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Bolsonaro assina decreto flexibilizando posse de armas; veja o que muda

Principais mudanças são fim da comprovação da "efetiva necessidade" e alongamento do registro; porte segue proibido e não pode ser mudado por decreto

Presidente Jair Bolsonaro mostra a caneta em cerimônia de assinatura da flexibilização do posse de armas em 15/01/2018 (Ueslei Marcelino/Reuters)

Presidente Jair Bolsonaro mostra a caneta em cerimônia de assinatura da flexibilização do posse de armas em 15/01/2018 (Ueslei Marcelino/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 15 de janeiro de 2019 às 12h24.

Última atualização em 15 de janeiro de 2019 às 15h35.

São Paulo — O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta terça-feira (15) em cerimônia no Palácio do Planalto um decreto que altera as regras para a posse de armas de fogo no país.

A flexibilização vale para moradores de cidades em que os índices anuais de homicídio superam a taxa de 10 a cada 100 mil habitantes, além de áreas rurais. Três em cada quatro brasileiros vivem em áreas que se enquadram na definição do decreto.

A posse também foi liberada para servidores públicos que exercem funções com poder de polícia e proprietários de estabelecimentos comerciais ou industriais.

No caso de residências onde vivem crianças, adolescentes ou pessoas com deficiência mental, a nova legislação cria a obrigação de que "apresente declaração de que a sua residência possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento", mas não define um processo de fiscalização.

Quem se enquadrar em algum desses perfis poderá ter até quatro armas registradas. Além disso, a validade de registro de armas passou de 5 para 10 anos.

O registro pode ser revogado se for comprovado que o declarante forneceu informações falsas ou se tiver vínculos com organizações criminosas.

Especialistas em segurança pública ouvidos por EXAME apontam que a medida tende a aumentar a circulação de armas de fogo e piorar ainda mais a taxa de homicídios no país.

Em um breve discurso na cerimônia, que começou por volta de 12h15, o presidente destacou que a principal mudança é o fim da comprovação da "efetiva necessidade" de ter uma arma, que "beirava a subjetividade", segundo ele.

Apesar do limite de quatro armas, o texto do decreto acrescenta que não fica excluída "a caracterização da efetiva necessidade se presentes outros fatos e circunstâncias que a justifiquem, inclusive para a aquisição de armas de fogo de uso permitido em quantidade superior a esse limite, conforme legislação vigente".

Para ter a posse liberada, no entanto, estão mantidas a necessidade do atestado de capacidade técnica e de laudo psicológico, além da idade mínima de 25 anos e de não ter antecedentes criminais.

Esses requisitos estão previstos no Estatuto do Desarmamento, uma lei sancionada em 2003, que só pode ser modificada via Congresso.

Posse X porte

Não houve mudanças nas regras do porte de armas, que são a possibilidade de circular com a arma fora de casa, atualmente proibida para o cidadão comum.

Como está definida em lei, a regra do porte não pode ser flexibilizada via decreto, mas foi citado pelo presidente no discurso e deve entrar na pauta nos próximos meses, apesar de resistências da própria "bancada da bala".

Em relação ao recadastramento, Bolsonaro disse que isso pode ser tratado, futuramente, pela Polícia Militar e a Civil via convênios estabelecidos via Medida Provisória, uma vez que a “Polícia Federal teria sérias dificuldades para processar” o aumento na demanda dos pedidos.

Discurso

No discurso de hoje, Bolsonaro fez referência ao referendo de 2005 em que 63% dos brasileiros se manifestaram contra a proibição do comércio de armas e munições.

"Infelizmente o governo na época buscou maneiras em decretos e portarias a negar-lhes [ao cidadão] esse direito". 

Segundo ele, "o povo decidiu por comprar armas e munições e nós não podemos negar o que o povo quis naquele momento”.

Ele citou o apoio da chamada "bancada da legítima defesa" ao invés de usar o termo mais disseminado para o grupo que defende a flexibilização da posse, que é "bancada da bala".

O decreto foi redigido pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e finalizado na Casa Civil. Os ministros Sérgio Moro e Onyx Lorenzoni, das respectivas pastas, estavam presentes na cerimônia.

Com a assinatura, o presidente cumpre uma de suas principais promessas de campanha. Uma das marcas registradas de Bolsonaro é o sinal das armas com as mãos.

Hoje, ele brincou que usaria uma "arma" para assinar o texto mostrando uma caneta e disse que o decreto foi feito por "muitas pessoas de bem para que o cidadão de bem tenha sua paz dentro de casa".

Uma pesquisa do Datafolha em dezembro mostrou que 61% dos brasileiros são contra a flexibilização da posse de armas no país.

Veja o texto na íntegra:

"DECRETO Nº , DE DE DE 2019

Altera o Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, que regulamenta a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas - SINARM e define crimes.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003,
DECRETA:

Art. 1º O Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 12. ......................................................................................................
.....................................................................................................................
VIII - na hipótese de residência habitada também por criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, apresentar declaração de que a sua residência possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento.
§ 1º Presume-se a veracidade dos fatos e das circunstâncias afirmadas na declaração de efetiva necessidade a que se refere o inciso I do caput, a qual será examinada pela Polícia Federal nos termos deste artigo.
.....................................................................................................................

