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"Caixa 2 é crime grave", diz vice-procurador-geral eleitoral

Para Nicolao Dino, "caixa 2 é crime, que precisa ser adequadamente punido na legislação"

Nicolao Dino: problema com a proposta de lista fechada é garantir democracia interna nos partidos (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Nicolao Dino: problema com a proposta de lista fechada é garantir democracia interna nos partidos (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 27 de março de 2017 às 09h58.

Brasília - Em meio a movimentações no Congresso para tentar articular anistia a punições para doação não declarada de campanha, o vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, disse em entrevista que não vê "como separar caixa 2 e corrupção". "Ambas são condutas graves, implicam abuso de poder."

Na semana passada, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, disse que o debate sobre a anistia ao caixa 2 pode ser feito no Congresso em "momento oportuno" e comparou a aprovação de uma norma sobre o tema à lei de repatriação de recursos. Para Dino, "caixa 2 é crime, que precisa ser adequadamente punido na legislação".

Sobre a possibilidade de o Congresso aprovar um projeto para adotar lista fechada em 2018, o procurador afirmou que é preciso amadurecer a "democracia interna dos partidos".

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, fez uma defesa enfática da lista fechada, mas o tema é polêmico. Qual a avaliação do senhor sobre o assunto?

Tem problemas. Tem de ter amadurecimento de democracia partidária. Os partidos têm de praticar mais democracia sob o ponto de vista interno, para que as listas eventualmente definidas tenham legitimidade.

Quem definiria a lista?

Esse é o ponto. Acho que você não pode separar democracia interna nos partidos de formação de lista pré-ordenada. Uma coisa pressupõe a outra. Para você ter listas pré-ordenadas com uma boa dose de legitimidade, tem de ter democracia interna nos partidos. E tem de ter partidos fortes, mas ainda haverá um outro problema: a eleição de contrabando. Você define nomes que não necessariamente queria que estivessem compondo a lista. Como é que resolve? Uma sugestão é criar um mecanismo dentro de uma lista pré-ordenada que possibilite ao eleitor a partir de um determinado quantitativo de votos alterar a ordem. É um modelo híbrido. Algo parecido com o voto distrital misto. Existem precedentes. Estabelece uma espécie de janela para que a vontade do eleitor em relação a determinados candidatos possa também ser determinante no processo de definição dos eleitos. E não apenas o que foi preestabelecido pelo partido.

Seria precipitado adotar a lista fechada já em 2018?

Pelo que foi dito e está sendo discutido, me parece que a ideia não é bem essa. Há uma regra de transição. Temos de enfrentar os desafios. Estamos num Estado em que do jeito que está, pior não ficará. A situação é de absoluta descrença na forma como as eleições são praticadas. Temos problema de financiamento, de representatividade dos partidos, na definição do modelo de representação. Agora, qual será a melhor solução para 2018, 2020 ou 2022, o Parlamento dirá.

Dá tempo de fazer uma reforma política para valer em 2018?

Para ter validade, as alterações terão de ser implementadas até setembro. O debate não é novidade. O elemento novo é a deliberação de que será preciso fazer uma reforma mais estrutural. Todos esses temas vêm sendo objeto de questionamento no Parlamento há várias legislaturas. O debate está maduro. É consensual que o sistema, tal como posto, está falido. A reforma é inexorável.

Investigados na Lava Jato vêm defendendo a lista fechada. O próprio ministro Barroso vê risco de efeito colateral. Como o sr. avalia o fato de lideranças sob suspeitas tentarem se aproveitar da lista para garantir blindagem?

Não emito posições em relação a esses aspectos circunstanciais. Estamos discutindo modelos e eles estão postos. O Brasil está aprendendo com esses modelos que já estão sendo exercitados em vários países. O Parlamento é o espaço democraticamente estabelecido para que esse tipo de debate se estabeleça.

Para o sr. caixa 2 é crime?

Caixa 2 é crime, caixa 2 é um desvalor de conduta que precisa ser adequadamente punido na nossa legislação. É objeto de reprovação, não há dúvida alguma. Ele desiguala a disputa eleitoral. É abuso de poder, abre a porta para troca de favores. O caixa 2 em tudo é negativo, é nefasto para o processo democrático.

Mas existe uma discussão para separar caixa 2 e propina...

Isso parece aquela frase de um célebre político brasileiro: "Estupra, mas não mata". O caixa 2 é tão grave quanto, não há como fazer essa separação sob o ponto de vista ontológico, não há como fazer a separação entre caixa 2 e corrupção, ambas são condutas graves, porque ambas implicam desequilíbrio na disputa, ambas maculam a legitimidade do processo eleitoral, ambas implicam abuso de poder e ambas implicam frustração do eleitorado em relação àquilo que ele pretende em termos de realização de democracia. Não há eufemismo possível para caixa 2. Temos de encarar isso com a realidade necessária e estabelecer os mecanismos de responsabilização adequados para esse tipo de conduta que é absolutamente nociva para o processo democrático.

O sr. está otimista de que haverá saída dessa atual situação?

Acho que a gente tem de ser otimista, sim. Acreditar numa solução melhor, num caminho melhor, eu acho que é um compromisso das instituições. Quem acredita na democracia tem de ser otimista e eu sou uma pessoa que, antes de qualquer coisa, sou otimista.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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