Brasil

Brasil poderia investir 20 vezes mais em IA com fim dos supersalários

OPINIÃO | Resolver o problema dos supersalários é o primeiro passo para avançarmos em uma ampla modernização do estado brasileiro que engloba melhor qualidade dos gastos, estruturação das carreiras e gestão do desempenho

Tadeu Barros
Tadeu Barros

Colunista

Publicado em 29 de março de 2024 às 06h11.

O Brasil poderia multiplicar por 20x o investimento em IA generativa se acabasse com os “supersalários” no serviço público. De modo simplificado, são chamados de “supersalários” as remunerações de servidores públicos que ultrapassam o limite estabelecido por lei, atualmente fixado em R$ 44 mil, o teto do funcionalismo. Isso acontece porque uma elite do funcionalismo turbina seus vencimentos com penduricalhos, como férias de 60 dias, “auxílio-creche”, “auxílio-aluguel” e até "auxílio-paletó".

Um estudo recém-lançado pelo Centro de Liderança Pública, com dados da PNAD Contínua de 2023 e da RAIS de 2021, aponta que o impacto dos supersalários nas contas públicas chega a R$ 3,8 bilhões por ano. Estamos falando de cifras que poderiam estar sendo investidas setores básicos, como saúde, educação, segurança, meio ambiente e — por que não — em tecnologia?

Os R$ 3,8 bilhões representam 22x mais do que os R$ 170 milhões anunciado pelo governo federal por meio do Finep Mais Inovação — órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) — em subsídios econômicos para empresas que desenvolvem tecnologias digitais em IA, projetos de robótica e tecnologias quânticas.

Sistemas de IA já são usados em vários âmbitos da nossa vida social e há uma oportunidade imensa para o Brasil se destacar nesta corrida. Segundo a consultoria IDC, as despesas com modelos generativos devem alcançar US$ 120 milhões (aproximadamente R$ 596 milhões) em toda a América Latina, com o Brasil sendo responsável por grande parte desta soma.

Se por um lado há o potencial avanço sem precedentes de crescimento tecnológico no país, do outro existe o retrocesso de uma pequena parcela de 0,3% de servidores públicos ativos que acumulam milhões com penduricalhos às custas do dinheiro público. Hoje, o Judiciário é o Poder mais privilegiado quando falamos de supersalários. São mais de 107.291 servidores que ultrapassaram o limite em algum momento, culminando nos gastos extras para a administração.

Essa ínfima parcela não representa a maioria dos funcionários públicos, que recebem salários modestos e trabalham diariamente para melhorar os serviços básicos oferecidos à população. Utilizar de um instrumento como penduricalhos é indesejável sob os aspectos moral, fiscal e social. Parece óbvio que, se existe um teto constitucional para os salários dos servidores, ele deve ser cumprido, caso contrário não precisaria haver um teto.

Em 2021, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que tinha como objetivo combater os supersalários do funcionalismo, limitando o pagamento de auxílios e benefícios. Desde que recebeu o aval da Câmara, a proposta está “arquivada” há dois anos e oito meses na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça do Senado) à espera de um relator.

Resolver o problema dos supersalários é o primeiro passo para avançarmos em uma ampla modernização do estado brasileiro que engloba melhor qualidade dos gastos, estruturação das carreiras e gestão do desempenho. De nada adianta eliminar benefícios injustificáveis no setor público se não valorizarmos os profissionais que transpiram diuturnamente em prol de melhores políticas públicas.

Ao mesmo tempo, não há uma regulamentação satisfatória que trate de forma completa da modernização do setor público — o texto da PEC 32/20 discutido recentemente pelo Congresso Nacional carece de uma série de melhorias.

O que há, certamente, é um cenário de consciência e maturidade por parte de toda a população que não se pode mais aceitar que o corporativismo dos supersalários prevaleça enquanto milhões de brasileiros estão desempregados. Essa é a nossa chance de começar a virar o jogo, apoiando pautas que resolvam os problemas mais urgentes do país.

Acompanhe tudo sobre:FuncionalismoReforma Administrativa

Mais de Brasil

STF rejeita recurso e mantém pena de Collor após condenação na Lava-Jato

O que abre e o que fecha em SP no feriado de 15 de novembro

Zema propõe privatizações da Cemig e Copasa e deve enfrentar resistência

Lula discute atentado com ministros; governo vê conexão com episódios iniciados na campanha de 2022