Moradores da zona sul de São Paulo participam da 18ª Caminhada pela Vida e pela Paz (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 2 de novembro de 2013 às 15h36.
São Paulo – “Porque atirou em mim?” era a pergunta que os moradores da região do Jardim Ângela, zona sul paulistana, levavam escritas em camisetas brancas e repetiram em refrão ao saírem em passeata na manhã de hoje (2).
O ato, que ocorre todos os anos no Dia de Finados, começou como uma reação à violência que afligia o bairro na década de 1990. Neste ano, as centenas de manifestantes que saíram da Paróquia Santos Mártires e foram até o Cemitério Jardim São Luís prestaram solidariedade à comunidade da Vila Medeiros, zona norte, onde o estudante Douglas Rodrigues foi morto por um policial no último dia 27.
Segundo a Polícia Militar, Douglas foi baleado acidentalmente durante uma abordagem. A mãe do jovem diz que, antes de morrer, o estudante questionou o motivo do disparo. Desde então, a frase tem sido difundida nas redes sociais como um bordão contra a violência policial. “Eles [moradores da Vila Medeiros] nos pediram em comunhão, em solidariedade, para assumir a campanha em que eles estão usando as últimas palavras do menino antes de morrer”, explicou o padre responsável pela Paróquia Santos Mártires, Jaime Crowe. “A nossa caminhada é buscar forças e juntar ânimo, porque a paz é um caminho que temos que construir”.
Nos 18 anos em que a caminhada é feita, Crowe diz que viu aos poucos a realidade do bairro melhorar, apesar da região ainda ser uma das mais violentas da cidade. O padre atribui a evolução às ações da comunidade ao crescimento dos investimentos do Poder Público. “A soma das pequenas ações na região e algumas grandes, como a presença do Hospital M'Boi Mirim, que cria perspectivas para as pessoas da região”, cita ao relacionar os fatores, que na sua opinião, ajudaram a reduzir o número de homicídios de 130 para cada 100 mil habitantes, em 1996, para 25 nos últimos indicadores.
Para continuar reduzindo a violência, o padre defende um policiamento que esteja mais próximo à comunidade. “A gente luta por uma nova polícia. Não uma Polícia Militar. Uma polícia que seja integrada na comunidade. Um policial que é conhecido pelo nome, não só pela farda”, ressalta.
O professor de psicologia da Universidade de São Paulo Luis Galeão veio da zona oeste para participar do ato. “Só a comunidade organizada que vai conseguir diminuir esses índices de violência. Já diminuiu muito, mas ainda tem muito a diminuir”, disse, ao responder porque participava da passeata.
Para Galeão, o caso de Douglas é um exemplo do que acontece cotidianamente também no Jardim Ângela. “Muitos jovens morrem aqui sem qualquer notícia sair nos jornais ou sem qualquer comoção. Então, acho importante, quando se tem uma situação como essa, que houve comoção, que todo mundo relembre isso. Ninguém deve morrer por um tiro, acidental ou não, da polícia”.
Robson Batista, educador em um serviço que atende crianças vítimas de violência no bairro, acredita que para enfrentar a violência é preciso trabalhar com os núcleos familiares. “Trazendo a paz para o lar, a gente vai conseguir ter pessoas mais pacíficas, independente de ser um policial ou um menino que não teve oportunidades e resolveu ir para o crime”, disse.