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Cai confiança de mais pobres em Bolsonaro; filhos e "despreparo" incomodam

Um terço dos eleitores com renda de até dois salários mínimos deixou de dar apoio ao presidente; desgaste é maior nas capitais e no Nordeste

Bolsonaro: quedas mais bruscas na avaliação positiva do governo se deram entre nordestinos e eleitores com baixa escolaridade e renda (Adriano Machado/Reuters)

Bolsonaro: quedas mais bruscas na avaliação positiva do governo se deram entre nordestinos e eleitores com baixa escolaridade e renda (Adriano Machado/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 29 de abril de 2019 às 11h12.

Última atualização em 29 de abril de 2019 às 11h39.

Brasília — Do início do mandato até abril, a aprovação ao governo do presidente Jair Bolsonaro caiu mais entre segmentos da população que resistiram a abraçar sua candidatura à Presidência da República.

Análise com base nas pesquisas do Ibope mostra que as quedas mais bruscas na avaliação positiva se deram entre nordestinos e eleitores com baixa escolaridade e renda.

Dentre os que se enquadram em um desses segmentos e chegaram a manifestar satisfação, boa parte já pulou do barco. Além disso, o movimento foi mais forte nas capitais.

Segundo Márcia Cavallari, diretora-executiva do Ibope Inteligência, Bolsonaro chegou a ganhar, logo depois da posse, um "voto de confiança" significativo mesmo em setores que, na eleição presidencial, penderam majoritariamente para Fernando Haddad (PT), como os mais pobres e os nordestinos.

"Nesses segmentos, porém, a identificação com Bolsonaro é mais frágil", observa ela. "A partir do momento em que o governo passa pelos primeiros desgastes, essa população manifesta seu descontentamento de forma mais rápida."

Desde a posse, o governo tem enfrentado disputas entre "olavistas" (seguidores do escritor Olavo de Carvalho, considerado guru de Bolsonaro) e militares na definição de políticas públicas e também dificuldades para construir uma base de apoio no Congresso — com prejuízo para a tramitação de projetos como a da reforma da Previdência.

No Nordeste, de cada dez eleitores que consideravam o governo bom ou ótimo, quatro já mudaram de ideia. No Sudeste e no Sul, esse movimento também se observa, mas com menor intensidade: três e dois de cada dez, respectivamente, já deixaram de manifestar aprovação.

Na segmentação do eleitorado por renda, a insatisfação cresce de forma mais veloz nas faixas mais baixas. Entre os mais pobres (que ganham até dois salários mínimos) que aprovavam o governo em janeiro, um terço já mudou de opinião. Entre os que ganham mais do que isso e também viam a gestão como boa ou ótima, apenas um quinto alterou essa percepção.

A queda na aprovação de Bolsonaro também foi mais expressiva nas capitais. Em janeiro, as taxas de satisfação nas capitais e no interior eram próximas: 47% e 51%. Em abril, passaram para 30% e 37%, respectivamente.

Morador de Salvador (BA), o empresário Vitorino Tourinho votou em Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018. Hoje, considera o presidente "sem preparo". O empresário compõe a amostra de eleitores que chegaram a aprovar o governo Bolsonaro e, com o passar do tempo, passaram a ver a sua gestão com ressalvas.

"Sou Bolsonaro por circunstâncias", diz Tourinho. "O capitão é, na verdade, um soldado, um cara que não tem preparo. Já vimos várias atitudes que demonstraram isso, como o tuíte do golden shower (publicação de Bolsonaro que mostrava um homem urinando em outro durante bloco de carnaval), as brigas com o vice-presidente, a interferência dos filhos. Eles estão jogando contra."

Filhos e "despreparo"

Ao avaliar os dados, Cavallari afirma que, de janeiro a abril, as taxas de avaliação do governo Jair Bolsonaro como ruim e péssimo subiram em todas as sondagens. Mas as taxas de ótimo e bom caíram só até março, e ficaram estáveis em abril, o que poderia indicar neste caso um piso para as avaliações.

"A insatisfação aumenta, mas a aprovação pode estar próxima de um piso. As próximas pesquisas vão mostrar o tamanho desse núcleo que mais aprova o governo", diz ela.

