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Casas de parto da periferia de SP são opção para gestantes

A cesárea, cuja taxa no Brasil é a maior do mundo (44%), não tem vez nas casas de partos, que atendem gestantes com gravidez de baixo risco

Atividades físicas fazem parte da preparação oferecida pela Casa Angela a gestantes que buscam o parto normal (Marcelo Camargo/ABr)

Atividades físicas fazem parte da preparação oferecida pela Casa Angela a gestantes que buscam o parto normal (Marcelo Camargo/ABr)

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Da Redação

Publicado em 22 de outubro de 2012 às 09h50.

São Paulo – Um corredor com um jardim bem cuidado conduz as gestantes à sala de estar onde uma mesa com suco, frutas e bolos foi preparada especialmente para recepcioná-las. Reproduzir o aconchego do lar na etapa final da gravidez é a proposta da Casa Angela, uma das duas casas de parto de São Paulo, localizada no Jardim Mirante, na periferia da zona sul da capital paulista.

O vocativo “mãezinha”, como costumam ser chamadas as gestantes em hospitais, é substituído por Marlene, Suzana, Cristina. Mães, pais e bebês têm rostos e nomes nesses locais, e eles têm, sobretudo, vontades.

É esse clima de naturalidade no momento de dar à luz e de respeito às necessidades da família que tem feito mulheres optarem pelas casas de parto em vez de recorrerem a hospitais bem equipados.

“Fiquei assustada quando voltei a morar no Brasil e descobri que, caso fizesse meu parto em hospital particular, teria até 90% de chance de passar por uma cesariana”, relata a administradora de empresas Marlene Ábila, 32 anos, que teve seu filho Ramon na Casa Angela, em janeiro deste ano.

A casa atende apenas mulheres com gravidez de baixo risco, que não passam por procedimentos cirúrgicos ou intervenções médicas para dar à luz.

O relatório Situação Mundial da Infância 2011, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mostra que a taxa de cesárea no Brasil é a maior do mundo, com 44%. De acordo com o Ministério da Saúde, considerando apenas a rede privada, esse percentual quase dobra e chega a 80%. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que as cirurgias correspondam a, no máximo, 15% dos partos.

Marlene relata que pôde comparar os serviços da casa de parto aos de um hospital, quando o filho Ramon precisou tratar uma doença. “Lá, eu era a mãezinha e meu filho o RN [recém-nascido], já que ele ainda não tinha certidão de nascimento. Na casa de parto, sempre fomos Marlene e Ramon, senti como se estivesse parindo em casa”, lembra.


A unidade funciona 24 horas. A equipe é formada por oito enfermeiras-obstetras, técnicos de enfermagem, psicólogo, fisioterapeuta e massagista. Podem ser feitos até quatro partos simultaneamente. Os quartos dispõem de camas hospitalares e de equipamentos que podem ser utilizados pelas mulheres no momento do parto, como banheira e bancos adaptados.

O ambiente acolhedor fez a enfermeira Camila Nogueira Rodrigues optar por trabalhar na Casa Angela. “Fiquei muito impactada pela falta de sensibilidade nos hospitais, que tipo de lugar era aquele que os pais só podem ver o bebê por meia hora? A dinâmica hospitalar é muito rápida e acaba por não respeitar o tempo das mulheres.”

“Em geral, a cultura do parto no Brasil, principalmente nos hospitais particulares, é extremamente intervencionista. Todo o saber de como acompanhar o parto normal desapareceu no ambiente hospitalar”, avalia a coordenadora-geral da Casa Angela, Anke Riedel. Ela relata que os partos naturais duram, em média, 12 horas, enquanto uma cesariana leva apenas de 30 a 40 minutos. “Existem vários motivos para que isso ocorra, mas a principal é a questão do lucro, pois o parto normal requer todo um cuidado e acompanhamento que não é bem pago”, aponta.

