brasil. Ele disse não ter recebido pagamento para repassar as mensagens.
"Queremos saber de onde veio o dinheiro que foi encontrado na conta dos hackers", disse Augusto, em referência aos mais de R$ 627 mil movimentados nas contas de Gustavo Henrique Elias Santos e Suelen Priscila de Oliveira, outros dois presos na Operação Spoofing.
Se os investigados forem convocados, não será a primeira vez que a Câmara vai sabatinar presos. Em 2015, um grupo de deputados da CPI da Petrobras foi a Curitiba ouvir alvos da Lava Jato.
Anos antes, em 2012, o contraventor Carlos Augusto dos Santos, o Carlinhos Cachoeira, foi ao Congresso também quando estava preso mas, amparado por um habeas corpus, ficou calado diante dos parlamentares.
O líder do Podemos, José Nelto (GO), defende prioridade ao assunto logo que a Câmara retomar os trabalhos. "Esse fato deve ser o primeiro a ser discutido no colégio de líderes: quem são os mandantes, quem ganhou, quem tá falando verdade ou mentindo?" questionou o deputado. "Ou o Congresso age ou ficará desmoralizado."
Na lista de alvos dos hackers, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também defende usar a CPI para investigar os ataques.
"Combater este crime não é dever só da polícia, o legislador também deve colaborar com soluções e leis mais transparentes para o bem de todos. É isso que queremos debater na CPMI que vai investigar as notícias falsas no Congresso", escreveu o senador em seu Twitter. Além de Alcolumbre, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi vítima dos ataques virtuais.
Na oposição, o foco deverá ser a atuação de Moro no caso. O líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), defende uma nova convocação do ministro. "Cresce a possibilidade de uma CPI para investigar os diálogos", disse.
Parlamentares também questionam se o ministro teve acesso à lista de alvos dos hackers, uma vez que a investigação da PF ainda está sob sigilo.
Na semana passada, Moro telefonou a algumas das vítimas para comunicar os ataques. Ele também sugeriu que as mensagens seriam destruídas por terem sido obtidas de forma ilegal, o que também deve ser alvo dos opositores.
O líder do PCdoB na Câmara, o deputado federal Orlando Silva (SP), afirmou que já há um requerimento pronto para convocar o ministro da Justiça a prestar esclarecimentos. Segundo Orlando, a atitude de Moro configura "ilegalidade flagrante" e quebra de sigilo funcional.
"Os dois lados vão explorar as consequências, mas está cada vez mais complicado para a oposição porque os vínculos com os hackers estão ficando cada vez mais evidente", afirmou o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO).