Bia Kicis é autora do projeto de lei que pretende instituir a volta do voto impresso nas eleições (Pablo Valadares/Agência Câmara)
Agência O Globo
Publicado em 24 de maio de 2021 às 13h11.
Autora do projeto de lei que pretende instituir a volta do voto impresso nas eleições, a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) tem investido tempo e dinheiro na empreitada. Integrante da tropa de choque do presidente Jair Bolsonaro na Câmara, ela contratou duas empresas para ajudar na divulgação de conteúdo sobre o projeto, muitas vezes com desinformação.
A Inovatum Tecnologia da Informação, contratada em janeiro por Kicis por R$ 2 mil mensais com recursos da cota parlamentar, gerencia o grupo de Telegram “VotoImpressoAuditável”. Em dezembro, ela contratou a Gohawk Tecnologia da Informação, por R$ 4,5 mil, para criar uma página que permite o cadastro de apoiadores da iniciativa e acesso ao grupo de Telegram. No total, ela gastou até o momento R$ 12,5 mil da verba parlamentar na campanha pelo voto impresso.
No grupo, criado em 7 de abril, 125 mil pessoas recebem diariamente vídeos, entrevistas e publicações de Kicis sobre o sistema eleitoral brasileiro, repletos de questionamentos sem evidências e descrença sobre o processo eletrônico. Num dos vídeos divulgados, a deputada sugere não existir garantia de que o voto do eleitor vá para o candidato escolhido.
— Depois que a gente colocou “confirmar” o voto não está nem registrado. Você confirma e tem que rezar para o voto ir para o seu candidato — declara.
Em outro vídeo, o engenheiro Amílcar Brunazo segue a mesma linha:
— Você vê o voto na tela e depois confirma. Depois que você confirma, o voto é registrado num arquivo que é criado depois que o eleitor confirma. Então o que foi registrado o eleitor não vê. A última coisa que ele vê é o que está na tela, e isso não é necessariamente o que está gravado — diz ele.
Em outra publicação, um meme compara a urna eletrônica brasileira a empresas que supostamente sofreram invasões de hackers, como Microsoft, Facebook, Nasa, além do Supremo Tribunal Federal (STF).
Há ainda um vídeo em que a deputada federal Aline Sleutjes (PSL-PR) lança dúvida sobre o processo eleitoral sem mostrar evidências.
— A gente vê muitas queixas, denúncias, reclamações e preocupações pós eleição. “Será que foi esse mesmo o resultado?” Para ter um processo que não seja totalmente firme no seu propósito de dar um resultado fiel, a gente vai realmente ficar sempre no resultado duvidoso — disse.
Desde a implementação da urna eletrônica, no entanto, não há provas de fraudes nas eleições brasileiras. Tais declarações também são rebatidas por especialistas eleitorais ouvidos pelo GLOBO. Quando o eleitor dá seu voto na urna eletrônica, ele passa por uma certificação digital em um sistema avaliado publicamente antes mesmo da votação.
Procurada, a deputada Bia Kicis informou que o contrato com a Inovatum foi assinado para um período de três meses, mas pode ser renovado automaticamente pelo prazo que a parlamentar julgar conveniente. Sobre as desinformações divulgadas no grupo, afirmou que a intenção é a de demonstrar que toda tecnologia é passível de falhas.
A cada dois anos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) realiza testes públicos de segurança em que especialistas simulam ataques no sistema de voto. Neles, algumas barreiras de segurança das urnas são fragilizadas. O objetivo é encontrar eventuais brechas. Após a correção no sistema, os especialistas que encontraram as fragilidades são chamados para fazer um novo teste de segurança a fim de confirmar que o erro foi superado.
Depois que isso é feito, em um período anterior à eleição de 180 dias, a Justiça Eleitoral abre o código fonte do sistema eleitoral para que ele seja auditado por diversas entidades, que vão desde partidos políticos a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Ministério Público (MP). É nesse momento que os representantes podem solicitar melhorias, tirar dúvidas, ou conversar com a equipe técnica.
No final, faltando 20 dias para o pleito, o TSE apresenta a última versão do sistema e realiza a cerimônia de assinatura digital e lacração do software. É nela que o Tribunal, junto das demais entidades que participaram do processo de auditoria, atestam a versão final.
Mesmo que haja algum tipo de interceptação, não há possibilidade de se instalar os arquivos em computadores externos. E os softwares só são ativados por senhas geradas pelo TSE, de forma personalizada e controlada.
Cada seção eleitoral emite, após a votação, um documento chamando Boletim de Urna (BU). Nele, constam total de votos por partido; total de votos por candidato; total de votos nulos e em branco; total de comparecimento em voto; identificação da seção e da zona eleitoral; hora do encerramento da eleição; código interno da urna eletrônica; e sequência de caracteres para a validação do boletim. O BU é uma forma de auditoria do resultado da eleição.
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