A Casa Angela é vinculada à organização não governamental (ONG) Monte Azul, que atua há 35 anos na comunidade, e atende gratuitamente mulheres das regiões do M'Boi Mirim e Campo Limpo. Para gestantes de outras localidades, é feita uma avaliação para saber se elas têm condições de arcar com os custos do atendimento. “Nossa intenção era manter a casa integrada ao serviço público de saúde, mas, diante da impossibilidade, essa foi a forma que encontramos de conseguir atender mulheres carentes”, explica Anke Riedel. Para quem pode pagar, são cobrados R$ 3,5 mil para o pré-natal e o parto. Quem desejar cuidados extras durante o pós-parto, como o acompanhamento pediátrico do bebê – tem de arcar com mais R$ 500.

De fevereiro, quando a Casa Angela começou a funcionar, a setembro deste ano, foram feitos 100 partos na casa. A coordenadora-geral da casa explica que é possível fazer até 40 partos por mês. Segundo ela, 50% das mulheres atendidas vêm de outras localidades. Anke Riedel avalia que muitas mães da região procuram o serviço por ser uma opção gratuita. “As mulheres que vem de fora sabem o que querem, se informaram muito para ter um parto humanizado. As que são daqui vêm porque encontram um atendimento muito diferenciado, individualizado”, avalia.


Antes do parto, as gestantes passam por, pelo menos, seis consultas de pré-natal na própria casa. A administradora Suzana Silva de Sousa, 24 anos, fez a última no dia 2 de outubro. No plano de parto – um questionário em que as mães dizem como imaginam o momento de dar à luz – Suzana escolheu dividir esse momento com o marido e a mãe. “São as duas pessoas que me passam confiança. Vamos colocar velas aromáticas para deixar o ambiente agradável. Estou tranquila”, contou. Suzana está na 40ª semana de gestação e aguarda a chegada de Tamires a qualquer momento.

Na cidade de São Paulo, a Casa de Parto de Sapopemba faz um trabalho semelhante. Localizada na zona leste da capital, a estrutura é mantida pela prefeitura. O casal Rafael Vieira da Silva, 29 anos, e Camila Inês Rossi, 27 anos, escolheu o espaço para o nascimento da filha Anisha Raiz, que hoje tem 1 ano e 4 meses. Eles conseguiram criar o ambiente que haviam planejado para o momento. “Estendemos tecidos pela sala, cantamos, ouvimos mantras. Foi muito lindo”, conta a mãe.

Para Camila, a presença do companheiro foi essencial para aumentar a confiança no momento do parto. “A gente diz que pariu junto. O corpo do Rafael junto do meu fez toda a diferença. A gente fez isso junto. Ele precisava estar lá comigo”, relata. Segundo ela, o pai acompanha todo o procedimento na casa e o bebê, logo após o nascimento, vai para os braços da mãe.

Tanto na casa do Jardim Mirante quanto na de Sapopemba uma ambulância fica disponível para casos em que a transferência para hospitais seja necessária. Anke Riedel destaca, no entanto, que, até agora, não foi preciso recorrer ao veículo para casos de emergência. “Utilizamos em situações bem tranquilas, quando verificamos, no trabalho de parto, que não havia condições de fazê-lo na casa”, relata citando situações como a mudança de posição da criança durante o procedimento. Segundo ela, a transferência para o hospital da região leva, no máximo, dez minutos.

Na opinião de Camila Rossi, a participação de médicos no parto deve ser o último recurso. “Quando é necessário intervenção, que bom que existem os médicos, mas isso deve ser a exceção. Para algo que é natural, não é necessário procedimento cirúrgico. Gravidez não é doença.”

A coordenadora da Casa Angela reforça que o parto humanizado torna as mulheres protagonistas nesse momento. “Esse trabalho fortalece muito os vínculos afetivos e torna a mulher um sujeito ativo desse processo”, avalia.

Durante quatro dias a reportagem da Agência Brasil entrou em contato com a Secretaria de Saúde da prefeitura de São Paulo, responsável pela Casa de Parto de Sapopemba, mas não conseguiu autorização para visitar o local, assim como não obteve as informações sobre o funcionamento e o número de partos feitos por mês.

Camila Rossi, que teve bebê no local, avalia que não há interesse por parte do governo municipal em divulgar a unidade. “É um serviço muito boicotado. O telefone de lá muda sempre. Se qualquer hospital quiser fazer a divulgação dos seus serviços, isso é super bem visto, mas na casa de parto, não”, criticou.

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