EAD: até agora, há apenas 174 formados e 737 em fase final de conclusão (AndreyPopov/Thinkstock)
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de abril de 2019 às 17h25.
São Paulo — Criada com o objetivo de ampliar o acesso ao ensino superior, a Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp) conseguiu que apenas 174 alunos concluíssem a graduação nos últimos cinco anos.
A instituição é a única estadual paulista a ofertar cursos na modalidade de ensino a distância (EAD), mas sofre com a alta taxa de evasão e baixa procura de alunos. Após dois anos ampliando o número de vagas, o governo estadual anunciou que vai encolher a oferta.
A instituição iniciou suas atividades em 2014 com a oferta de 3,3 mil vagas e no ano seguinte, de 918. Seguindo o tempo correto de graduação, esses alunos deveriam ter se formado ao final de 2017 e 2018.
No entanto, até agora, há apenas 174 formados e 737 em fase final de conclusão — menos de 30% dos que entraram na primeira turma.
Nos últimos quatro anos, o número de vagas ofertadas nos vestibulares da instituição cresceu mais de 1.000%, passando de 3,3 mil, em 2014, para 42 mil, no ano passado.
No entanto, a universidade tem dificuldade para preencher todas as vagas criadas — das 21.650 abertas em agosto de 2018, só 16 mil foram preenchidas.
Ou seja, 35% não tiveram interessados. Além disso, as graduações têm uma taxa média de desistência no primeiro semestre do curso de 32%.
"A instituição se esforçou para ampliar o número de vagas e cursos ofertados, mas não consegue fazer esse aluno ficar e se formar, o que deveria ser o mais importante", diz Rodolfo Azevedo, presidente da Univesp.
Por isso, segundo ele, a universidade pretende no próximo vestibular, em agosto, abrir menos vagas (5 mil) e iniciar um processo para redimensionar a oferta de acordo com a demanda regional.
Azevedo avalia que a expansão dos últimos anos não levou em conta o tamanho e as especificidades dos municípios. Ele conta, por exemplo, que há cidades com 10 mil habitantes que tiveram a oferta de mais de 250 vagas em um único vestibular — a maioria das novas vagas foi aberta em pequenos municípios, em regiões afastadas da Grande São Paulo, onde não existia nenhum curso superior público.
"Sabemos que, em média, 1% da população de cada município conclui o ensino médio a cada ano. A oferta tem de ser pensada dentro dessa proporção", afirma o presidente.
Mesmo com uma população um pouco maior, o polo de Borborema, cidade de 14 mil habitantes na região de Araraquara, não conseguiu preencher e manter os alunos.
No último vestibular, por exemplo, foram oferecidas cem vagas para os cursos de Pedagogia e Engenharia de Produção — continuam frequentando as aulas 36 e 19 alunos, respectivamente.
Tatiane Salomão, orientadora do polo, diz que as desistências ocorrem principalmente quando os alunos não conseguem acompanhar o conteúdo ou ter disciplina para estudar em casa. Foi o caso do funcionário público Diogo Vanalli, de 25 anos, que entrou em Engenharia de Produção no ano passado, mas abandonou a graduação no semestre seguinte do ingresso.
"Eu estava gostando, mas faltava tempo para estudar, as disciplinas eram puxadas e não tinha como tirar muitas dúvidas", conta.
Segundo Azevedo, a instituição prepara um estudo para identificar os principais problemas de preenchimento e permanência nas vagas.
No entanto, diz já ter identificado que procedimentos internos "prendem" alunos nos cursos quando há reprovação em uma disciplina. Há também problemas burocráticos e faltam apoio e acompanhamento dos estudantes durante os estudos.
Aos 40 anos, Ricardo Firmino decidiu fazer sua segunda graduação pela Univesp em 2017. Apesar de a formação em Pedagogia ser um sonho antigo, ele conta que já pensou em desistir do curso por conta dos problemas administrativos.
"As aulas são ótimas e o conteúdo, puxado e denso. O problema é que o aluno fica muito abandonado. Eu consegui um estágio há dois meses e até agora não obtive a assinatura da universidade."
Azevedo destaca também a questão da formação deficiente no ensino médio nas disciplinas de exatas e biológicas. "Precisamos dar ferramentas e apoio para que esse aluno consiga acompanhar o conteúdo de cursos mais puxados, como Engenharia."
Na área, a evasão chega a quase 40% no primeiro semestre. Para esse acompanhamento, foram contratados este ano 800 bolsistas, que são pós-graduandos das outras três universidades paulistas, para tirar dúvidas dos alunos da Univesp.
Em nota, a gestão do ex-governador Márcio França (PSB), que era vice-governador em 2017, quando houve a maior expansão da Univesp, criticou a decisão da gestão João Doria (PSDB), por "tirar a oportunidade de milhares de jovens do Estado que sonham em fazer uma universidade pública de qualidade".
Especialistas da área dizem que, apesar da tendência nacional de maior evasão nos cursos da modalidade a distância, os dados da Univesp preocupam pelo desperdício de recurso público e falta de atenção às necessidades de quem procura o ensino superior.
O Mapa do Ensino Superior de 2018, feito pelo Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp), mostra que, enquanto o índice de abandono é de 18,5% nas graduações presenciais da rede pública, ele chega a 30,4% na modalidade a distância — durante todo o período do curso.
"Um índice tão alto mostra a necessidade de um balanço e uma reflexão crítica sobre o que se está ofertando. Sempre que se abre uma vaga, o poder público se prepara para arcar com os custos dela. Então, qualquer vaga não ocupada ou que foi abandonada representa desperdício", afirma Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).
Betina Von Staa, consultora da Associação Brasileira de Ensino a Distância (Abed), diz que as universidades particulares, ao perceberam a alta taxa de evasão na modalidade a distância, adotaram uma série de ações para reverter a situação e evitar prejuízos.
"É preciso pensar em uma série de estratégias: atendimento personalizado, orientação profissional e psicológica, e até mesmo ajuda para organizar o tempo de estudo."
Falta de tempo para estudar e dificuldade de acompanhar o conteúdo são as principais queixas dos estudantes da Univesp nas redes sociais. Eles ainda relatam problemas técnicos, como as plataformas de ensino com lentidão ou fora do ar.
"O ensino a distância é calcado na tecnologia. Se ela não funcionar bem, o aluno vai ser prejudicado e perder o interesse", afirma Alavarse.
Outro problema apontado pela própria presidência da universidade é que alguns polos abertos nos últimos anos — 63 de um total de 330 — não tinham estrutura adequada para as atividades presenciais que ocorrem uma vez ao mês.
Segundo a instituição, esses polos não devem ofertar novas vagas no próximo vestibular para que tenham tempo de se adequar às necessidades dos cursos.
"A ideia não é punir ninguém, não vamos fechar esses polos. Mas não vamos continuar abrindo vagas sem que os alunos possam ter boas condições de estudar nesses lugares", diz o presidente da Univesp, Rodolfo Azevedo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.