§ 7º Para a aquisição de armas de fogo de uso permitido, considera-se presente a efetiva necessidade nas seguintes hipóteses:
I - agentes públicos, inclusive os inativos:
a) da área de segurança pública;
b) integrantes das carreiras da Agência Brasileira de Inteligência;
c) da administração penitenciária;
d) do sistema socioeducativo, desde que lotados nas unidades de internação a que se refere o inciso VI do caput do art. 112 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990; e
e) envolvidos no exercício de atividades de poder de polícia administrativa ou de correição em caráter permanente;
II - militares ativos e inativos;
III - residentes em área rural;
IV - residentes em áreas urbanas com elevados índices de violência, assim consideradas aquelas localizadas em unidades federativas com índices anuais de mais de dez homicídios por cem mil habitantes, no ano de 2016, conforme os dados do Atlas da Violência 2018, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública;
V - titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais ou industriais; e
VI - colecionadores, atiradores e caçadores, devidamente registrados no Comando do Exército.

§ 8º O disposto no § 7º se aplica para a aquisição de até quatro armas de fogo de uso permitido e não exclui a caracterização da efetiva necessidade se presentes outros fatos e circunstâncias que a justifiquem, inclusive para a aquisição de armas de fogo de uso permitido em quantidade superior a esse limite, conforme legislação vigente.

§ 9º Constituem razões para o indeferimento do pedido ou para o cancelamento do registro:
I - a ausência dos requisitos a que se referem os incisos I a VII do caput; e
II - quando houver comprovação de que o requerente:
a) prestou a declaração de efetiva necessidade com afirmações falsas;
b) mantém vínculo com grupos criminosos; e
c) age como pessoa interposta de quem não preenche os requisitos a que se referem os incisos I a VII do caput.

§ 10. A inobservância do disposto no inciso VIII do caput sujeitará o interessado à pena prevista no art. 13 da Lei nº 10.826, de 2003.” (NR)
“Art. 15. ......................................................................................................

Parágrafo único. Os dados de que tratam o inciso I e a alínea “b” do inciso II do caput serão substituídos pelo número de matrícula funcional, na hipótese em que o cadastro no SIGMA ou no SINARM estiver relacionado com armas de fogo pertencentes a integrantes da Agência Brasileira de Inteligência.” (NR)
“Art. 16. ......................................................................................................
.....................................................................................................................

§ 2º Os requisitos de que tratam os incisos IV, V, VI e VII do caput do art. 12 deverão ser comprovados, periodicamente, a cada dez anos, junto à Polícia Federal, para fins de renovação do Certificado de Registro.
...........................................................................................................” (NR)
“Art. 18. ......................................................................................................
.....................................................................................................................

§ 3º Os requisitos de que tratam os incisos IV, V, VI e VII do caput do art. 12 deverão ser comprovados, periodicamente, a cada dez anos, junto ao Comando do Exército, para fins de renovação do Certificado de Registro.
.....................................................................................................................

§ 5º Os dados de que tratam o inciso I e a alínea “b” do inciso II do § 2º serão substituídos pelo número de matrícula funcional, na hipótese em que o cadastro no SIGMA ou no SINARM estiver relacionado com armas de fogo pertencentes a integrantes da Agência Brasileira de Inteligência.” (NR)
“Art. 30. ......................................................................................................
.......................................................................................................................

§ 4o As entidades de tiro desportivo e as empresas de instrução de tiro poderão fornecer a seus associados e clientes, desde que obtida autorização específica e obedecidas as condições e requisitos estabelecidos em ato do Comando do Exército, munição recarregada para uso exclusivo nas dependências da instituição em provas, cursos e treinamento.” (NR)

“Art. 67-C. Quaisquer cadastros constantes do SIGMA ou do SINARM, na hipótese em que estiverem relacionados com integrantes da Agência Brasileira de Inteligência, deverão possuir exclusivamente o número de matrícula funcional como dado de qualificação pessoal, incluídos os relativos à aquisição e à venda de armamento e à comunicação de extravio, furto ou roubo de arma de fogo ou seus documentos.” (NR)

Art. 2º Os Certificados de Registro de Arma de Fogo expedidos antes da data de publicação deste Decreto ficam automaticamente renovados pelo prazo a que se refere o § 2º do art. 16 do Decreto nº 5.123, de 2004.

Art. 3º Para fins do disposto no inciso V do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, consideram-se agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência os servidores e os empregados públicos vinculados àquela Agência.

Art. 4º Fica revogado o § 2º-A do art. 16 do Decreto nº 5.123, de 2004.

Art. 5º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, de de 2019; 198º da Independência e 131º da República.

VERSÃO 5 D- ALT DEC Nº 5.123-04, SOBRE DESARMAMENTO (L3)"

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