Governos recém-empossados despertam otimismo entre os eleitores, mesmo entre os que não votaram no vencedor. O que é raro, indica a análise das pesquisas do Ibope, é a "lua de mel" durar tão pouco.

Pelos dados, Bolsonaro não conseguiu manter por muito tempo a janela de boa vontade, o que é afirmado até por aqueles que votaram no candidato do PSL no ano passado.

O advogado Antônio Carlos Mello, de Lins, no interior paulista, diz ter votado em Bolsonaro para romper com um ciclo político encabeçado nos últimos anos por PT e PSDB.

Neste sentido, viu como positivas as escolhas dos ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. "O Bolsonaro estancou aquela sangria de dar verba para parlamentar a torto e a direito. Isso também foi bom."

O que tem incomodado o apoiador de Bolsonaro é a participação dos filhos no governo. "Por mais que o Carlos Bolsonaro goste do pai, ele não pode esquecer que é parlamentar (vereador) do Rio, tem de cuidar do trabalho dele lá. Ele fica interferindo e isso atrapalha", afirma. "Se ele quiser ir para Brasília, que espere mais quatro anos e tente", completou Mello.

Confiança

Com a queda da avaliação positiva e da aprovação ao modo de governar, caiu também a confiança na figura do presidente - 51% em abril, ante 62% em janeiro. Moradora de Salvador, a tecnóloga Dilmara Serafim optou por Bolsonaro no segundo turno das eleições do ano passado, mas diz que vê no governo um "despreparo administrativo".

Ela pondera, no entanto, que ainda é cedo para uma "ideia definitiva". "Vejo que tem boa intenção e espero que, com mais tempo, ele adquira capacidade." 

Outro segmento em que Bolsonaro perdeu mais apoio do que na média nacional é o de moradores de capitais e de cidades com mais de 500 mil habitantes, nas quais mais de três a cada dez apoiadores pularam do barco no período. O presidente se sai melhor em municípios pequenos e do interior, com 37% de avaliação positiva em ambos os casos. 

Eleitor de Bolsonaro no primeiro e no segundo turnos da eleição, o empresário paulistano Roberto Guariglia afirma não estar satisfeito com o que vê, principalmente na economia. Apesar de a escolha do candidato ter sido feita pela "falta de opção", como ele define, o empresário enxergou motivos para depositar o voto em Bolsonaro para além da motivação de "não continuar com o pessoal do PT no poder". 

"Foi o único que apareceu nessa safra de políticos novos que conseguiria encarar o cargo. Já tinha um histórico político que poderia ajudar no trâmite com o Congresso, e eu achava que seria capaz de fazer essa retomada econômica", diz. 

Ao fim do quarto mês de governo, a avaliação de Guariglia se inverteu. "Estou me sentindo abandonado, vejo que não vai dar em nada", diz.

"A reforma da Previdência é importante, mas existem outras coisas que poderiam estar em andamento, como a redução da taxa de juros e o apoio do BNDES para pequenas empresas." 

Polarização

Na média nacional, a avaliação positiva do presidente caiu 14 pontos porcentuais desde o início do governo. Isso significa que de janeiro a abril, a parcela dos brasileiros que consideravam a gestão boa ou ótima diminuiu de 49% para 35%.

A aprovação teve queda em todos os segmentos de renda, escolaridade, local de moradia e gênero — mas não no mesmo ritmo.

No segundo turno de 2018, Bolsonaro perdeu para Haddad na metade mais pobre da população. No mapa eleitoral, ele venceu em todas as regiões, menos no Nordeste. Diferenças nos padrões de voto conforme os fatores renda e geografia ficaram evidentes.

Passada a posse, a primeira pesquisa do Ibope mostrou uma suavização da polarização geográfica e de renda. No Nordeste, em janeiro, o governo era aprovado por 42% — sendo que, meses antes ele havia obtido só 28% dos votos totais (incluindo brancos e nulos) no segundo turno.

No Sudeste, a aprovação era de 50% - ante 57% de votação de Bolsonaro no segundo turno. Ou seja, eleitores do Sudeste e do Nordeste discordaram muito na eleição, mas pouco após a posse.

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